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Estranho pedido de desculpas

por Teresa Power, em 07.07.15

A Inês tem dezassete anos e trissomia 21. Todos os verões a encontramos na praia, sorridente e afável. Há dez anos atrás, o Francisco e a Clarinha brincavam com ela na areia, fazendo castelos e procurando conchinhas. Agora, cabe a vez à Lúcia, ao António, à Sara. Os anos vão passando, os nossos filhos vão crescendo, mas a Inês continua criança, feliz por saltar nas ondas e brincar na areia com qualquer criança que responda à sua simpatia.

Ontem, a Inês deu a mão à Sara para a ajudar a molhar os pés no mar, e conversámos um bocadinho. Então recordei-me de uma conversa que eu tive no verão passado com a sua avó, mulher sábia e forte, de quase oitenta anos, que cuida da Inês como uma filha desde a morte prematura da mãe da menina.

- Quando a Inês nasceu - dizia-me a avó, de olhos fitos na sua menina - o médico pediu desculpa à minha filha. Eu sei, porque ela mo disse. Pediu desculpa... Ele deve ter falhado, realmente, como médico. Se tivesse descoberto o problema da nossa menina antes dela nascer, podia tê-la curado, não é verdade?

- Olhe que não - Respondi eu - A trissomia 21 não tem cura. Não teria adiantado nada saber antes!

A senhora ficou muito surpresa. Sem tirar os olhos da sua menina, que brincava nas ondas, perguntou em voz alta, mais a si própria do que a mim:

- Então por que razão terá o médico pedido desculpa?

Fiquei em silêncio, sem saber o que dizer. Como explicar áquela avó, que vive para que a neta seja feliz, que o médico pediu desculpa por não ter dado à mãe a oportunidade de matar a sua filha antes dela nascer? A Inês dava gargalhadas alegres no mar, ao lado do António e da Lúcia. Não tive coragem de desfazer a ilusão... Seria demasiado doloroso. Encolhi os ombros e fingi não saber a resposta.

Ainda me falta encontrar uma mãe que me diga que teria preferido abortar o seu filho deficiente...

CAM00466.jpg

 "Teus olhos viam o meu embrião,

e em teu livro foram registados

todos os dias prefixados,

antes que um só deles existisse..."

(Sl 139/138)

 

 

 

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publicado às 06:16


5 comentários

De rita teles a 07.07.2015 às 09:14

Bom dia Teresa,

como eu a percebo! É encantadora de fato essa menina. E quem somos nós para nos arvorarmos em Deus?
Esta loucura de matar o que não se vê, pelo medo da infelicidade que poderá advir da adversidade, não deixa de ser "pecado organizado", nas palavras da poetisa.
Que o Espírito Santo nos dê o discernimento de não nos deixarmos "organizar" neste mal encantado, onde é tudo, mas mesmo tudo possível, desde que "racional" ou aceite pela comunidade...
Um beijinho,

Rita

De Edu a 09.07.2015 às 11:18

Acredito que esta mãe iria amar esta filha incondicionalmente. E não iria aceitar desculpas, mas antes agradecer pela oportunidade que ele lhe deu de ser mãe.

De Rogério Ribeiro a 07.07.2015 às 18:41

Olá Teresa!
Ora aqui está uma partilha sua que me toca profundamente!
E toca-me porque sou pai de uma menina "Patrícia" com trissomia 21!
Tem 14 anos e foi a nossa primeira filha.
A nós o médico nao nos pediu desculpa...mas disse-nos que "Deus vos dê juízo que juízo nao têm nenhum".
E disse-nos estas palavras porque decidimos levar a gravidez até ao fim!
Eu e a minha esposa tivemos conhecimento da deficiência da minha filha logo na primeira ecografia.
Mais tarde a minha esposa fez a amniócentese e confirmou- se o diagnóstico de T21!
E foi na sequência deste exame que veio a nossa recusa em abortar e as ditas palavras do médico.
Adeus!

De Lurdes a 10.07.2015 às 09:43

Convém no entanto ter presente que existem outras doenças associadas à trissomia como por exemplo cardiopatias . E que algumas crianças com trissomia não sobrevivem mais do que algumas horas/semanas/meses. Uma vida curta, marcada pela dor.

Quando estava grávida do meu segundo filho fui confrontada com a existência de um risco elevado de trissomia (tanto 21 como 13). Graças a Deus estava tudo bem com ele, e lembro-me de ter sentido vergonha por ter ponderado terminar a gravidez. Estava convicta que se fosse agora a minha reacção seria diferente, que de alguma forma me tinha tornado uma pessoa melhor.

Mas agora estou grávida do meu 3.º filho (gravidez não planeada mas que passou a ser muito desejada) e confrontada novamente com a possibilidade de trissomia , dei por mim a ponderar terminar esta gravidez (a última eco parece ter afastado esta possibilidade).


De D. a 15.07.2015 às 23:04

Ser confrontado com uma situação assim, de deficiência ou doença de filho que está para nascer, deve ser um choque tremendo, mas... a minha irmã tem trissomia 21 e custa-me muito saber que esta a opinião prevalecente é que a melhor solução seria simplesmente "desfazer-se" do "problema"! Cabe-nos a nós, Igreja, mostrar ao mundo que estas vidas também têm valor, o mesmo valor que qualquer vida. Que pessoas com deficiência não são "seres inferiores", meros "problemas" que "aguentamos por caridade", mas filhos muito amados de Deus, como todos nós.
(P. S. Se a Teresa por acaso souber de formas mais adequadas de evangelizar crianças e jovens (e adultos!) com deficiências intelectuais, agradecia muito se partilhasse connosco...)

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