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Somos uma família católica, abençoada com seis filhos na Terra e um no Céu. Procuramos viver a fé com simplicidade e generosidade. Queremos partilhar com outras famílias a alegria de sermos Igreja Doméstica na grande família da Igreja Católica.
Regresso às aulas. Turma do Vocacional. Antes de entrar na sala, respiro fundo, rezo uma Avé Maria e entrego-me a Jesus: "Nós, Jesus: Tu e eu vamos dar aulas à turma do Vocacional."
Entrada bastante atribulada. Alguém passa uma rasteira e outro cai no chão, mas porque não é bom ficar "por baixo", logo atira com uma mochila sobre as carteiras. A meio do "voo", mais dois ou três ficam magoados e decidem vingar-se. Consigo, a custo, controlar a situação e fazê-los sentar nas cadeiras.
Nas reuniões de avaliação, fui informada que o meu pior aluno foi institucionalizado. Sinto-me muito envergonhada do sentimento de alívio que me invade...
- Têm tido notícias do vosso colega? - Pergunto, quando o barulho acalma um pouco.
- Ele diz que aquilo é um galinheiro.
- O quê?
- Não ligue, professora. Acho que ele anda bem.
- E vocês, que fizeram nas férias? Aprenderam alguma coisa nova nos estágios nas empresas?
- Aprender? A mim só me mandavam limpar o pó!
- Eu aprendi. E até já tenho emprego para as férias, que o dono da oficina disse que eu podia ir ajudar.
- Fantástico!
- Eu também. A costureira disse-me que eu podia ir nas férias grandes trabalhar com ela.
- Isso é que é sorte! Agarra a tua oportunidade, D., que podes não voltar a ter outra!
- Eu também aprendi.
- Aprendeste? - Olho com expetativa para o meu aluno. Do "novo" grupo (sem o aluno que foi institucionalizado), é talvez o que mais dores de cabeça me causa...
- Aprendi a controlar-me.
A maior parte destes alunos está habituada a reagir a provocações da pior maneira. Julgo que é esse o modelo que têm em casa, e é essa a estratégia de sobrevivência que desenvolveram ao longo da sua triste vida. Quebrar o ciclo e aprender o auto-controlo não é tarefa fácil, nem se consegue de um dia para o outro. Percebo que L. está a falar com sinceridade, e dou-lhe os meus parabéns.
- Sabes, L., seres capaz de te controlar é a melhor lição que podes aprender. Quando nos deixamos levar pelos nossos impulsos imediatos, tornamo-nos escravos e perdemos a liberdade. Podes ver isso, por exemplo, no teu colega que deixou a turma. Incapaz de se controlar, precisou que outros o controlassem.
L. está a ouvir, mas faz de conta que a conversa não lhe interessa.
- Sermos capazes de nos controlarmos faz de nós livres. Tu é que escolhes se te deixas provocar ou não. A resposta é tua, não do colega que te provocou. A decisão está nas tuas mãos. No dia em que conseguirmos controlar os nossos impulsos, seremos senhores de nós mesmos. Nesse dia, podes levantar a cabeça, porque venceste a batalha!
Não lhe digo mais nada, mas enquanto observo os seus esforços evidentes para se comportar (serão duradouros?) lembro-me de S. Paulo. Numa longa explicação na Carta aos Romanos, ele falou precisamente deste assunto, que eu vi exemplificado na minha sala de aula:
"Deparo-me, pois, com esta lei: em mim, que quero fazer o bem, só o mal está ao meu alcance. Sim, eu sinto gosto pela lei de Deus, enquanto homem interior. Mas noto que há outra lei nos meus membros a lutar contra a lei da minha razão e a reter-me prisioneiro na lei do pecado que está nos meus membros. Que homem miserável eu sou!" (Rm 7, 21-24)
S. Paulo está aqui a falar dos meus alunos, que estão prisioneiros do mal que os rodeia; mas S. Paulo está também a falar de mim, que sei muito bem qual é a Lei de Deus, que cresci com acesso livre a ela, e que mesmo assim, me deixo imprisionar pelo pecado... Quantas vezes, na relação com os outros, me deixo levar pelos meus instintos de cansaço, irritação, impaciência? Os meus alunos têm mais desculpa do que eu.
Já depois da aula terminar, e de eu ter lutado arduamente contra os meus instintos mais primários, que me incitavam a gritar, a ridicularizar, a responder no mesmo tom; já depois de todos os meus alunos sairem da sala, percebo que só há uma forma de vencer este combate. E essa forma está contida naquelas duas palavrinhas: "Nós, Jesus." De facto, é também essa a conclusão de S. Paulo:
"Quem me há-de libertar deste corpo que pertence à morte? Graças a Deus, por Jesus Cristo, Senhor nosso! (...) Se com Cristo sofremos, também com Ele seremos glorificados." (Rm 7, 25.8, 17)
Jesus, ajuda-me a morrer contigo para o pecado, para contigo ressuscitar para a felicidade. Sei que não o conseguirei sem luta, sem sofrimento, sem cruz; mas também sei que é esse o único caminho que leva à ressurreição, pois ninguém ressuscita sem antes morrer - e morrer para si mesmo! Nós, Jesus... Ámen!
A Sara está na fase dos "terríveis dois anos", ou como também é conhecida, a "adolescência da infância". Mas asseguro-vos que está a dar mais trabalho esta "adolescência" do que a dos dois mais velhos! A Sara anda a treinar a palavra "não" e a palavra "sozinha". Oram apreciem esta sequência de imagens, ontem de manhã, enquanto durou a minha paciência e a Sara tentou vestir - sozinha - o casaco:
Não vos conto o choro e os gritos finais - quando o meu tempo e paciência se esgotaram e o casaco teve de ser vestido à força - para não vos assustar! Na verdade, uma vez é engraçado, duas é fofinho, três começa a ser cansativo, quatro torna-se insuportável, cinco, seis, dez, vinte, cinquenta por dia, causa um enorme estoiro nos níveis de tolerância de uma mãe cansada. Mas dois anos são dois anos, e como tudo na vida, hão-de passar, mais ou menos daqui a outros dois anos (oh céus!), pelo que há que ir treinando a paciência. Se não fossem os meus filhos para me ajudarem a combater o "homem velho", a crescer nas virtudes, a trabalhar o carácter, que seria de mim?
Enquanto observava a Sara na sua luta com o casaco, e escutava as suas palavras atabalhoadas - "Eu sozinha!" - pensava nas palavras de Jesus:
"Se não vos tornardes como crianças,
não entrareis no Reino dos Céus." (Mt 18, 3)
Jesus falava em crianças muito mais pequenas, com menos de dois anos, com toda a certeza! É que, se é muito importante para o nosso crescimento psicológico e humano a fase de independência que a Sara vive estes dias, o crescimento espiritual acontece no sentido contrário: quanto mais nos aventuramos nos caminhos do Senhor, mais pequenos precisamos de nos tornar. O salmista entendeu-o muito bem:
"Tranquila e sossegada
como criança de peito ao colo de sua mãe,
assim está minha alma dentro de mim..." (Sl 131)
Como Deus é paciente perante os nossos esforços contínuos de independência! E que sentido de humor deve ter, ao ver-nos tão trapalhões! Ao contrário de mim, Deus nunca Se deixa levar pela irritação, não nos força a fazer o que não queremos, nem nos impõe a sua vontade...
Claro que quem fica a perder somos nós. A tranquilidade, a paz, a alegria e o crescimento só acontecem na nossa vida na medida da nossa dependência do Senhor. Jesus não quer que façamos nada sozinhos, mas antes que, em tudo, Lhe peçamos ajuda. "Nós, Jesus: Tu e eu", repetimos. "Nós vamos lavar a loiça", "Nós vamos dar aulas à turma do Vocacional", "Nós vamos fazer os testes", "Nós vamos dar banhos e cuidar das crianças", "Nós vamos estudar". "Nós".
"Porque sem Mim, nada podeis fazer." (Jo 15, 5)
O início do ano lectivo cá em casa é sempre muito atarefado, pois coincide com um dos momentos mais atarefados também da minha vida profissional enquanto professora - conhecer as turmas, planificar aulas, adaptar planificações para alunos especiais, preparar materiais, etc etc etc. Se a tudo isto juntar a preparação e a realização de um retiro Famílias de Caná, a preparação da catequese e algumas outras coisas, fico com um volume de trabalho bem mais elevado do que seria desejável. Felizmente que esta montanha de tarefas se irá simplificar nas próximas duas semanas, até me permitir entrar no meu ritmo normal da vida, que é geralmente muito preenchido, mas muito tranquilo. Contudo, entre o "agora" e o "finalmente", ainda ficam uns "entretantos" por resolver...
Quando o volume de trabalho é mesmo demasiado; quando estou tão cansada, que já não tenho forças para continuar a apanhar brinquedos e lixo do chão; quando a paciência parece escoar-se mais depressa do que as birras dos filhos; quando o barulho na sala de aula custa a controlar; quando só me apetece fugir de volta para o verão... - então eu uso uma fórmula infalível: "Nós, Jesus, Tu e eu!"
"Nós, Jesus, vamos juntos dar mais esta aula."
"Nós, Jesus, vamos lavar a louça."
"Nós, Jesus, vamos estender a roupa enquanto a sopa ferve, e dar comida às galinhas enquanto o assado não termina."
"Nós, Jesus, vamos enfrentar o cesto de roupa para passar a ferro, que quase toca o tecto (acho que estou a exagerar, mas só um pouquinho...)"
"Nós, Jesus, vamos procurar na net actividades giras para os alunos daquelas turmas difíceis."
"Nós, Jesus, vamos controlar as birras do António, verificar os trabalhos de casa da Lúcia e do David, limpar o chichi no chão da Sara."
Também os apóstolos falavam sempre no plural, incluindo Deus nas suas decisões e nos seus trabalhos:
"O Espírito Santo e nós decidimos..." (At 15, 28)
Penso que é isto que Jesus nos pede, quando nos convida a rezar sem cessar: Jesus quer que transformemos todo o nosso dia em oração, todas as nossas decisões em oração, todas as nossas actividades em oração. A nossa vida deixa então de estar nas nossas mãos e aninha-se inteira nas mãos do Senhor.
Há por aí tantas propostas de exercícios psicológicos ou oriundos de religiões pagãs, sobre métodos para alcançar a paz interior... Eu ainda não descobri nenhum mais poderoso do que esta simples oração!
Jesus nasceu numa gruta, fora da cidade, porque não havia para Ele lugar em nenhuma casa de Belém. Ao longo de todo o advento, procurámos fazer espaço para Ele cá em casa:
Enchemos de estrelas o céu do presépio, cada estrela significando um gesto de amor conseguido. Sabemos que Deus presta muito mais atenção a cada uma das estrelas lançadas neste céu do que a toda a lama que também fomos fazendo!
Descobrimos que "há mais alegria em dar do que em receber" (At 20, 35).
A véspera de Natal foi bastante movimentada, mesmo com o temporal lá fora. Era preciso levar um presente e um sorriso aos amigos, aos vizinhos, às avós... Depois, com muito cuidado e entusiasmo, os meninos decoraram um cabaz especial, para ser entregue a uma família também muito especial, pois na sua pobreza, foi para nós o sinal do presépio. O cabaz ficou lindo:
E mais lindos ainda foram os sorrisos que provocámos com a nossa oferta!
Na missa de dia 25, Jesus nasceu para nós. Agora precisamos de viver este grande mistério do Emanuel, Deus connosco, em cada dia da nossa vida. Por isso, gostamos de repetir muitas vezes:
"Nós, Jesus, Tu e eu"
"Nós, Jesus, vamos trabalhar,
Nós, Jesus, vamos brincar,
Nós, Jesus, vamos lavar a louça,
Nós, Jesus, vamos desenhar,
Nós, Jesus, vamos ver televisão,
Nós, Jesus, vamos estudar..."
A partir do Natal de Jesus, nenhum ser humano está realmente só sobre a Terra. Ele está connosco em cada gruta da nossa vida, por mais escura e pobre que ela seja. E tudo o que fazemos com Jesus, tem valor eterno!