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Somos uma família católica, abençoada com seis filhos na Terra e um no Céu. Procuramos viver a fé com simplicidade e generosidade. Queremos partilhar com outras famílias a alegria de sermos Igreja Doméstica na grande família da Igreja Católica.
Domingo de manhã. Depois do habitual pequeno-almoço de domingo, começa a correria.
- Mãe, posso levar o vestido novo à missa?
- Mãe, as minhas calças ainda não estão lavadas?
- Clarinha, penteias-me? Faz-me uma trança!
De repente, no meio da azáfama da manhã, corro para o computador.
- Meninos, Niall, venham cá! Quase que me esquecia! Hoje é o dia da canonização dos pais de Santa Teresinha, Luís e Zélia! Como é que podemos ver em direto?
Todos querem ver. O Niall liga o canal do YouTube do Vaticano (sim, o Vaticano tem destas coisas!) e de um momento para o outro, todos estamos lá, em Roma, no meio de uma imensa multidão...
São horas de ir para a missa. Os meninos vão entrando no carro, os mais velhos já impacientes porque vamos chegar tarde ao ensaio do coro. Mas eu espero diante do computador, até ver a pequenina que vai levar as relíquias ao altar. Vai vestida de cor-de-rosa, entre a mãe e o pai. Devia estar morta, mas não está, porque o milagre que provocou a canonização foi o seu milagre... As lágrimas correm-me pela cara, e mal consigo falar. É difícil acreditar que estou a viver um momento assim... O momento da canonização do primeiro casal não-mártir da História, em conjunto!
O sínodo da família tem gerado os mais intensos debates de todos os lados. Os meios de comunicação social ocidentais - sim, porque no oriente as questões não passam sequer perto destes temas - querem saber o que vai acontecer aos recasados e aos homossexuais, e toda a sociedade aguarda com expetativa alguma forma de mudança.
Será que os leigos se deram conta da enorme mudança que teve lugar no domingo, às dez horas da manhã em Itália? Diante de uma imensa multidão e do mundo inteiro, a Igreja afirmou que o matrimónio não é um sacramento de segunda, mas uma verdadeira escola de santidade, uma escola capaz de dar ao mundo famílias de santos. De tal forma o matrimónio é reconhecido como caminho de santidade, que o dia de S. Luís e Santa Zélia Martin não é o dia da sua morte, mas o dia do seu matrimónio, 12 de julho.
Zélia e Luís viveram no século XIX, numa época muito diferente da nossa. Por exemplo, no seu tempo a missa era em latim e as pessoas só comungavam com expressa autorização do seu confessor, nunca diariamente. Mas nem por isso eles viviam longe da Eucaristia! Todos os dias, às cinco e meia da madrugada, eles participavam da missa. Ao ouvirem bater a porta da casa dos Martin, os vizinhos voltavam-se na cama: "Podemos dormir mais um bocado, são cinco da manhã!"
É natural que este tema da Eucaristia vá sendo meditado e aprofundado ao longo da História da Igreja, não a partir do ponto de vista dos "meus direitos", mas a partir de um conhecimento cada vez mais perfeito da misericórdia divina. Eu não sei que mudanças o sínodo trará neste ponto concreto para os divorciados recasados ou para qualquer outro católico, mas sei que o exemplo de Luís e de Zélia já trouxe mudanças grandes na minha vida, ao longo dos anos em que eles me têm acompanhado como leitura assídua, ensinando-me a amar, a desejar e a adorar a Eucaristia cada vez mais profundamente.
As famílias - todas as famílias - são chamadas à santidade. Espero sinceramente que o sínodo nos fale em abundância desta vocação específica da família cristã, e rezo para que, no futuro, muitos outros casais sejam propostos à veneração das famílias católicas como exemplos a imitar, segundo as Palavras de Jesus:
"Vós sois o sal da terra. Ora, se o sal se corromper, com que se há-de salgar? Não serve para nada, senão para ser lançado fora e ser pisado pelos homens. Vós sois a luz do mundo. Não se pode esconder uma cidade situada sobre um monte, nem se acende a candeia para a colocar debaixo do alqueire, mas sim em cima do candelabro, e assim alumia a todos os que estão em casa. Assim brilhe a vossa luz diante dos homens, de modo que, vendo as vossas boas obras, glorifiquem o vosso Pai, que está no Céu." (Mt 5, 13-16)
S. Luís e Santa Zélia Martin, rogai por nós! Ámen.
- Lara, a tua terra tem uma igreja muito bonita!
- Conhece, professora?
- Fui lá ontem pela primeira vez. Era quinta-feira, e disseram-me que às quintas há adoração ao Santíssimo todo o dia. Como fica aqui perto da escola, fui lá rezar.
- Ah, tem lá umas cenas assim, tem... Já tinha ouvido falar!
- E tu não costumas ir?
- Acha, professora?
- Isso não é para velhotes? - Atalha a Ana, curiosa.
- O quê - adorar Jesus? Ana, tu vais à catequese?
- Vou, estou quase a fazer o crisma. Pensei que essa cena era para velhotes!
- Eh, malta, estão a falar das cenas da igreja? Eu até já vi a professora numa missa ou coisa assim. Estava a cantar!
Sorri - Sim, costumo cantar no coro.
- Eu até ia à missa quando era miúdo, e andei na catequese, mas agora já sou homem!
- E os homens não vão à igreja, Mateus?
- Os homens não precisam de lamechices! Já viu algum homem a sério na igreja?
- Olha, o meu marido vai sempre à missa. E é um homem a sério!
- Que estranho...
Sorrio, enquanto procuro retomar a aula de Inglês nesta turma barulhenta do Curso Vocacional. É, na verdade, bastante comum ver os homens sentados nos bancos de trás da igreja, ou até lá fora à espera, enquanto as mulheres se aproximam do altar. Parece que a religião é coisa de mulheres... E segundo a percepção dos meus alunos, coisa de "velhotas"! O que há de lamechas na capacidade de dar a vida por outro? Lembro-me da passagem do Livro de Josué, em que este grande líder, bem masculino, afirma a sua fé em nome pessoal e em nome da sua família, perante os perigos do paganismo à sua volta:
"Escolhei hoje a quem quereis servir: quereis adorar os deuses cananeus? Quereis antes adorar os deuses egípcios, donde Moisés vos foi buscar? Ou quereis adorar o Senhor nosso Deus, o único Senhor, que vos tirou do Egipto e vos conduziu pelo deserto? Eu e a minha família serviremos o Senhor.” (Js 24, 15)
Uma mãe de joelhos a rezar é uma imagem poderosa numa casa; mas um pai de joelhos a rezar, no mundo de hoje, é-o muito mais. No debate da Renascença no dia 4 de outubro, do qual participei, o padre Rui Pedro Trigo Carvalho, que esteve no recente encontro mundial de famílias em Filadélfia, falou num estudo curioso apresentado ao papa: quando procuramos evangelizar a família começando pela criança, como acontece com a catequese, alcançamos 5% das famílias; quando começamos pela mãe, cerca de 20%; mas se for o pai o primeiro a converter o seu coração, o sucesso é de 90%.
Uma criança, um adolescente, um jovem que vê o pai de joelhos, em oração, jamais o esquecerá. "Ena, Deus deve ser mesmo importante, para até o meu pai, que não tem tempo para nada, se ajoelhar diante d'Ele!" Rezar em família não pode ser adiado para quando formos "velhotes". Tem de ser aqui e agora, no meio da agitação da vida moderna, quando os filhos estão em crescimento.
Todas as noites, na nossa casa, o chefe da família ajoelha-se para rezar. É ele quem começa e termina a oração "em Nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo". É ele quem traz para a oração o que acontece pelo mundo fora, depois de escutar o relato das notícias na rádio, durante os três quartos de hora de viagem até casa, ao fim do dia. E muitas vezes, é ele quem segura nos braços os mais pequeninos, enquanto passa nos dedos as contas do terço. Haverá maior conforto do que adormecer ao colo do pai, ao som das avé-marias?
Ontem, pela primeira vez na História, o Papa canonizou um casal em conjunto: os pais de Santa Teresinha do Menino Jesus. Sobre o seu pai, escreveu Teresinha: "Bastava olhar para ele, durante a oração familiar, para ver como rezam os santos."
Não, Mateus, a oração não é coisa de mulheres; não, Ana, "essas cenas" da Igreja não são coisa de "velhotes". Ontem, no Vaticano, o Papa deu um sinal magnífico ao mundo inteiro, oferecendo-nos a imagem de uma família que reza como modelo de santidade. Imitemo-los...
Estandarte no Vaticano, durante a missa de canonização
- Niall, vem cá depressa ler o mail que recebi da Bruna!
- Da Bruna do Brasil?
- Sim. Ela enviou-me um link com uma grande novidade. Vem ver! Os pais de Santa Teresinha vão ser canonizados durante o Sínodo da Família!
- Uau! que maravilha! O primeiro casal canonizado em conjunto!
- Pois é. Zélia e Luís Martin foram beatificados pelo Papa Bento XVI em outubro de 2008, e agora vão ser canonizados, também em conjunto.
- E são um casal tão perto de nós no tempo! Casaram em em 1858, em França... Foi há cerca de 150 anos atrás! Tu não tens aí um livro sobre eles?
- Tenho. Quer dizer, emprestei-o à Olívia outro dia. Chama-se História de Uma Família. Mas não me faz grande falta, porque o conheço quase de cor!
A família de Zélia e Luís tem sido uma inspiração para nós desde o início do nosso casamento e continuou a ser quando as Famílias de Caná nasceram. Vamos assim, com toda a certeza, adotá-los como nossos santos padroeiros, no dia da sua canonização!
Zélia e Luís tinham defeitos e problemas, como toda a gente. Mas acima de tudo, tinham uma fé imensa no amor do Senhor, e uma vontade enorme de serem santos. Eles sabiam que a santidade é obra de Deus nas nossas vidas, e que basta abrirmo-nos à graça, empenhando nesta tarefa toda a nossa vontade, para que Deus no-la ofereça.
Num tempo em que se escreviam muitas cartas, Zélia deixou-nos um enorme tesouro escrito sobre a vida espiritual da sua família. Na sua casa - como na casa das Famílias de Caná - rezava-se o terço e meditava-se na Palavra de Deus todos os dias. Na sua casa - como na casa das Famílias de Caná - havia um lugar de oração, encimado pela imagem de Nossa Senhora das Vitórias, a mesma imagem que um dia sorriu à futura Santa Teresinha, curando-a miraculosamente. Na sua casa - como na casa das Famílias de Caná - contavam-se histórias da Bíblia e histórias das vidas dos santos, visitava-se o Santíssimo nas diversas igrejas da cidade, servia-se o próximo com amor.
Zélia e Luís tiveram nove filhos, mas quatro morreram na primeira infância. Eles conheceram bem a dor! Com uma fé imensa, aceitaram prova após prova, sem nunca se revoltarem, plenamente convencidos do amor absoluto e infinito de Deus por eles. Depois destas quatro mortes, Zélia engravidou novamente. Tinha quarenta anos. Estaria louca? Todos a criticaram... Nove meses depois, nascia Santa Teresinha. Imagino a festa que Deus terá feito a Zélia e a Luís quando eles chegaram ao céu... Imagino Jesus a agradecer-lhes não terem recusado o dom que Santa Teresinha representou para a Igreja!
Quatro mortes, pensamos nós, seriam uma cruz suficiente para qualquer família. Mas não foi: quando Teresinha tinha quatro anos, Zélia faleceu com cancro da mama. Viúvo, Luís mudou-se com a família para Lisieux, onde viviam os cunhados, para que as filhas crescessem na companhia dos tios e das primas. Em Lisieux, as meninas conheceram o Carmelo, onde quatro das cinco irmãs se consagrariam totalmente a Deus.
Zélia e Luís tiveram uma vida difícil. Luís era relojoeiro, Zélia era costureira. E embora Zélia trabalhasse em casa, onde tinha uma pequena oficina com trabalhadoras contratadas por ela, o seu horário de trabalho era longo, prolongando-se por vezes até à meia-noite. Mesmo assim, às cinco da manhã, o casal saía de casa e dirigia-se à igreja mais próxima para participar na Eucaristia.
A sua vida familiar conta com alguns episódios bem divertidos, relatados por Teresinha na sua autobiografia e por Zélia nas suas cartas. Foram uma família alegre, que gostava de festas, de rir, de cantar, de passear no campo e de ir à pesca. As suas portas estavam abertas a todos os mendigos que passavam na rua, e os avós foram acolhidos na casa de Alençon no final das suas vidas, cuidados por Zélia e Luís até partirem para o céu. No jardim havia um baloiço onde as pequeninas brincavam. Teresinha e Celina, como os meus filhos, faziam tisanas de brincar com as ervinhas do jardim, para servir às bonecas e aos papás, e sujavam os vestidos na terra. Uma família feliz!
A santidade não é privilégio de alguns, mas vocação do ser humano. Disse Jesus:
"Sede perfeitos, como o vosso Pai que está nos Céus é perfeito."
(Mt 5, 48)
Que Luís e Zélia nos ajudem neste caminho de santidade familiar! Amen.
É mesmo isso: hoje o Céu está aberto sobre a Terra, e a graça de Deus chove a cântaros sobre nós! Na verdade, como se não bastasse estarmos ainda na Páscoa, que é, por excelência, o tempo da salvação, celebramos hoje o Domingo da Divina Misericórdia, esta belíssima festa do amor salvador de Jesus, que João Paulo II incluiu no calendário litúrgico para que se estendesse a todas as nações; e como se ainda não bastasse isso, temos hoje também a canonização de dois grandes papas, João XXIII e João Paulo II. Ena, que domingo tão grande e tão belo!
Fizémos a novena da Divina Misericórdia em família, rezando todos os dias o terço da Misericórdia, tal como Jesus pediu à irmã Faustina e como expliquei aqui. O António e a Lúcia perceberam do que se tratava. Ontem escutei esta conversa entre os dois, diante do Canto de Oração:
- Aqueles panos são o vermelho e o branco - dizia o António.
- Não são nada! São o sangue e a água - explicava a Lúcia.
- Ah, pois é, já me esquecia! O sangue de Jesus, e o vaso é o seu Coração!
- E olha que temos de rezar para essa água nos lavar!
- Sim, logo à noite rezamos.
- Podemos rezar agora! Anda, António, põe-te de joelhos que eu ajudo-te. Diz assim: "Jesus, eu amo-Te!"
João XXIII, que era um papa brincalhão, costumava dizer:
"Toda a gente pode ser papa. A prova é que eu o sou!"
Lá do céu, onde a festa é certamente bem maior que na Terra, ele sorri-nos com o seu sorriso bom e, piscando-nos o olho, diz-nos:
"Toda a gente pode ser santa. A prova é que eu o sou!"
Quero que seja esta a mensagem a passar cá em casa: estes dois papas são santos, não porque foram papas, mas porque viveram a vida como Jesus quer que a vivamos, em cada dia, em cada instante. A santidade é feita de pequenos nadas, de pequenas vitórias, de pequenas renúncias, de pequenas entregas. E a santidade é mesmo para todos! Diz o Senhor, no Levítico:
"Sede santos, como Eu, o Senhor, sou santo!" (Lev 19, 2)
Um destes dias, quando fui dar um beijo de boa noite ao David, que já se enfiara na cama, recebi esta confidência:
- Mãe, acho que vou ser santo.
- Ai sim? E porquê?
- Porque hoje me fartei de fazer coisas boas!
Aproveitemos estas canonizações para falar aos nossos filhos de santidade. A santidade está na moda! Ser santo é ser radical! Ser santo é ser profundamente feliz!
Hoje o céu está aberto sobre nós. Quero ter a certeza de que vou fechar o meu guarda-chuva, baixar as defesas e deixar que a chuva divina me inunde até à medula dos ossos. Diz o Livro do Apocalipse:
"O que tem sede que se aproxime; e o que deseja, beba gratuitamente da água da vida!" (Ap 22, 17)
E os meus desertos florirão...