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Disparates

por Teresa Power, em 29.04.15

Não sei se todos os leitores deste blogue sabem ou recordam o que é viver com uma criança de dois anos em casa. Para os mais esquecidos, aqui ficam algumas pistas...

Num destes dias, a Sara veio do jardim muito contente, acompanhada do António e da Lúcia. Na mão, segurava isto:

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 Aproximei-me para ver mais de perto o curioso objeto. A Clarinha entrou nesse momento na sala e os gritos que deu fez a nossa casa parecer um filme de terror. Querem ver mais de perto também?

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 Sim, é um rato morto, certamente pelos nossos gatos...

Outro dia, deixei a Sara sentada na sanita. Passados alguns minutos, ela correu para junto de mim, muito satisfeita, a dizer: "Mamã, disparate! Mamã, disparate!" Dirigi-me à casa de banho para ver o disparate... E deparei-me com isto:

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Já não é a primeira vez que a Sara se entretem a desenrolar o papel higiénico, claro!

De outra vez, o telemóvel tocou, tocou, e eu não o conseguia encontrar. Sempre atrás do toque, fui levada até ao jardim, e no jardim, até à oliveira. O som vinha abafado e contínuo. Poderia o telemóvel estar... dentro da oliveira? De repente, vi isto:

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Aproximei-me... E encontrei o que tão desejado telemóvel!

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 Nessa mesma tarde, o Niall tinha recebido uma mensagem supostamente minha, a dizer: "aoytm,m ghrmme yeertidm"... Bem... Tive sorte a mensagem ter ido ter ao Niall e a mais ninguém!

Mas ontem passou das marcas. A Sara apareceu junto de mim sem sapatos, sem meias, sem calças e sem cuecas. "Sara, onde tens a roupa?" Perguntei. "Não sei!" Foi a resposta. Corri a casa toda à procura, mas sem sucesso. Decidi vesti-la com outra roupa, e não pensei mais no assunto. Até que horas depois, no pátio, tive esta visão:

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 Sim, são as casotas dos cães e os seus pratinhos... Mas há mais alguma coisa no recipiente da água. Querem ver mais de perto?

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- Deve ter aprendido contigo, Teresa - Disse-me o Niall a rir, quando o chamei para ver - Passas a vida a lavar roupa! A Sara só te quis imitar!

 

As crianças de dois anos são verdadeiros artistas na arte de esgotar a nossa paciência. Nem sempre reajo pegando na máquina fotográfica... Às vezes, reajo com uma palmadita no rabo e um raspanete. Em dias de maiores disparates, quando a oração familiar é complicada e agitada, ao fazermos a invocação dos nossos santos protetores - Santa Clara, rogai por nós! Irmã Lúcia, rogai por nós! Etc - alguém acrescenta, brincalhão: "Santa Paciência!" e todos respondemos a rir, "Rogai por nós!"

 

Os disparates da Sara fazem-me sempre, sempre meditar no amor de Deus - embora nem sempre na hora...

Diz o Senhor através do profeta Oseias:

 

"Quando Israel era ainda menino, Eu amei-o, e chamei do Egito o meu filho. Mas quanto mais o chamei, mais ele se afastou. Entretanto, Eu ensinava Efraim a andar, trazia-o nos meus braços, mas não reconhecia que era Eu quem cuidava dele. Segurava-o com laços humanos, com laços de amor, fui para ele como os que levantam uma criancinha contra o seu rosto, inclinei-me para ele para lhe dar de comer..." (Os 11, 1-4)

 

Os disparates da Sara, que às vezes me fazem rir, e outras vezes me fazem perder a paciência, em nada beliscam o imenso amor que tenho por ela. Por ela, eu sou capaz de dar a minha vida. E de cada vez que ela corre para mim, dizendo com simplicidade e confiança: "Disparate!" Eu aperto-a contra o peito e parece-me amá-la ainda mais.

Os meus disparates, que às vezes fazem sorrir, outras vezes entristecem o Senhor, em nada beliscam o imenso amor que me tem. Por mim, o Senhor é capaz de dar a vida. Por mim, aliás, Jesus já deu a sua Vida... E de cada vez que corro para os seus braços, dizendo com simplicidade e confiança: "Perdoa-me!" Ele aperta-me contra o peito e ama-me ainda mais...

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publicado às 06:24

Conversa a sós

por Teresa Power, em 16.04.15

A Lúcia e a Sara brincavam animadamente na sala. A Lúcia era a professora, a Sara era a aluna. Eu passava a ferro, enquanto escutava.

- Agora vamos aprender a letra H - Dizia a professora - Sara, vem ao quadro!

E lá ia a Sara, toda contente, sem saber bem o que fazia.

- Sara, estás a portar mal! Tens de respeitar os outros!

E a Sara sorria, feliz.

- Sara, continuas a portar mal. Temos de ter uma conversa a sós. Vamos ali fora da sala, só nós as duas.

A Lúcia sentou-se no sofá - presumivelmente fora da sala de aula - e chamou a Sara para o seu colo. Depois de lhe dar um abraço, disse-lhe baixinho:

- Tens de aprender a portar bem e a respeitar os outros!

E com um beijinho, mandou-a de volta para a "sala". Eu pousei o ferro e tirei esta fotografia:

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Enquanto a brincadeira prosseguia, e o ferro deslizava sobre a montanha de roupa a meu lado, fiquei a pensar no conteúdo da conversa da Lúcia. Eu já sabia que ela tinha uma ótima professora, pois tivera a mesma experiência com o Francisco. Mas a brincadeira fizera-me descobrir alguns pormenores importantes: quando a professora quer ralhar com algum menino, não o faz em público, diante da turma, mas chama-o à parte, fora da sala de aula. E aí não o trata com aspereza, mas com ternura, como a Lúcia fez com a Sara. 

Que grande lição para mim! Quantas vezes ralho com um filho diante dos irmãos, ou com um aluno diante da turma inteira? No entanto, o Evangelho é muito claro:

 

"Se o teu irmão pecar, vai ter com ele e repreende-o a sós. Se te der ouvidos, terás ganho o teu irmão." (Mt 18, 15)

 

Afinal, é assim que Jesus faz connosco, oferecendo-nos a oportunidade de confessarmos o nosso pecado a sós, de um para um, no confessionário... E fá-lo sempre com tanta ternura!

Obrigada, professora Rosário, obrigada Lúcia, obrigada Senhor, por mais esta lição. Que eu saiba repreender em privado e elogiar em público, sem aspereza e cheia de amor. Ámen!

 

 

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publicado às 06:12

O trabalho em férias e o Aleluia da Sara

por Teresa Power, em 07.04.15

 As minhas férias da Páscoa foram cheias de trabalho. Para além do trabalho da escola, que este ano se intensificou para os professores de Inglês, a braços com ações de formação obrigatórias por causa do novo "exame" do nono ano, foi preciso preparar os próximos retiros, adequando ensinamentos antigos à nova proposta que o nosso bispo nos fez, no Retiro de Quaresma, das Seis Bilhas de Caná.

Mas como férias significa, essencialmente, tempo de família, o meu trabalho fez-se em episódios semelhantes a este:

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Não se admirem, pois, se encontrarem algum erro nestes posts recentes :)

E se quiserem ficar a conhecer as Seis Bilhas de Caná, venham ao retiro de Viana! Inscrevam-se online, clicando no link na coluna lateral deste blogue. Segundo me disse o senhor padre Vasco Gonçalves, o Convento de São Domingos tem espaço para todos vós!

A Sara deve ter percebido que eu ando com pouco tempo para escrever no blogue, e por isso decidiu fazer ela um post cantado e dançado, cheio de aleluias pascais. A Clarinha filmou-a em plena atividade! Deixo-vos pois com o seu convite à alegria da Páscoa:

 

Se a quiserem acompanhar, aqui fica o cântico, a partir do salmo 148:

 

"Glória a Deus! Glória a Deus! No alto dos céus!"

Louvor e glória ao teu nome, aleluia! Aleluia!

Senhor Deus do Universo, aleluia! Aleluia!"

 

E não me digam que não é isto o que ela está a cantar... :)

 

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publicado às 06:33

"Eu sozinho"

por Teresa Power, em 02.03.15

A Sara está na fase dos "terríveis dois anos", ou como também é conhecida, a "adolescência da infância". Mas asseguro-vos que está a dar mais trabalho esta "adolescência" do que a dos dois mais velhos! A Sara anda a treinar a palavra "não" e a palavra "sozinha". Oram apreciem esta sequência de imagens, ontem de manhã, enquanto durou a minha paciência e a Sara tentou vestir - sozinha - o casaco:

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Não vos conto o choro e os gritos finais - quando o meu tempo e paciência se esgotaram e o casaco teve de ser vestido à força - para não vos assustar! Na verdade, uma vez é engraçado, duas é fofinho, três começa a ser cansativo, quatro torna-se insuportável, cinco, seis, dez, vinte, cinquenta por dia, causa um enorme estoiro nos níveis de tolerância de uma mãe cansada. Mas dois anos são dois anos, e como tudo na vida, hão-de passar, mais ou menos daqui a outros dois anos (oh céus!), pelo que há que ir treinando a paciência. Se não fossem os meus filhos para me ajudarem a combater o "homem velho", a crescer nas virtudes, a trabalhar o carácter, que seria de mim?

 

Enquanto observava a Sara na sua luta com o casaco, e escutava as suas palavras atabalhoadas - "Eu sozinha!" - pensava nas palavras de Jesus:

 

"Se não vos tornardes como crianças,

não entrareis no Reino dos Céus." (Mt 18, 3)

 

Jesus falava em crianças muito mais pequenas, com menos de dois anos, com toda a certeza! É que, se é muito importante para o nosso crescimento psicológico e humano a fase de independência que a Sara vive estes dias, o crescimento espiritual acontece no sentido contrário: quanto mais nos aventuramos nos caminhos do Senhor, mais pequenos precisamos de nos tornar. O salmista entendeu-o muito bem:

 

"Tranquila e sossegada

como criança de peito ao colo de sua mãe,

assim está minha alma dentro de mim..." (Sl 131)

 

Como Deus é paciente perante os nossos esforços contínuos de independência! E que sentido de humor deve ter, ao ver-nos tão trapalhões! Ao contrário de mim, Deus nunca Se deixa levar pela irritação, não nos força a fazer o que não queremos, nem nos impõe a sua vontade...

Claro que quem fica a perder somos nós. A tranquilidade, a paz, a alegria e o crescimento só acontecem na nossa vida na medida da nossa dependência do Senhor. Jesus não quer que façamos nada sozinhos, mas antes que, em tudo, Lhe peçamos ajuda. "Nós, Jesus: Tu e eu", repetimos. "Nós vamos lavar a loiça", "Nós vamos dar aulas à turma do Vocacional", "Nós vamos fazer os testes", "Nós vamos dar banhos e cuidar das crianças", "Nós vamos estudar". "Nós".

 

"Porque sem Mim, nada podeis fazer." (Jo 15, 5)

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publicado às 06:25

Quivi

por Teresa Power, em 07.02.15

No domingo passado, como corolário de uma semana de gastroenterite, foi a vez da Sara vomitar. Já sem grande capacidade de reação, lavei a colcha da minha cama - que a Sara decidiu começar a sua sessão de vómitos enquanto a mudava sobre a minha cama -, os tapetes, as roupas, etc, com a preciosa ajuda da minha máquina cristã. Segunda-feira tive de ficar em casa com ela, faltando à escola. A Sara já estava mais bem disposta, mas continuava com os intestinos muito acelerados. Depois de brincarmos às escondidas sob a roupa a secar...

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 ... de passarmos a ferro um castelo de roupa e de dobrarmos pares de meias sem fim (sim, a Sara ia "ajudando"...)

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 ... a Sara fez-me um pedido:

- Quero quivi!

Olhei para ela com espanto:

- Quivi? Com os intestinos como tens, a desfazerem-se em água? Não, Sara, não te vou dar quivi. Vou dar-te um caldinho de cenoura e vais com muita sorte!

O tom de súplica tornou-se mais insistente:

- Quero quivi!

- Não, Sara, não há quivi hoje para ninguém.

Mas a Sara tinha visto a enorme caixa de belos e apetitosos quivis, que um simpático casal com quem nos cruzamos todos os domingos na missa nos oferecera. Sem paciência para me aturar, a Sara começou aos gritos:

- QUERO QUIVI! QUERO QUIVI! QUERO QUIVI!

 

Enquanto a procurava distrair, mostrando-lhe os passarinhos a saltitar no jardim e as gotas de chuva a cair, pensei na forma como tantas vezes rezo, e rezo mal... Como a Sara, também peço o que não me convém, e bato o pé porque o quero a todo o custo. Já o Apóstolo Tiago explicava aos cristãos:

 

"Pedis e não recebeis porque pedis mal, para gastardes com as vossas paixões." (Tg 4, 3)

 

Quantas vezes a minha oração se assemelha a uma lista de compras... "Dá-me isto, dá-me aquilo..." É tentador utilizar a oração para satisfazer as nossas paixões, e para nos queixarmos de tudo o que o Senhor não nos dá ou nos tira. E somos muito mal-criados na forma como o fazemos!

Jesus ensinou-nos a pedir, sim, com a simplicidade de uma criança que pede, insiste e volta a pedir a seu pai. Mas depois de cada pedido, Jesus ensinou-nos a acrescentar uma palavra de delicadeza, semelhante ao "se faz favor" que ensinamos às crianças:

 

"Seja feito como Tu queres, e não como Eu quero" (Mt 26, 39)

 

Ou:

 

"Seja feita a tua vontade, na terra como no céu." (Mt 6, 10)

 

Assim seja mesmo!

 

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publicado às 06:18

Lembra-te

por Teresa Power, em 23.01.15

Hora da oração familiar. No Canto de Oração, cantamos, dançamos, batemos palmas e louvamos o Senhor. Depois, à vez, cada um de nós agradece a Jesus as graças deste dia. Uns agradecem a brincadeira na escola, outros agradecem o teste ter corrido bem, ou a ginástica ter sido divertida. Agradecemos o trabalho apostólico, os mails recebidos, os amigos encontrados. Agradecemos o alimento, a amizade e o amor.

Como esta oração de acção de graças é feita por ordem crescente de idades, a primeira a rezar é a Sara. De joelhos e com as mãos juntas, a Sara diz sempre a mesma coisa:

- "Bigada" Jesus, poque escola, missa, Curia, parque, loja. Ámen!

Nós rimo-nos sempre baixinho desta oração trapalhona. Na verdade, a Sara entretem-se a repetir o que ouve os irmãos dizer. Acontece que não repete apenas uma das suas orações, mas todas, fazendo memória de todas as acções de graças por eles feitas nos últimos meses. Assim, até bem perto do Natal, a Sara agradecia pela praia - que não visita desde outubro; e a partir do Natal, a Sara começou a agradecer pela Curia, onde foi várias vezes durante as férias e onde se deleitou a dar pão aos peixinhos e aos patinhos:DSC00578.JPG

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Também agradece pela loja, isto é, a padaria onde o pai leva os irmãos de manhã cedo a comprar o pão, ao fim-de-semana, e que eles de vez em quando agradecem - a Sara fá-lo diariamente; e pela missa, claro está, mesmo nos dias de escola mais demorada.

 

O que a Sara faz, meus caros amigos, é afinal aquilo que todos somos chamados a fazer: a memória das bênçãos recebidas. A oração da Sara, que nos faz sorrir, faz-nos também recordar os belíssimos tempos de família passados à beira-mar, no longo verão, ou nos parques onde gostamos de brincar. A Sara não nos deixa esquecer! Diz-nos o salmo 77/78:

 

"O que ouvimos e aprendemos,

o que os nossos pais nos contaram,

não o ocultamos aos nossos descendentes,

mas o transmitiremos à geração seguinte:

os feitos gloriosos do Senhor,

o seu poder e as maravilhas que Ele fez.

O Senhor ordenou a nossos pais

que ensinassem a sua lei aos filhos,

para que os seus filhos, quando crescessem,

a transmitissem a seus próprios filhos,

para que pusessem a sua confiança em Deus

e não esquecessem os feitos de Deus..."

 

Estaremos nós suficientemente atentos às bênçãos recebidas? Será que recordamos e fazemos memória agradecida de tudo quanto do Senhor recebemos, ao longo da vida? Diremos vezes suficientes "Obrigado, Senhor"? Contamos aos nossos filhos a longa e bela História da nossa Salvação, registada na Bíblia?

Que a simplicidade da oração da Sara nos ajude a ver para além das nossas dores e das nossas queixas, para além das nossas limitações e do nosso pecado, e a fixar o olhar n'Aquele que nos criou, que nos salvou, e de Quem tudo recebemos...

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publicado às 06:31

À mesa

por Teresa Power, em 21.12.14

Sentar uma família numerosa à volta de uma mesa não é fácil. Primeiro, claro, está o problema da mesa. Este ano achámos que estava na altura de mandar fazer uma mesa bastante maior, para os meninos se poderem sentar sem refilar. Ultimamente, na verdade, as refeições tinham alguns refrães incomodativos: "Chega-te para aí!" "Baixa as asas!" "Não me dês pontapés!" "Como é que queres que corte a carne com os braços tão juntos do corpo?" "Não entornes o meu copo!" Acabámos por nos convencer que uma mesa grande não é um luxo, quando se tem seis filhos em crescimento. Agora, até temos espaço para colocar no centro a coroa de Advento, nos domingos:

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Mas o tamanho da mesa não diminuiu o tamanho das birras, pelo menos de algumas. Para nosso grande desapontamento, apercebemo-nos que o refrão mudou, mas continua a existir... Às vezes é a sopa que está quente, outra, o mano que mesmo antes de vir para a mesa tirou um brinquedo. Já chegámos a ter os quatro mais novos a chorar ao mesmo tempo, todos por razões diferentes, o que fez os dois mais velhos dar uma gargalhada e comentar: "A família Power está particularmente bem disposta hoje!" Com receio que vocês não acreditem nas minhas palavras, apanhei o David em flagrante delito de choro à mesa, mesmo com uma magnífica "Apple crumble" diante dele:

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Um outro problema natural das nossas refeições é a quantidade de vezes em que precisamos de nos levantar. Felizmente agora já partilhamos essa tarefa com o Francisco e a Clarinha! O Niall costuma cantarolar um pequeno refrão do filme clássico do Winnie the Pooh, em inglês: "Up, down, turn around..." ("Levanta, senta, dá uma voltinha...") Um dia, li o dito divertido de uma humorista: "Desde que me tornei mãe, passei a comer tudo frio, excepto os gelados." Como eu a entendo!

 

Porque insistimos, então, em comer todos juntos? Porque não facilitamos e sentamos os meninos diante da televisão, ou cada um em frente do seu computador, ou porque não comemos separadamente? Porque somos cristãos. E o cristianismo nasceu e celebra-se à volta da mesa - a mesa da Eucaristia! Aliás, o cristianismo é a única religião onde podemos comer de tudo e com todos. "Comei tudo o que vos for servido" (1Cor 10, 27), disse S. Paulo. Jesus ficou bem conhecido por se sentar à mesa com publicanos e pecadores.

 As nossas refeições têm muito choro, mas também muitas gargalhadas. Enquanto jantamos, e mesmo com a música de fundo das birras, conversamos. À volta da mesa, aprendemos a comer de tudo o que nos é servido, sem esquisitices e sem fundamentalismos; aprendemos a escutar o outro, e aprendemos a esperar a nossa vez de falar. Às vezes, são os mais velhos que dominam a conversa, e os pequenos escutam sem entender muito bem; outras, são os pequeninos que nos presenteiam com as suas brincadeiras, enquanto os mais velhos engolem a vontade de os interromper; outras ainda, é o pai que relata os acontecimentos do mundo, ou a mãe que conta o que aconteceu na escola. A conversa é só uma.

Esta insistência nossa na partilha da vida em família parece dar frutos! Ontem, durante a refeição, o António decidiu que não comia a sopa, fazendo como de costume um grande espalhafato, com lágrimas e tudo. Nós, como de costume também, ignorámos a cena e continuámos a comer. Mas houve alguém que não ignorou: a Sara. Cansada de ver o irmão chorar, a Sara pegou-lhe no braço e fez com ele o gesto de levar a colher à boca, enquanto repetia:

- Papa, Tóno! Papa, Tóno!

Fui imediatamente buscar a máquina fotográfica, para partilhar convosco a cena...

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 À volta da mesa, tornamo-nos família; e tornamo-nos família de Deus! Quando deixamos a mesa, cheios de alegria e felizes por termos conseguido ultrapassar todos os obstáculos, experimentamos a generosidade do Senhor, como nos diz o Evangelho:

 

"Todos comeram e ficaram saciados; e do que lhes tinha sobrado, ainda recolheram doze cestos cheios." (Lc 9, 17)

 

 

 

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publicado às 06:34

Não fui eu!

por Teresa Power, em 20.11.14

Gritaria maluca. A Clarinha espreita à porta do quarto:

- Mãe, manda-os calar, que assim não posso estudar!

O David choraminga, olhando para os livros:

- Ainda me falta taaaaaanto TPC!

A Lúcia mostra-me orgulhosamente um desenho, onde escreveu por baixo da gravura:

"Doo Mie"

- O que é que escreveste, Lúcia? - Pergunto, também eu quase aos gritos para me fazer ouvir sobre o gritaria que continua a chegar da sala:

- Não consegues ler? Escrevi: "Vovó Mimé"!

- Ah, voltaste a trocar o D e o V, e também te esqueceste de algumas letras, mas o desenho está lindo. Depois ajudo-te a escrever bem, agora tenho de ir ver o que se passa na sala.

Entro na sala um pouco precipitadamente, a tempo de ver a Sara a sair de debaixo da mesa e o António a saltar do sofá. E depois, para meu grande espanto, a Sara coloca-se em sentido e diz muito depressa:

- Não fui eu!

Uma pronúncia perfeita, e uma expressão de inocência mais perfeita ainda, ambas francamente chocantes (e hilariantes...) numa menina de dois aninhos... No chão, um copo partido.

 

No primeiro diálogo entre os seres humanos e Deus na Bíblia, já surgem explícitas estas palavras: "Não fui eu." É com elas que Adão se defende, acusando Eva, que por sua vez as volta a usar para acusar a serpente. "Não fui eu." E no entanto, bastava ambos terem admitido o seu pecado, chamá-lo pelo nome e confessá-lo ao Senhor, que os visitava, para tudo ser perdoado...

Ao longo de toda a Bíblia, apercebemo-nos do esforço de Deus para nos ajudar a confessar o nosso pecado. Parece ser este o ponto chave da conversão! A grande maioria dos cristãos ainda está convencida de que a confissão foi inventada pela Igreja Católica. Na verdade, embora o seu carácter sacramental pertença ao catolicismo, o acto de confessar os nossos pecados pertence à mais antiga tradição de Israel. Lemos no Livro do Levítico:

 

"Quando alguém é culpado de um destes delitos, deve confessar em que pecou; depois, apresentará ao Senhor, como reparação pelo pecado que cometeu, uma femea de gado miúdo, uma ovelha ou uma cabra, em sacrifício pelo pecado; e o sacerdote fará por ele o rito da expiação do seu pecado." (Lv 5, 5-6)

 

Scott Hahn, um autor católico convertido do protestantismo e com um conhecimento bíblico ímpar, faz esta descrição no seu livro Lord, Have Mercy (tradução minha):

"Imagine-se o leitor, no Antigo Israel, depois de reconhecer que pecou, preparando-se para fazer a sua confissão e o seu sacrifício. Primeiro era preciso preparar a viagem, talvez de alguns dias a pé ou a cavalo, nas ruas poeirentas e acidentadas infestadas de bandidos e animais selvagens, a caminho de Jerusalém. Consigo tinha de levar uma ovelha, uma cabra, ou até um touro. Claro que primeiro tinha de o dominar. A sua penitência estaria apenas no início. Em Jerusalém, teria de levar o animal até ao Templo. Depois, em frente do altar, pegar numa faca e matá-lo - sim, você mesmo. Teria de o cortar e preparar, separando as várias partes, retirando o sangue e oferecer tudo, peça a peça, ao sacerdote. Tudo isto fazia da confissão um gesto que o pecador nunca mais esqueceria. Comparados com estes actos do Antigo Israel, os nossos rituais são bastante monótonos..."

 

Como em relação a todos os rituais, Jesus simplificou a forma, enquanto elevava o significado do gesto até ao expoente máximo da graça divina. Hoje, como ontem, precisamos de "dominar o animal" que habita em nós, praticando a humildade; precisamos de nos aproximar de um sacerdote, caminhando pelas estradas poeirentas do nosso orgulho e do nosso preconceito; precisamos de nos ajoelhar e de contar, um a um, os nossos pecados, como quem corta um touro em pedaços pequenos; precisamos de os chamar pelo nome, aguentando firmes a vergonha e pedindo por eles perdão. O resto - oh, o resto - é o poder do sangue de Jesus, e já não do sangue de nenhum animal, inundando e transformando toda a nossa vida...

 

"Não fui eu!" Gritam os nossos instintos mais primitivos. Sim, fui eu. "Pequei muitas vezes por pensamentos, palavras, actos e omissões. Por minha culpa, minha tão grande culpa..."

Que o Senhor nos ajude a confessar o nosso pecado, para podermos abrir o coração ao seu perdão infinito e transformar a nossa vida! Ámen.

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                  (Dominando um animal...)

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publicado às 06:46

Um baptismo em dia de S. Martinho

por Teresa Power, em 12.11.14

O dia de S. Martinho tem na verdade muitas festas associadas! Para além da festa de S. Martinho, que merece um post à parte, já aqui falei na festa da Ana Maria Javouhey, que foi baptizada a 11 de novembro. Pois bem, cá em casa há ainda uma outra festa: a memória do baptismo da Sara! Foi também no dia de S. Martinho que a Sara, com quase dois meses, foi baptizada. Um dia que recordamos com muito carinho!

Recordo a sensação de estar à porta da Igreja, com a minha filha ao colo, pedindo a Deus e à comunidade cristã licença para entrar... Que emoção, e que experiência profunda de fé! Faz-nos bem tomar consciência de que a fé é um dom, e de que ninguém entra na Igreja de Deus senão através dos irmãos, que nos acolhem, que nos transmitem a fé e que nos ajudam a crescer. Assim, faz-nos bem bater à porta e escutar a voz sonora da comunidade a cantar, e a voz sonora do sacerdote que nos recebe de braços abertos. Disse o Papa Francisco na sua catequese sobre o baptismo:

"O baptismo é um dom que é concedido num contexto de solicitude e de partilha fraterna. Eu não posso baptizar-me sozinho, devo pedir o baptismo a outra pessoa. É um acto de fraternidade, um acto de filiação na Igreja." (8.1.14)

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Como foi bonito, então, caminhar pela igreja dentro com a Sara nos braços, e contemplar os sorrisos nos rostos que se voltavam para nós, em jeito de acolhimento fraterno!

Mais um pouco, e a Sara foi finalmente baptizada. Continua o Papa Francisco a explicar, na sua catequese:

"Com o baptismo, somos imergidos naquela fonte inesgotável de vida que é a morte de Jesus, o maior acto de amor de toda a história; e graças a este amor podemos viver uma vida nova, já não à mercê do mal, do pecado e da morte, mas na comunhão com Deus e com os irmãos."

 

Lembro-me da alegria nova, pura e profunda que senti quando a água se derramou sobre a sua cabecita. Foi verdadeiramente um novo nascimento... De repente, ela já não era minha filha, já não estava dependente da minha história ou do meu pecado, mas era toda de Deus!

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Pensando em mim e na minha natural tendência para o pecado, penso também em todas as mães solteiras, abandonadas, traídas que se abeiram da Igreja de Jesus para poderem baptizar os seus bebés... Penso na alegria que devem sentir ao perceber que, a partir do baptismo, aquele bebé está liberto do peso da história dos seus pais, e renasce como filho muito amado de Deus. Que nada nem ninguém nos impeça de pedir o baptismo para os nossos bebés!

 

Envolta numa veste branca, a Sara foi para todos nós, naquela igreja, sinal do poder santificante da graça de Deus. Como diz o Apocalipse:

 

"Estes são os que vêm da grande tribulação; lavaram as suas túnicas e as branquearam no Sangue do Cordeiro." (Ap 7, 14)

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Perceber que a Sara, tão pequenina, antes de alguma vez ter sequer pecado, foi salva pelo Sangue de Jesus, é profundamente comovente. Jesus não espera que pequemos para nos salvar! Jesus nem sequer espera que sejamos capazes de Lhe agradecer! O baptismo dos bebés, ao não exigir sequer que eles se apercebam do dom que recebem, é talvez o sacramento que melhor exprime a gratuidade do amor divino.

 

Os padrinhos seguraram connosco a vela, símbolo da fé. E desde então, nunca deixaram de acompanhar a Sara na sua descoberta do amor de Deus:

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Nem eles, nem, claro, a avó, comovida como sempre fica em todos os baptismos dos seus netos! E tem razão em se comover: a simplicidade da cena de um baptismo esconde uma verdade tão profunda...

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Ontem, dois anos depois deste belo dia, fizemos festa, seguindo o conselho do nosso Papa Francisco na mesma catequese:

"É importante conhecer o dia em que fui imergido nessa corrente de salvação de Jesus. E permito-me dar-vos um conselho, que é até um dever: hoje em casa, procurai, perguntai a data do baptismo. Conhecer a data do nosso baptismo significa conhecer uma data feliz. Mas o risco de não a saber é o de perder a consciência daquilo que o Senhor fez em nós, a memória do dom que recebemos. Devemos despertar a memória do nosso baptismo."

 

Assim, ontem à noite, para grande surpresa da Sara, colocámos-lhe entre as mãos a vela do seu baptismo, de novo acesa, e cantámos a plenos pulmões, no meio de muitas palmas: "Esta luz pequenina, vou deixá-la brilhar..." Olhem bem para a cara de felicidade:

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Querida Sara, que a luz que seguras entre as mãos brilhe por toda a eternidade, e guie sempre os teus passos! Tu que foste baptizada em Cristo, estás revestida de Cristo! Aleluia! Aleluia!

 

 

 

 

 

 

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publicado às 06:46

Onde estás?

por Teresa Power, em 06.10.14

Os meus filhos mais novos adoram brincar às escondidas. Mas enquanto o David, a Lúcia e o António procuram lugares onde se esconder, a Sara tem uma técnica muito mais simples: tapando os olhos com as mãos, deixa de me ver, concluindo do alto dos seus dois aninhos que consequentemente, eu também deixo de a ver. Assim, ela grita como os irmãos:

- "Já está!"

E fica calmamente à espera, de olhos bem tapados, enquanto eu percorro o jardim à procura dos irmãos.

 

Outro dia, durante a brincadeira, recordei-me de Adão e Eva, também eles escondidos de Deus num jardim:

 

"Ouviram, então, a voz do Senhor Deus, que percorria o jardim pela brisa da tarde, e logo se esconderam do Senhor Deus, por entre o arvoredo do jardim. Mas o Senhor chamou o homem e disse-lhe: «Onde estás?»" (Gen 3, 8-9)

 

Adão e Eva eram mais velhos do que a Sara, mas ainda assim, pensaram que Deus não os conseguia ver porque eles não O conseguiam ver a Ele.

O Papa Francisco conta com frequência a história da sua avó, da forma como a sua avó o ensinou a viver na presença de Deus, repetindo-lhe constantemente: "Olha que Deus te vê." E eu penso cá para comigo que, se estivessemos sempre conscientes de que Deus nos vê, não pecaríamos tanto!

Na verdade, Deus contempla-nos continuamente com um olhar de amor, e vigia cada um dos nossos passos. Podemos esconder-nos sob a folhagem da vida, como Adão e Eva, ou simplesmente tapar os olhos, como a Sara, mas mesmo assim, continuamos presentes diante do seu olhar. Aliás, foi neste olhar que começámos a existir e a ser amados, antes ainda da Criação do mundo, é neste olhar que iremos viver até ao fim, e é neste olhar que iremos ser julgados um dia. 

Hoje assistimos a uma crescente necessidade das pessoas exporem as suas vidas ao olhar do mundo, através de "reality shows" e concursos, onde se procura brilhar e conquistar a fama à custa do nada, à custa das intrigas da vida, ou à custa dos talentos de cada um. Ao mesmo tempo, cresce o medo deste olhar divino. No entanto, este olhar é o único que nos pode curar e libertar, porque não é um olhar interesseiro, intriguista ou curioso, mas um olhar profundamente amoroso.

Eu não conheço melhor forma de tirar as mãos dos olhos e expor a minha vida e o meu coração ao olhar amoroso do Senhor do que o sacramento da confissão. Ali, sou convidada, como Adão e Eva foram (e recusaram), a confessar um a um os meus pecados, e a fazê-lo na minha individualidade, a sós diante de Deus, representado no sacerdote. Ele já conhece o meu pecado, sim, como eu também sei onde a Sara se esconde... Mas eu preciso de destapar os olhos para enfrentar o seu olhar e acolher o seu amor! Então, como o Rei David cantou no salmo 50, redescubro a alegria da salvação...

 

 

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publicado às 06:35



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