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Somos uma família católica, abençoada com seis filhos na Terra e um no Céu. Procuramos viver a fé com simplicidade e generosidade. Queremos partilhar com outras famílias a alegria de sermos Igreja Doméstica na grande família da Igreja Católica.
Primeiro dia de aulas. Estamos numa escola nova, moderna, bonita e muito, muito grande. Vou conhecer uma nova turma do Vocacional. São vinte e poucos alunos com um percurso escolar feito de fracassos, repetências, ordens de saída da sala de aula, recados na caderneta, faltas. Em casa, a grande maioria encontra ruinas em vez de castelos, gritos em vez de palavras de amor.
"Nós, Jesus", rezo, antes de entrar na sala de aula. Não tenho tempo para muito mais: enquanto abro a porta, sou empurrada por uma avalanche humana sem delicadeza, que tenta passar.
- Bom dia, meninos! - Cumprimento.
- Espero que seja para si, professora! Para mim já é mau. Escola, rrrrrrr!
- Isto é o quê, malta? Inglês? Ah, está ali a teacher! Olá teacher!
- No ano passado vim para a rua em todas as aulas de Inglês, sabia?
- E eu nem chegava a entrar! - Gargalhadas.
- Bem, sentem-se nos lugares destinados pelo Diretor de Turma. Tu és o...
- João!
- João, senta-te aqui.
Gargalhadas - Professora, ele não é nada o João! Está a brincar consigo!
- E tu, por favor, és o...?
- Ah, tem de adivinhar que também não vou dizer!
- OK. Têm caderno, caneta...?
- Para quê, teacher? Eu nunca aprendi inglês e não é agora que vou aprender!
- Professora, mande-os para a rua! Tanto barulho! Eu quero aprender!
Gargalhadas - Ele quer aprender, teacher! Podemos ir embora nós? Pode dar-lhe a aula só a ele?
Enquanto escuto, sinto nascer dentro de mim uma enorme empatia. Também a mim me apetece sair da sala antes mesmo de entrar, ser expulsa da turma, fingir que não vou conseguir ser professora destes meninos, desistir ainda antes de tentar, trocar de nome para que não desconfiem que sou cristã. Como eu os compreendo! Involuntariamente, começo a sorrir.
Noventa minutos e muito cansaço mais tarde, toca para saída. A escola nova tem as portas da sala todas envidraçadas, o que vai tornar difícil, ao longo do ano, um gesto que eu costumava fazer no final de muitas aulas do Vocacional: fechar a porta, deitar a cabeça nos braços sobre a mesa, e chorar. Terei de controlar melhor as minhas emoções no final destas aulas... "Nós, Jesus!" Repito.
Mas hoje não tenho vontade de chorar. Hoje não consigo deixar de pensar no trabalho que também eu dou a Deus... Chego a casa, abro o Livro do Profeta Oseias:
"Quando Israel era ainda menino, Eu amei-o, e chamei do Egito o meu filho. Mas quanto mais os chamei, mais eles se afastaram; ofereceram sacrifícios aos ídolos de Baal e queimaram oferendas a estátuas. Entretanto, Eu ensinava Efraim a andar, trazia-o nos meus braços, mas não reconheceram que era Eu quem cuidava deles. Segurava-os com laços humanos, com laços de amor, fui para eles como o que levanta uma criancinha contra o seu rosto (...) O meu povo é inclinado a afastar-se de Mim; quando se convida a subir ao que está no alto, ninguém procura elevar-se. Como poderia abandonar-te, ó Efraim? Como poderia entregar-te, ó Israel?" " (Os 11, 1-8)
Senhor, que eu não desista de elevar, chamar, trazer nos braços, cuidar, amar cada um dos meus alunos, por mais rebeldes que eles sejam... tal como Tu nunca desistes de me convidar a subir ao que está alto - e sou bem mais rebelde do que eles...
Quartas-feiras são o meu dia de motorista. Aliás, só me falta o chapéu a condizer! Já assim era o ano passado, pois às quartas-feiras à tarde, não há aulas no colégio nem no meu agrupamento de escolas para o terceiro ciclo e secundário, e a primária termina às três horas. De acordo com as minhas contas, eu fazia, no ano passado, seis vezes o percurso, ida e volta, casa / escola ou casa /colégio dos meninos. Este ano, as contas não são muito diferentes, e ainda estou em processo de adaptação a horários, meus e deles. A adaptação nem sempre é fácil, e a prova "vergonhosa" é a história que vos vou contar...
Quarta-feira. O Francisco veio para casa de bicicleta - depois da peregrinação a Santiago de Compostela, não há distâncias para ele - e eu chego uma hora mais tarde, para almoçarmos juntos. Depois de conversarmos um bocado e arrumarmos a cozinha, sento-me diante do computador para aprovar alguns comentários e para preparar as minhas aulas do dia seguinte, antes de interromper para estender uma máquina de roupa. Olho para o relógio: são duas e um quarto, e às três horas devo ir buscar o David e a Lúcia; às quatro, o António e a Sara; depois, levar a Clarinha à explicação de Matemática e, hora e meia mais tarde, ir buscá-la...
Ainda estou eu a fazer as contas às horas, quando ouço o portão da rua a abrir, seguido de passos apressados. A porta da cozinha abre-se de rompante:
- Mãe! Onde estás?
Dou um salto de susto.
- Clarinha! Que fazes em casa a esta hora?
Ela olha para mim, espantada, transpirada, sem fôlego:
- Mas, mãe, esqueceste-te de mim? Hoje era suposto teres ido buscar-me à uma e meia... Vim a pé do Colégio! 40 minutos a andar a toda a pressa... Não foi a distância, claro, porque até gostei do passeio... Mas estava tão nervosa! Pensei que te tinha acontecido alguma coisa!
E a Clarinha desata a chorar.
- Oh, filha, desculpa-me! Esqueci-me completamente! E olha que estava agora mesmo a pensar em ti, vê lá tu!
- E nem a pensar em mim te lembraste?!
- Não! Contava ir buscar-te à hora do costume... Desculpa! Desculpa! Desculpa!
Abraçamo-nos, e depois desatamos a rir.
- Não vais dizer isto no blogue, pois não? - Pergunta-me ela, enquanto lava a cara e os braços, todos transpirados - Vão ficar a pensar que és maluca!
- Claro que não! (Ups!)
Deixem-me aqui fazer um parêntesis: esta história só é possível acontecer, naturalmente, numa casa onde os únicos telemóveis são o do pai e o da mãe...
Mais tarde, vieram-me à mente as palavras da Bíblia:
"Poderá a mãe esquecer-se da criança que trouxe nas suas entranhas?"
(Pode...)
"Pois bem, mesmo que ela se esqueça, Eu não me esquecerei de ti, Israel!"
(Is 49, 15)
Ah! Quantas vezes me sinto abandonada, esquecida por Deus? Quantas vezes penso que Ele não tem tempo para pensar em mim, ocupado como deve estar com assuntos bem mais sérios do que os meus? Não, ao contrário de algumas mães desnaturadas (ups!) o Senhor não esquece nenhum dos seus filhos! Em cada momento da minha vida, Deus pensa em mim como se só Eu existisse sobre a Terra. Deus tem o seu olhar pousado sobre mim, o seu coração aberto para mim, o seu amor, transbordante, derramado a cada instante sobre mim...
Se por uma fração de segundo apenas, Deus se esquecesse da sua mais pequena criatura, homem ou estrela, animal ou flor, o universo inteiro ruiria como um castelo de cartas. Acreditamos nisto?...
Na quinta-feira à tarde, antes de ir buscar os meninos ao colégio, participei na gravação de um debate da Renascença sobre o sínodo da família. Poderão escutar o debate inteiro amanhã, domingo dia 4, depois do noticiário do meio-dia. Tem uma duração de cerca de quarenta e cinco minutos.
A Ângela Roque, uma simpática jornalista da Renascença, entrevistou-me há um ano atrás, como podem ver na coluna direita deste blogue. Agora lembrou-se novamente de mim para este debate, e eu agradeci o privilégio de dialogar com pessoas tão interessantes, bem como a oportunidade de falar um bocadinho mais do nosso blogue e do movimento nascente das Famílias de Caná, numa atitude que partilho com S. Paulo:
"Se anuncio o Evangelho, não tenho de que me gloriar, pois me é imposta esta obrigação. E ai de mim se não evangelizar!"
(1cor 9, 16)
Os outros participantes estavam nos estúdios de Gaia e de Lisboa. Eu fiquei calmamente em casa, escutando o debate via telemóvel até, por fim, ser convidada a nele participar. Foi uma experiência engraçada, estar em casa, arrumando roupa de quarto em quarto nas gavetas dos meninos com o telemóvel em altifalante, enquanto escutava as intervenções do debate e acenava com a cabeça, concordando com o que se ia partilhando. Poder realizar as tarefas domésticas enquanto o pensamento se eleva a temas bem mais atraentes é uma grande graça! Por fim, quando percebi que chegara a minha vez, sentei-me no Canto de Oração, afastei o cesto da roupa e olhei para Jesus, que me devolveu o olhar. "Nós, Jesus", rezei interiormente. "Nós, Jesus, vamos participar neste debate..."
E participámos!
Assim que tenha disponível o link, também o deixarei aqui, para que todos os que não puderem escutar no domingo o façam calmamente noutra ocasião - arrumando roupa pela casa, fazendo o jantar, varrendo o pátio, conduzindo...
Quando viemos viver para Mogofores, em agosto de 2007, a nossa casinha estava acabada de construir, mas o jardim ainda era um monte de pedras e silvas. Trabalhando arduamente, o Niall limpou o terreno, encomendou a terra, semeou a relva, plantou árvores de fruto e flores. Que alegria, ver o jardim a ganhar forma pouco a pouco!
Entretanto, uns amigos ouviram-me falar de um dos meus sonhos: ter uma oliveira no centro do jardim. Eu cresci na Beira Baixa, e as oliveiras evocam em mim as recordações mais autênticas e doces da minha infância. A minha casinha só estaria pronta quando a oliveira chegasse...
E chegou: os nossos amigos tinham um olival, e decidiram oferecer-nos uma das suas oliveiras, frondosa e bela, com mais de duzentos anos. Que maravilha!
Mas quando o trator, em outubro, deixou a oliveira no nosso jardim, na cova que, entretanto, o Niall cavara noite após noite para a receber, a minha desilusão foi grande: a oliveira alta e frondosa era simplesmente um tronco! Nem ramos, nem folhas: um tronco castanho e seco.
- Que aconteceu, Niall? - Perguntei, aflita. Ele riu-se:
- É assim mesmo! Para transplantar a oliveira foi preciso cortar os ramos, pois de outra forma, ela morria. Agora temos de esperar que voltem a crescer!
- E vão crescer?
- Claro! O senhor disse-nos que a próxima primavera será o exame final: ou a oliveira rebenta por todos os lados, lançando pequenos ramos que logo crescerão, ou não rebenta, e nesse caso, está morta.
Durante todo o inverno, cuidámos da oliveira, na esperança de que tivesse aguentado bem a mudança de habitat. Mas eu estava impaciente pela prova final: estaria ela verdadeiramente viva?
Durante todo o inverno também, parecia-me escutar a voz de Deus, pedindo-me que acolhesse um novo filho. Era um chamamento distinto, persistente, percebido no mais íntimo do meu ser. O Niall e eu estávamos abertos à vida, e esperávamos, com curiosidade, a visita do Senhor.
Manhã de fevereiro, 2008. É sábado, e por isso não há pressa em sair de casa. Já é quase primavera... Haverá sinais de vida, na nossa oliveira? Espreitar o seu tronco rugoso tornou-se um hábito matinal: dirijo-me ao jardim, e observo.
E eis que, de repente, sou tomada pela visão de uma folhinha minúscula a espreitar do tronco. Sim, é o primeiro rebento! A oliveira está viva!
Então, antes de gritar de alegria, antes de correr a anunciar a boa notícia, vem-me à memória o versículo de um salmo:
"Teus filhos serão como rebentos de oliveira ao redor da tua mesa." (Sl 128, 3)
Instintivamente, levo a mão ao ventre: não preciso de teste de gravidez. Aquele rebento de oliveira faz-me saber, com uma certeza inusitada, que o meu ventre já está habitado... Não sei que notícia dar primeiro.
Foi assim que a Lúcia se fez anunciar, há sete anos atrás. Dia 2 de outubro, dia do Anjo da Guarda, ela nascia, rebento de oliveira em flor, para encher a nossa casa de risos. Hoje, celebrando o seu aniversário, vendo-a saltar de alegria ao desembrulhar as prendas, recebendo os seus abraços, fazendo-lhe as tranças marotas, eu recordo o tronco rugoso, a espera impaciente, o rebento minúsculo a anunciar a primavera, e a Palavra surgindo cá dentro... Quem, senão o Senhor, faz milagres assim? Ele enche a Terra de sinais do seu amor, e nós andamos tão distraídos...
Parabéns, querida filha!
- Vens muito bonita hoje, Lúcia, com uma coroa na cabeça! Quem ta deu?
- Fui eu que fiz no retiro!
- No retiro? Onde foste tu no fim-de-semana? Conta lá!
- Fui ao retiro. Lá ouvimos uma história muito bonita sobre a rainha Ester. Ela foi uma rainha verdadeira porque foi muito humilde.
- Ah...
Esta conversa aconteceu à chegada ao colégio, segunda-feira de manhã. A Lúcia e o António insistiram em levar as suas coroas para mostrar aos colegas e aos professores como eram bonitas. E segundo me contaram, todos os seus amigos ficaram com pena de não terem ido também ao retiro à Quinta do Conde!
A Bíblia é um verdadeiro livro de histórias para todas as idades. Não há nenhuma criança que não goste de escutar uma história da Bíblia, bem contada e bem dramatizada, tal como merece a tradição oral na base do texto escrito. Na verdade, os povos antigos conheciam o poder de uma boa narração, essencial para que a história não perdesse beleza, ritmo e conteúdo ao ser transmitida, oralmente, de geração em geração!
No retiro do dia 27 de setembro, na Quinta do Conde, as crianças e os jovens trabalharam em cinco grupos diferentes, segundo as suas idades. Todos escutaram a história da Rainha Ester. Os mais pequeninos foram dormindo pelo meio...
Os mais velhinhos puderam escutar a história dramatizada, contada pela Pilar, que é uma verdadeira artista:
Depois, em pequenos grupos, fizeram os seus trabalhos, ajudados pelos vários animadores - pais e mães de Famílias de Caná com um coração generoso e grande:
A Marisa, cheia de entusiasmo, com a colaboração da Irene e do Ricardo, fez um belíssimo teatro de sombras com os pré-adolescentes. Eles estavam encantados!
Os jovens trabalharam com o Niall, meditando na história da Rainha Ester e no poder imenso que Deus coloca em nossas mãos através da oração:
Porque éramos muitos, os nossos plenários aconteceram na igreja, o único espaço capaz de nos acolher a todos:
Foi também na igreja que o Francisco deu o seu testemunho de jovem cristão através do ilusionismo, num grande espetáculo de magia e evangelização:
- Não faz mal, fazer ilusionismo e apresentar os trabalhos na igreja? Devemos retirar o Santíssimo? - Foi uma questão que nos colocámos. A resposta surgiu, luminosa, também dentro de nós: não. Jesus-Eucaristia é o centro e o cume dos Retiros Famílias de Caná. Em dia de retiro, queremos passar o máximo tempo possível sob o seu olhar, para que Ele nos toque, nos cure e nos converta. Quando o Francisco faz ilusionismo, dá testemunho da sua fé; quando apresentamos os trabalhos das crianças, ou cantamos os seus cânticos cristãos infantis, com gestos e movimento, estamos a louvar o Senhor... Por que o havíamos de fazer longe da sua Presença Eucarística? Sentíamos dentro de nós a coragem da humilde Ester, que na presença do rei, dele escutou estas palavras:
"Qual o teu pedido, rainha Ester? Tudo te será concedido. Qual o teu desejo? Mesmo que seja metade do meu reino, será satisfeito."
(Est 5, 6)
Que dizes, Teresa? Estás a comparar-me à rainha Ester? A mim, tão fraco e tão sujo?...
Hoje, dia 1 de outubro, a Igreja celebra o dia de Santa Teresinha do Menino Jesus, a jovem humilde a quem o seu papá tratava por "Minha Rainhazinha". Os filhos de Deus, na verdade, porque filhos do Rei, pertencem à realeza! Humildes, sim, mas dignos!
Não conheço todas súplicas ocultas no coração de cada um, mas sei que a resposta de Jesus supera a do rei Assuero em generosidade: ali, no retiro, na sua Presença Eucarística, Jesus prometeu-nos não a metade, mas a totalidade do Reino de Deus...