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Somos uma família católica, abençoada com seis filhos na Terra e um no Céu. Procuramos viver a fé com simplicidade e generosidade. Queremos partilhar com outras famílias a alegria de sermos Igreja Doméstica na grande família da Igreja Católica.
De três em três dias, tenho de fazer o penso pós-operatório. Numa destas "agradáveis" sessões de enfermagem, tive uma interessante conversa com a enfermeira que me atendeu. O assunto vinha a propósito:
- Amamentou todos os seus filhos? - Perguntou-me ela delicadamente. Contei-lhe a minha história:
- Amamentei os três primeiros até eles não quererem mais. Tive três filhos sem nunca comprar um biberão! Tudo mudou com a morte do Tomás. O David nasceu três meses depois, e para minha grande tristeza, não tive nem uma gotinha de colostro para lhe oferecer... Quando a Lúcia nasceu, vibrei de entusiasmo perante a perspetiva de voltar a ter um bebé ao peito. Mas não foi assim: durante vários dias, esforcei-me por amamentar, fiz tudo o que pude, aguentei estoicamente as dores mais fortes, vi o peito ficar inflamado, vi a Lúcia chorar de fome, e por fim, desisti.
- Desistiu?
- Percebi que amamentar a Lúcia se estava a tornar numa fonte de angústia e stress totalmente desnecessária. Chorava ela, chorava eu, e isto dia após dia. A única solução era tirar o leite com uma máquina para lhe dar, o que me parecia bem mais arteficial do que dar um biberão de leite em pó, e sobretudo, impossível de praticar numa casa tão atarefada como a minha. Lembrei-me de uma frase que, muitos anos antes, o pediatra me dissera: "A hora da alimentação é a mais importante na vida de um bebé. É mil vezes preferível um biberão tranquilo que uma mama angustiada." Nunca esqueci aquilo... Decidi optar pelo biberão tranquilo. Foi uma experiência belíssima para todos - para mim, para o Niall, para os nossos outros filhos e, acima de tudo, para a pequena Lúcia. Quando o António e a Sara nasceram, eu já tinha feito as pazes com a minha incapacidade de amamentar, e voltei a dar biberão.
A enfermeira respirou fundo. Depois disse-me:
- Nem imagina o bem que me faz escutar isso! Eu estava no serviço de obstetrícia quando engravidei e tive o meu bebé. Eu não só sabia tudo sobre amamentação, como ajudava as outras mulheres a amamentar. Por isso foi uma imensa vergonha para mim descobrir que não era capaz de amamentar o meu próprio filho... Sofri horrores! Quando desisti de tentar, senti-me tão, mas tão envergonhada! Parecia que falhava no mais importante, e percebi que ninguém ali me compreendia.
Ficámos em silêncio durante uns breves instantes. Depois confidenciei-lhe:
- Nunca senti qualquer diferença, em termos de proximidade com o bebé, entre o ato de amamentar os meus filhos e o ato de lhes dar o biberão, acredita? Sempre fiz ambas as coisas com total concentração, com total amor, com os bebés bem juntinho a mim e sem cair na tentação de delegar esta doce tarefa a outros. O que alimenta um bebé é, acima de tudo, o amor, e esse não é, de todo, uma questão de biologia! Tentámos, esforçámo-nos, esquecemo-nos de nós para servir o nosso bebé - não conseguimos. Aceitámos o nosso fracasso de cabeça erguida, como um ato de amor, e isso é o que importa!
De regresso a casa, deparei com a cena do costume: os dois gatinhos bebés agarrados à mãe, mamando sofregamente... Parei a contemplá-los, como de costume também. Há poucas coisas mais bonitas na natureza que a visão de uma mãe a amamentar os filhos!
Enquanto os contemplava, relembrei a nossa conversa. Pensei na mãe de Santa Teresinha, em breve canonizada, que não conseguiu amamentar vários dos seus bebés, e na forma desprendida e prática como sempre contornou a situação, sem frustrações nem lamentações.
Depois lembrei-me então que também eu, quatro filhos atrás, já estivera do lado daqueles que acham facílimo dar o peito e vergonhoso dar um biberão... Foi a minha própria experiência de fracasso, de vergonha, de pobreza, que me tornou mais humana e mais humilde, capaz de entender as experiências de fracasso, de vergonha e de pobreza dos outros.
Ter partos naturais, amamentar com facilidade, engravidar quando se quer são tudo dons gratuitos do Senhor, que Ele concede de acordo com a sua vontade. No entanto, quantas e quantas vezes nos apropriamos deles como riquezas pessoais, ou pior ainda, os associamos à nossa fé, como se fossem algo merecido pela nossa grande santidade, ou como se a sua falta fosse um castigo pelos nossos pecados... Seremos muito mais felizes fazendo as pazes, sorrindo, com as nossas limitações naturais. Ah, como é triste a vida de quem acha que Deus lhe deve alguma coisa!
"Tu queres, Jesus? Então eu também quero!" Assim rezava a jovem Chiara Luce Badano, perante a doença incapacitante que lhe roubou a juventude. E em vez do dom da saúde, recebeu de Deus o dom de uma alegria perfeita.
"Tu queres, Jesus? Então eu também quero!" Assim podemos nós rezar também perante a nossa vergonha, o nosso fracasso. E descobriremos que o Senhor tem para nós outros dons que não aqueles que tanto desejávamos - dons que nos irão surpreender, quando os quisermos aceitar...
É a experiência de fracasso e de pobreza que nos permite conhecer a verdadeira felicidade, a felicidade da Bem Aventurança que Jesus proclamou um dia, sobre a montanha:
"Bem aventurados os pobres que o são no seu íntimo, porque é deles o Reino dos Céus." (Mt 5, 3)