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Somos uma família católica, abençoada com seis filhos na Terra e um no Céu. Procuramos viver a fé com simplicidade e generosidade. Queremos partilhar com outras famílias a alegria de sermos Igreja Doméstica na grande família da Igreja Católica.
- Meninos, estudem o texto para a próxima aula e pensem nas apresentações orais.
- Mas, professora, na próxima aula são revisões!
- Revisões de quê?
- Revisões para o teste.
- Teste? Já vamos ter teste?
- Sim, a professora marcou para dia 4...
Engoli em seco, abri o calendário escolar e confirmei: sim, vão ter teste para a semana - eles e as restantes seis turmas que leciono. O que significa que tenho de o fazer, e depois tenho de o corrigir. Numa fração de segundo, passaram-me pelo pensamento todas as coisas que têm de ser feitas nos próximos dias, para além daquilo que constitui a minha função principal, ou seja, todo o trabalho familiar. Quando, alguns instantes depois, a campaínha tocou e os meus alunos saíram da sala, fui invadida por uma sensação de pânico. Como irei eu ser capaz? Desci as escadas e dirigi-me ao carro.
- Boa tarde - Murmurei apressadamente para as senhoras do bar da escola, ao passar por elas a correr.
- Boa tarde, professora! - Responderam, sorridentes. E uma delas acrescentou: - Estávamos mesmo aqui a comentar que nunca vimos uma professora a correr tanto! Parece um passarinho aos saltinhos, o dia inteiro!
Dei-lhes o meu melhor sorriso e continuei a correr. Sentei-me ao volante, e o meu pensamento voava. Tinha cerca de vinte minutos disponíveis entre uma escola e outra - quase todos os dias dou aulas em três escolas diferentes - vinte minutos que costumo aproveitar para estender uma máquina de roupa ou adiantar o jantar. Mas desta vez, o caso era urgente, e eu precisava de uma solução. A meio caminho, decidi portanto ir ter com a única pessoa capaz de resolver o meu problema: virei para a esquerda e segui pela estrada de campo, até chegar a uma pequena capela, sempre aberta, onde Jesus espera por mim diariamente no sacrário. Estacionei e entrei.
Tudo estava silencioso, e junto do sacrário brilhava tranquilamente uma luzinha vermelha. Ajoelhei-me e contei a Jesus a minha história, desabafando com Ele o meu pânico. É sempre melhor desabafar com Jesus do que cansar os outros com os nossos problemas!
Enquanto falava, contemplava o enorme crucifixo que se elevava sobre o sacrário. Pareceu-me então escutar um diálogo que a Madre Teresa de Calcutá costumava ter com as suas irmãs. Quando as via agitadas, nervosas, tristes ou cansadas, fazia-lhes uma pergunta:
- Irmã, o que é que Jesus disse: para seguirmos à frente da Cruz ou atrás?
- Atrás, Madre - Respondia a Irmã, já com um sorriso.
- Então levante esse ânimo e caminhe atrás da Cruz de Nosso Senhor!
Caminhar atrás da Cruz é realmente bastante mais simples do que ter de abrir o caminho sozinhos. Quem vai atrás não precisa de se preocupar com as direções, pois tudo é decidido por quem vai à frente. O maior esforço de quem segue atrás é não perder de vista o que abre caminho, mantendo fixo nele o seu olhar. Se eu mantiver o meu olhar fixo em Jesus, se eu estiver disposta a colocar os meus pés nas suas pegadas marcadas a sangue no chão, nada me poderá perturbar ou roubar a paz...
"Vinde a Mim, vós todos que andais cansados, que Eu vos aliviarei!
Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de Mim, que sou manso e humilde de Coração
e achareis alívio para as vossas almas.
Porque o meu jugo é suave e a minha carga é leve." (Mt 11, 28-30)
Quando saí da capela, sorri sozinha ao recordar o comentário das senhoras do bar. Agora sim, parecia um passarinho aos saltinhos, de tão leve estava...
Costumo passar grande parte do meu serão, depois de deitar os meninos, ao computador, a trabalhar. O Niall, por seu lado, gosta de ver as notícias, e chama-me por vezes para me contar o que se passa no mundo.
- Repara nestas imagens do sofrimento causado pelo ébola - Disse-me, ontem à noite, enquanto assistia às notícias na BBC - A situação está o pior possível!
- Não tinha dado conta de que está tão grave.
- É natural. Os grandes temas da nossa televisão são o futebol e a crise, e o verdadeiro sofrimento do outro, a verdadeira crise que aflige os nossos irmãos em África e noutras partes do mundo passa-nos ao lado. Um dia dar-nos-emos conta do flagelo que o ébola significou, mas nessa altura já será tarde. Como o genocídio no Ruanda, por exemplo, que só chamou a atenção do mundo depois de ter feito oitocentas mil mortes em cem dias.
- Vivemos tão centrados em nós...
- Pois vivemos. Fazemos muito pouco pelos outros. E sabes porquê? Porque vivemos demasiadamente confortáveis.
- É verdade. Não entenderemos nunca o sofrimento do outro enquanto não experimentarmos um pouco de sofrimento também.
- Esse é uma das maiores bênçãos do sofrimento: amolecer o nosso coração, partir a pedra que temos dentro do peito, e tornar-nos humanos, verdadeiramente irmãos uns dos outros.
- Sim, como diz a Escritura:
"Dar-lhes-ei um só coração e infundirei neles um espírito novo. Extrairei do seu corpo o coração de pedra e dar-lhes-ei um coração de carne." (Ez 11, 19)
Em Manila, diante de 30 000 estudantes reunidos para escutar o Papa Francisco, uma menina de 12 anos chorou ao perguntar ao Papa porque sofrem as crianças. Esta menina vive actualmente numa instituição, mas já tinha procurado comida nos caixotes de lixo e dormido na rua.
As suas lágrimas disseram ao Papa que ela não se esquecera do que era sofrer; que ela experimentava em si mesma a dor do mundo; que o seu coração não era de pedra, mas de carne. Como o Papa depois explicou, as suas lágrimas fizeram teologia:
"Certas coisas da vida só podem ser vistas com os olhos limpos pelas lágrimas. Quem não aprender a chorar, nunca será bom cristão. O mundo de hoje precisa de aprender a chorar, chorar pelos marginalizados, pelos abandonados, mas os que levam uma vida mais ou menos sem necessidades não sabem chorar."
Na verdade, precisamos de experimentar um bocadinho de dor para sermos solidários com quem sofre. As pequenas dificuldades de cada dia ou os grandes sofrimentos da vida podem ser bênçãos que o Senhor nos dá para amolecer o nosso coração... Eu preciso de sentir frio em casa para imaginar minimamente o que é ser sem-abrigo, e preciso de reconhecer que sou verdadeira pecadora para entender o que Jesus me ofereceu na Cruz...
Hora de oração familiar. A Sara e o António já estão a dormir, depois de um curto momento de dança, canto e acção de graças. Hoje é o dia do David ler:
"Que Cristo, pela fé, habite nos vossos corações; que estejais enraizados e alicerçados no amor, para terdes a capacidade de apreender, com todos os santos, qual a largura, o comprimento, a altura e a profundidade do amor de Cristo, que ultrapassa todo o conhecimento..." (Ef 3, 17-19)
- Então como é o amor de Deus? - Pergunto.
- Alto, largo, profundo e comprido!
- David e Lúcia, ponham-se de pé e mostrem-nos lá o que é alto, largo e profundo! Divertidos, o David e a Lúcia fazem gestos grandes, enquanto eu repito: a largura, o comprimento, a altura e a profundidade do amor de Cristo...
- Parece-me que conheço uma coisa que é assim, alta, larga e profunda...
- O mundo?
- Bem, pode ser o mundo, mas também...
- A cruz!
- Exactamente! A cruz...
Na cruz, Jesus revelou-nos o comprimento, a altura, a largura e a profundidade do amor de Deus! Na cruz, também nós podemos revelar a Deus o comprimento, a altura, a largura e a profundidade do nosso amor por Ele...
Qual a minha cruz? Onde a encontro eu no dia-a-dia? No trabalho ou na falta dele? Nos filhos, ou na falta deles? Nos pais idosos? Nos colegas e nos amigos? Na doença, na deficiência, na falta de dinheiro, na falta de tempo, na dificuldade em rezar, na dificuldade em me manter fiel?
Seja qual for a minha cruz, ela é dom do amor de Deus na minha vida; e por ela, a minha vida pode tornar-se dom de amor... Abracemo-la então com alegria e entusiasmo! Ámen.
Hoje é dia de festa a triplicar: Festa da Exaltação da Santa Cruz, primeiro aniversário das Famílias de Caná e... 8º ANIVERSÁRIO DO DAVID!
Faz hoje oito anos que o nosso menino nasceu, com pouco mais de dois quilos e sobrolho franzido, depois de uma gravidez muito atribulada! Era muito pequenino, muito magrinho, mas extremamente amado e desejado. O seu nascimento, entre risos e lágrimas, foi um dos momentos mais marcantes da nossa família...
Hoje, o David é uma criança segura, calma, discreta, que gosta de estar sozinho com um livro ou com a sua colecção de animais, que já foi a colecção de animais do Francisco. O David tem um coração grande e uma vontade forte, e detesta zangar-se seja com quem for. Por enquanto acha que vai ser surfista (embora nunca tenha estado numa prancha de surf), ciclista e padre, se for possível ser tudo isso ao mesmo tempo. Se não for possível, o David diz que ainda tem tempo para escolher. Sim, David, tens muito tempo!
Com o nascimento do David, quatro meses depois da morte do Tomás, cumpriu-se em nós a Palavra da Escritura que diz:
"Eu mudarei o teu luto em alegria! Eu te consolarei!" (Jr 31, 13)
O David nasceu na Festa da Exaltação da Santa Cruz. A primeira leitura desta belíssima festa, que hoje escutamos, diz-nos que
"Moisés fez uma serpente de bronze e colocou-a num poste. Quando alguém era mordido por uma serpente venenosa, olhava para a serpente de bronze e ficava curado." (Nm 21, 9)
Quando o David nasceu, a Cruz de Jesus libertou-nos, como ao Bom Ladrão, do peso da nossa própria cruz, curando-nos do veneno da tristeza. Ah, os mistérios do amor de Deus...
Parabéns, querido David!
Amanhã, a Igreja celebra a Festa da Exaltação da Santa Cruz. Diz-nos a Tradição da Igreja que Santa Helena, mãe do imperador Constantino I, impulsionou as escavações que conduziriam à descoberta da verdadeira Cruz de Jesus, no Gólgota. A Igreja do Santo Sepulcro foi então construída nesse mesmo local, por ordem do imperador, e no dia 14 de setembro do ano 335, um pedacinho da Cruz de Jesus foi posta à veneração dos fiéis.
Num tempo em que as canonizações se faziam por aclamação popular, Helena foi santa, não porque encontrou a Cruz de Jesus, mas porque encontrou, nessa sua descoberta, o Jesus da Cruz. Na verdade, hoje não precisamos de muito para encontrar a cruz. Ela espera-nos a cada esquina do nosso dia atribulado, e o mundo experimenta-a sob toda a espécie de sofrimento, doença, guerra, fome, violência. A cruz é companheira da vida. O difícil, e o que transforma tudo, é encontrarmos, como Helena, o Jesus da Cruz. Quando isso acontece, tudo se transforma, e tudo somos capazes de suportar, porque encontramos o Amor:
"Nós amamos, porque Ele nos amou primeiro." (1Jo 4, 19)
As Famílias de Caná nasceram há um ano, no dia da Exaltação da Santa Cruz, quando realizámos o nosso primeiro retiro. Eram dez famílias e vinham cheias de vontade de escavar, escavar, escavar, até encontrar a Cruz da nossa Salvação, escondida sob o terreno pedregoso da vida. Como Santa Helena, no final do dia regressámos todos de coração cheio, porque nos tinhamos encontrado com o Jesus da Cruz!
Nesse primeiro retiro, os jovens construíram, com a orientação do Niall e a caixa de ferramentas do Francisco, uma belíssima cruz de madeira. Depois pintaram-na e enfeitaram-na com elementos da natureza ao seu redor. Ficou linda!
Foi essa mesma cruz que levámos no reencontro no Buçaco, como contámos aqui. Cada um dos jovens e das crianças mais velhinhas carregou a cruz à vez, e a alegria foi contagiante!
Amanhã é uma óptima ocasião para fazerem aí em casa crucifixos para os quartos dos mais novos, para o quarto do casal, para a sala, para a cozinha, para todas as divisões, como sinal de que queremos viver sob o signo da Cruz, a fonte da nossa alegria! Explicámos aqui como fizemos crucifixos com molas de madeira na quaresma do ano passado. Enviem as vossas fotos!
No próximo sábado teremos então o 6º Retiro Famílias de Caná. Como Santa Helena, será uma grande oportunidade para escavarmos no mais profundo do nosso coração até O encontrarmos, a Ele, o Senhor da Cruz! Façam as vossas inscrições o quanto antes (na coluna lateral deste blogue), porque já temos muitas famílias e em breve encerraremos as inscrições. Não se preocupem se não estão acostumados a estas coisas de Igreja, ou se não são cristãos ainda. Venham! Vai valer a pena...
E amanhã, domingo, cantem connosco os parabéns às Famílias de Caná, que completam um ano de vida!
- David, no verão vamos para o campo de futebol lançar aviões. Vou aprender a construir um pequeno avião estas férias, e tu vais ajudar-me!
- Ena, Frankie, ainda melhor que o carro de rolamentos!
- Sim, e vais ajudar-me a pô-lo a voar!
- Claro!
- Temos de aproveitar um dia de vento.
- O vento empurra o avião para cima?
- Pelo contrário! Sabes que os aviões descolam e aterram contra o vento?
Eu escutava distraída a conversa entre os dois rapazes, enquanto estendia roupa. A última questão do Francisco deixou-me curiosa.
- Ora explica lá isso melhor! - Pedi-lhe.
O Francisco explicou-me então as leis da aerodinâmica, utilizando termos como sustentação, gravidade, etc. Não reti muito de toda esta informação, pois a física não é o meu forte. Mas entendi o suficiente...
Ser cristão é levantar voo contra o vento, claro! Jesus disse-o antes ainda de morrer na cruz:
"Vão deitar-vos as mãos e perseguir-vos, metendo-vos nas prisões; hão-de conduzir-vos perante reis e governadores, por causa do meu nome. Assim, tereis ocasião de dar testemunho. Gravai, pois, no vosso coração, que não vos deveis preocupar com a vossa defesa, porque Eu próprio vos darei palavras de sabedoria, a que não poderão resistir ou contradizer os vossos adversários. Sereis entregues até pelos pais, irmãos, parentes e amigos. Hão-de causar a morte a alguns de vós e sereis odiados por todos, por causa do meu nome. Mas não se perderá um só cabelo da vossa cabeça. Pela vossa constância é que sereis salvos." (Lc 21, 12-19)
Estou convencida de que o cristianismo irá renascer na Europa, exactamente por causa da perseguição que, também na Europa, se está a intensificar contra os cristãos. Sem ventos contrários, não podemos levantar voo!
No momento em que escrevo, os cristãos na Síria, na Nigéria, no Iraque e em tantas outras partes do mundo estão a ser violentamente impedidos de professar a sua fé. No momento em que escrevo, o mundo aguarda a libertação de mais de 200 meninas cristãs, barbaramente raptadas há dois meses atrás quando frequentavam a sua escola cristã; no momento em que escrevo, uma mãe sudanesa encontra-se presa por ter cometido o delito de casar com um cristão. Tal como Jesus previu, esta mulher foi entregue pelos seus familiares. Junto dela, está um filho de 20 meses; no seu ventre, o segundo filho, com oito meses de gestação. O tribunal condenou-a à morte assim que termine a amamentação do bebé que está para nascer. O que devia Miriam fazer para salvar a sua vida? Renegar a sua fé. Com uma calma e uma segurança impressionantes, Miriam diz que nunca o fará. Miriam irá levantar voo contra todos os ventos, e alcançar uma coroa de glória que brilhará por toda a eternidade. Aqui fica o link para poderem assinar a petição pela libertação desta grande mulher, feita pela Amnistia Internacional.
Fico a pensar na quantidade de vezes em que adio o "voo" porque os ventos estão contrários... Se nos falta o tempo, deixamos de rezar; se nos falta o dinheiro, deixamos de ajudar os outros; se o marido ou a mulher não querem ir à missa, deixamos nós de ir; se a vida corre mal, perdemos a fé; se todos fazem, fazemos também; se ninguém faz, deixamos de fazer...
De que temos nós medo? Não prometeu Jesus cuidar até dos cabelos da nossa cabeça? Com medo dos ventos contrários, perdemos a oportunidade de voar!
Celebremos a Solenidade da Ascenção do Senhor - começando já esta quinta-feira, mas em especial no próximo domingo - levantando os olhos, o coração, a mente e a vontade para esse Céu, onde só um vento contrário nos pode lançar!
No fim do retiro, a Olívia tinha um presente para nós: uma dezena do rosário lindíssima, adquirida junto de uma amiga, a Isabel Figueiredo. O que me surpreendeu nesta dezena, mais ainda do que a beleza de cada conta e da forma como estão ligadas, foi o crucifixo. Ora vejam com atenção:
Sim, é uma roseira! A Olívia recordava-se do post sobre a poda das roseiras, que escrevi na quaresma passada, e da reacção dos meninos aos espinhos das rosas. E assim, pediu à sua amiga que rematasse a linda dezena com um crucifixo em forma de roseira. Domingo à noite, antes a procissão de Nossa Senhora Auxiliadora, o senhor padre abençoou esta dezena, e foi com ela entre os dedos que rezei.
Para colhermos as rosas que nesta altura do ano iluminam o nosso jardim, precisamos de não ter medo dos espinhos. Às vezes, eles ferem-nos os dedos e deixam que uma gota de sangue caia na terra. Mas que importa isso diante da beleza de cada rosa? Com um encolher de ombros, limpamos o sangue e concentramo-nos no perfume. No jardim, onde crescem ao sol, ou no Canto de Oração, onde alegram o pequeno altar de Maria, tudo nas rosas nos fala de alegria, de cor e de luz. Quem se lembra dos espinhos então?
Na sua primeira homilia papal, a 14 de março de 2013, o Papa Francisco recordou-nos:
"Quando professamos um Cristo sem cruz não somos discípulos do Senhor"
Na verdade, a cruz onde Jesus nos amou até ao fim tornou-se para nós em Árvore da Vida, e é esse o mistério pascal, que celebramos de forma mais intensa nestes dias. Temos problemas financeiros, profissionais, e até familiares? Custa-nos a rotina diária, o cuidar da família, o cuidar dos outros? Estamos doentes? O teste correu mal? O Pantufa fez um arranhão? O amigo magoou-nos? Dói a cabeça? A mãe ralhou sem razão, e o professor também? O filho fez-nos perder a paciência? Choveu durante todo o piquenique? Que alegria, podermos partilhar alguns dos espinhos que coroaram o nosso Rei! Pois se a sua coroa floriu, a nossa também florirá. Se partilharmos o seu trono (já sabem cantar aquele pequeno refrão sobre a realeza de Jesus?), com Ele reinaremos também. Disse Jesus - e neste tempo pascal já escutámos estas palavras na Eucaristia:
"Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida. Ninguém vai ao Pai a não ser por Mim." (Jo 14, 6)
Parece-me importantíssimo ensinarmos os nossos filhos - e vivê-lo nós também - este grande mistério: tudo, tudo, tudo pode ser, na nossa vida, fonte de alegria, desde que realizado com amor e por amor, em íntima união com o Amor, que por nós deu a vida numa cruz. É este o segredo da felicidade cristã, a razão profunda que faz com que os cristãos estejam sempre alegres!
No meu jardim, e no meio de muitos espinhos, as roseiras estão em flor...
É agora que se inspiram para fazer as vossas dezenas ou os vossos terços caseiros?...
O David e a Lúcia foram passar parte da tarde de sábado a casa de uns amigos. É uma casa grande, situada numa magnífica quinta, cheia de terra, areia, árvores, casebres abandonados, torres habitadas por morcegos vampiros (pelo menos eles juram que sim), hortas, silvas, uma eira, e até uma capela em ruínas (já em fase de restauração), onde o David praticou alguns gestos de futuro padre (foi o que ele explicou), como abrir os braços com muita força. A casa é realmente grande, mas o seu tamanho é justificado: lá dentro vivem nove crianças! Quando os fui buscar, levei o António e a Sara, e por lá andaram todos a brincar juntos, enquanto nós, as mães, punhamos a conversa em dia, passeando atrás deles. Ao colo, a minha amiga levava a filha mais nova, uma bebé linda, com trissomia 21.
- Esta bebé é uma verdadeira bênção na nossa vida - dizia-me.
- E uma bênção para os amigos, que têm a oportunidade de conviver com uma criança diferente e de aprender a amá-la - Acrescentei.
Continuámos a caminhar. De vez em quando, a Sara queria colo. Os outros corriam ao longe, gritando de alegria. A minha amiga ainda tinha outra coisa a dizer:
- O que nós desejamos acima de tudo é que os nossos filhos alcancem o céu. E eu sei que esta linda bebé tem o céu assegurado. Isso enche-me de verdadeira alegria! Tomara poder dizer o mesmo para os outros oito! Além disso, desde que esta bebé nasceu deixei de pensar: "Daqui a uns anos acaba-se o trabalho com as crianças e posso ficar descansada no sofá a ver televisão!" O meu horizonte mudou, sei que provavelmente esse dia nunca chegará. E isso também é uma bênção de Deus! É que ficar sentada no sofá não traz santidade!
Encontrar verdadeira alegria na dor é privilégio (não exclusivo!) dos cristãos. A partir da cruz de Jesus, tudo faz sentido. O sofrimento deixou de ser o fim, para ser o início. A morte tornou-se porta da vida; a dor, porta da alegria.
Conheço muitas outras famílias com filhos diferentes, e sei que há quem leia este blogue sentado numa cadeira de rodas. Como eu gostaria de lhes anunciar esta felicidade que Jesus nos traz!
"Na verdade, Ele tomou sobre Si as nossas doenças, carregou as nossas dores. Pelas suas chagas fomos curados!" (Is 53, 4-5)
Nos primeiros dias depois das férias escolares, passo quase todo o tempo "livre" que tenho a arrumar a desarrumação que eles causaram cá em casa. A esta tarefa já por si bastante aborrecida, junta-se a necessidade de trocar a roupa de inverno pela roupa de verão, se bem que este ano ainda não seja uma tarefa tão urgente quanto desejável. Foi no meio desta minha azáfama que o Niall e eu nos cruzámos no corredor, eu com os braços cheios de roupa, ele com os braços cheios de brinquedos, e ficámos alguns minutos a conversar. Ter seis filhos tem-nos ensinado muita coisa, e uma das mais importantes é a aproveitar qualquer meio minuto para conversar. É que a soma de todos estes meios minutos traduz-se numa intimidade cada vez mais profunda entre nós, e naturalmente, na maioria dos tópicos destes posts. Sim, embora seja eu a "escritora", a reflexão é sempre conjunta e feita aos bocadinhos soltos durante o dia!
Voltemos então à nossa conversa:
- Devias ter visto a fotografia do interior de uma casa que encontrei num blog! Tudo tão arrumado, tudo tão moderno! E eu aqui, com os bolsos cheios de lixo...
O Niall riu-se:
- Ai sim? E tu devias ter ouvido um grupo de pessoas que encontrei, a falar das noites fabulosas que passaram a dançar durante as férias!
Rimo-nos juntos. À noite, depois de todos se deitarem, continuámos a conversar:
- Sabes, um dos problemas da nossa sociedade é a crença de que, para sermos modernos e felizes, temos de ser pais e mães bem vestidos, com casas de capa de revista, com vida social digna dos VIP, e com uma profissão de sucesso. Quanta frustração as revistas e os programas de televisão criam nas pessoas!
- Uma das grandes maravilhas de se ser cristão é aprendermos a valorizar o que realmente importa - continuei. - No limiar da vida, seremos julgados pelo amor.
- Claro! Deus não vai perguntar: "De que tamanho era a tua casa?" Mas sim: "Quantos acolheste lá dentro?"
- Nem vai perguntar: "Realizaste-te? Tiveste sucesso? Tornaste-te famoso?" Mas antes: "Aprendeste a esquecer os teus projectos pessoais para valorizar os da tua mulher, do teu marido, dos teus filhos?"
- Deus não perguntará: "Compraste roupas bonitas e caras? Andaste sempre bem vestido? Perdeste tempo com o supérfluo, a televisão, a moda, as compras, o mundo?" Mas antes: "Ofereceste-Me o teu tempo servindo os outros?"
- Deus não perguntará: "Descansaste muito nas férias?" Mas perguntará de certeza: "Encontraste tempo para Mim nas férias?"
- Tudo aquilo que o mundo valoriza, não tem valor nenhum para Deus... Tudo aquilo que para nós parece importante - títulos académicos, lugares sociais, bens e aparências - não valem absolutamente nada na eternidade! Diz o Senhor:
"Os meus pensamentos não são os vossos pensamentos, os vossos caminhos não são os meus caminhos - oráculo do Senhor! Tanto quanto os céus estão acima da terra, assim os meus caminhos são mais altos que os vossos, e os meus pensamentos, mais altos que os vossos pensamentos." (Is 55, 6.8-9)
- Sim, mas o mais giro é que, com a prática, começamos a encontrar verdadeiro prazer nos caminhos de Deus, e deixamos de achar graça áquilo que antes valorizávamos tanto!
- Deus quer que amemos a vida de verdade e tenhamos gosto nela. Por isso, quando O procuramos a sério, Ele ajuda-nos a desejar o que nos quer dar.
- E faz-nos perder o interesse no que não serve para a nossa santificação... É por isso que os santos são sempre tão felizes!
- Lembras-te de como tu gostavas de ver telenovelas?
- Lembro. E hoje, seria incapaz de as ver! Ninguém mo proíbe, mas deixei de sentir prazer nisso. E descobri que me dá imenso prazer estar simplesmente aqui, agora, a conversar contigo; ou lá fora a empurrar a Sara no baloiço, por muito monótono que isso seja! Acho que é isto a felicidade.
- Pois é. Já reparaste que somos mais felizes quanto menos procuramos a nossa própria felicidade? Quando procuramos simplesmente o amor? Afinal, a grande mensagem da Páscoa é esta:
"Aquele que conservar a vida para si, há-de perdê-la; aquele que perder a sua vida por causa de Mim, há-de salvá-la." (Mt 10, 39)
Ficámos em silêncio um bom bocado, já deitados. No silêncio, saboreámos este dom gratuito do amor de Deus, a felicidade que Ele dá de graça a quem Lhe entrega a vida...
(... e na nossa macieira, as flores continuam a brotar...)
Noite de Sexta-feira Santa. Pelas ruas de Mogofores, acabamos de fazer a Via Sacra, acompanhando Jesus no seu longo caminho da cruz. Claro que a nós não custou nada... A Ele, custou a vida!
A Via Sacra pela noite na aldeia é das mais bonitas manifestações de fé que conheço. As ruas enchem-se de pequeninas velas, e às portas das casas, as famílias aguardam a passagem do Senhor. Cada estação é rezada à porta de uma casa previamente marcada, para que cada família possa preparar um pequeno altar digno deste momento solene. Entre cada estação, cantamos e rezamos, de vela na mão e coração atento...
Deixo-vos esta "foto reportagem" da beleza luminosa da nossa noite santa!
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