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Somos uma família católica, abençoada com seis filhos na Terra e um no Céu. Procuramos viver a fé com simplicidade e generosidade. Queremos partilhar com outras famílias a alegria de sermos Igreja Doméstica na grande família da Igreja Católica.
Há 417 anos que a paróquia de Mogofores faz a sua peregrinação anual, no primeiro sábado de setembro, a Nossa Senhora da Paz, na aldeia do Beco, a trinta quilómetros. A história desta peregrinação é muito curiosa e vem contada no blogue da Lena Barros, As Surpresas de Deus, aqui.
Nas últimas semanas, todos nós, europeus, temos experimentado sentimentos de profunda tristeza perante as imagens chocantes que nos chegam dos migrantes que fogem da guerra. E temos dentro do peito uma pergunta constante: como poderemos transformar as nossas lágrimas e a nossa dor em algo de útil para quem tanto sofre? A Renascença sugeriu aqui várias coisas que talvez muitos de nós possamos fazer. Vale a pena refletir sobre elas e deixarmo-nos desafiar! Mas faltou sugerir - tratando-se de uma emissora católica - duas coisas essenciais: a oração e o sacrifício.
Que poder têm a minha oração e o meu sacrifício para combater a miséria, a guerra, a perseguição, a fome, a dor? O poder que Deus lhes quis atribuir, e que é imenso... Sim, quando unimos a nossa oração e a nossa dor à Cruz de Jesus, o que em nós é pequeno torna-se grandioso, o que é frágil torna-se poderoso, o que é nada torna-se tudo n'Aquele que é Tudo em todos. A pequenina gota de água da nossa oração e do nosso sacrifício, derramada no cálice do Sangue do Senhor, torna-se verdadeira bebida, capaz de dessedentar os nossos irmãos mais necessitados. É afinal o mistério que proclamamos na recitação do Símbolo dos Apóstolos: "Creio na comunhão dos santos". Que boa notícia! Quer dizer que a minha oração sincera e aliada a um profundo esforço de santidade pode frutificar lá longe, junto dos migrantes que atravessam o Mediterrâneo em busca de felicidade!
Bem, e o que tem a peregrinação ao Beco a ver com a triste história dos migrantes e o mistério da comunhão dos santos? Essa é a parte interessante deste post:
Este ano, pela primeira vez, a nossa família decidiu participar nesta peregrinação; e decidiu desafiar, em particular, a Aldeia de Caná de Mogofores e os jovens crismados que o Niall acompanha, para juntos fazermos uma peregrinação diferente: de bicicleta, pelos migrantes, a Nossa Senhora da Paz!
Sete da manhã. No santuário, junto à imagem de Nossa Senhora Auxiliadora em Saída, os nossos ciclistas rezaram o Shemá e a Consagração à Mãe de Caná e ofereceram a sua peregrinação pelos migrantes. Depois de uma curta meditação orientada pelo Niall, estavam prontos a partir, cheios de entusiasmo!
O caminho foi feito de risos, de partilha, de algum esforço e de alguma meditação pessoal, como combinado:
Quase a chegar ao Beco, numa descida acentuada, uma das jovens ciclistas perdeu o controlo da bicicleta durante uns breves segundos que a todos fez gelar o sangue, e com grande aparato, lançou-se em voo picado até ao chão, magoando uma mão e um joelho. Não vinha nenhum carro em sentido contrário... Mais uns metros à frente teria galgado um pequeno muro, precipitando-se numa ravina até ao rio... Bendita sejas, Mãe de Deus e nossa Mãe!
Entretanto, em casa com os quatro mais novos, eu preparei o piquenique, e por fim fizemo-nos também à estrada, mas de carro. Pelo caminho, rezámos o terço, e chegámos ao Beco precisamente ao mesmo tempo!
Ao redor da pequena igreja, foram-se reunindo os peregrinos, vindos uns a pé - entre os quais o nosso pároco -, outros de carro e autocarro, e outros, claro, de bicicleta. Depois, fizemos uma pequena procissão, rezando a Ladainha de Nossa Senhora e o Angelus:
Por fim, entrámos na igreja, para celebrar a Eucaristia, em grande festa. Que alegria! O coração de todos exultava no Senhor, que nos desinstalara, que nos fizera sair de casa e do nosso conforto, e que nos reunia no seu amor.
Como é bonita, a igreja do Beco! Tudo nela respira luz, cor e beleza. De entre todas as imagens, uma em especial tocou o meu coração:
Nossa Senhora com o Menino, sentada num burrinho e conduzida por S. José... Foi há dois mil anos atrás, quando também a Sagrada Família foi uma família migrante e refugiada, fugindo a um rei louco e sanguinário. S. Mateus fez a reportagem de então:
"José levantou-se de noite, tomou o menino e sua mãe e partiu para o Egito, permanecendo ali até à morte de Herodes. (...) Então Herodes, ao ver que tinha sido enganado pelos magos, ficou muito irado e mandou matar todos os meninos de Belém e de todo o seu território, da idade de dois anos para baixo..." (Mt 2, 10-18)
Dois mil anos passados, e a Sagrada Família continua migrante, escondida em cada mulher, em cada homem, em cada criança que procura asilo junto de nós...
Nossa Senhora da Paz, dai-nos a paz!
Há cerca de um mês, fui fazer dois ensinamentos num retiro para pais de meninos da catequese, no seminário de Santa Joana, em Aveiro. O convite veio de um casal de leitores do blogue, catequistas na paróquia de Nossa Senhora de Fátima, no Mamodeiro, uma terra perto de Aveiro. Aceitei com gosto, e regressei ainda mais feliz, ao ver o trabalho lindo de evangelização que a Jacinta e o Luís têm feito. Nesse dia, prometi-lhes que em breve entraria na sua igreja paroquial, situada à beira da estrada nacional entre Aveiro e Mogofores. Há anos que passo por ela sem nunca lá ter entrado!
Na quinta-feira passada aproveitei a tarde sem trabalho na escola e fui a Aveiro, visitar a minha avó. De regresso, no carro, vinha a pensar em qual seria a melhor citação bíblica para escrever nos postalinhos da primeira comunhão do David e do Crisma do Francisco. Tinha para cada um deles uma imagem do Cristo Jovem, e queria que a citação fosse apropriada. Ocorreu-me uma das minhas frases favoritas de S. Paulo:
"Já não sou eu que vivo, é Cristo que vive em mim." (Gl 2, 20)
E ainda outra, tão apropriada a este encontro profundo com Jesus nos sacramentos:
"Todos nós, com a face descoberta, refletimos a glória do Senhor como um espelho, e somos transformados nessa mesma imagem, cada vez mais gloriosa, por ação do mesmo Senhor, que é Espírito." (2Cor 3, 18)
Vinha eu assim a meditar, quando vi que passava junto da Igreja de Nossa Senhora de Fátima. Num impulso, e recordada da minha promessa, parei no estacionamento, decidida a rezar cinco minutos diante do Santíssimo. Ao sair do carro, tirei esta fotografia:
Qual não foi o meu desânimo ao ver que a porta estava trancada... Preparava-me para regressar ao carro, quando alguém se me dirigiu:
- Queria entrar?
- Sim, gostaria de rezar cinco breves minutos diante do Senhor - Expliquei à simpática senhora.
- Então venha, que eu sou catequista e tenho a chave! Também posso gastar cinco minutos a deixá-la rezar - Respondeu-me, enquanto abria a porta. - É a primeira vez que aqui vem? Ah, então vou mostrar-lhe a nossa igreja, que é tão bonita!
E é mesmo! Fiquei profundamente encantada. Mas mais belo que tudo, é o crucifixo sobre o altar. Nunca tinha visto nada igual! Ora reparem:
Sim, o Corpo de Jesus, suspenso na Cruz, é feito de múltiplos espelhos, e a luz nele refletida é a luz que entra a jorros pelas janelas superiores da igreja.
- Se caminhar pela coxia central, ver-se-á refletida no Cristo Crucificado - Explicava-me a catequista, enquanto na minha mente se misturavam as duas citações bíblicas em que eu refletia pelo caminho.
Diante da Cruz, na coxia central da igreja, tirei esta foto. Conseguem ver-me, refletida no Corpo do Senhor?
- Quando entramos na igreja, vamo-nos vendo refletidos no Corpo de Jesus - Continuava a catequista - Depois, durante a missa, todos nos podemos ver uns aos outros, refletidos na Cruz. Eu posso ver o meu irmão que está sentado no banco mais distante através do espelho de Jesus.
Quando a catequista me deixou só, para os meus cinco minutos - já bastante encurtados - de oração, caí de joelhos numa explosão de alegria. Meu Deus, acabava de encontrar o símbolo perfeito para a minha oração contínua: "Nós, Jesus!"
"Uma vez que há um só pão, nós, embora muitos, somos um só corpo, visto que todos participamos desse único pão." (1Cor 10, 17)
Comungar o Corpo de Cristo, na Eucaristia, e receber o Espírito da Unidade, no crisma, faz de nós participantes da vida de Jesus.
Pouco a pouco, cristificamo-nos, adquirindo os mesmos traços de Jesus, sorrindo como Ele sorria, amando como Ele amava, sofrendo como Ele sofria. A nossa vida, como o véu de Verónica ou o espelho de Paulo, torna-se reflexo do nosso Amado, que em nós vive, ama e sofre. Nós, Jesus!
Pouco a pouco, a Palavra de Deus, feita carne no Amor até ao fim da Cruz de Jesus, torna-se o espelho que nos permite contemplar a nossa própria vida. Cada um dos nossos gestos precisa de ser confrontado com a Cruz do Senhor. Nós Jesus!
E quanto mais nos unimos a Cristo, comungando o seu Corpo e recebendo o seu Espírito, mais nos unimos aos irmãos - ao marido ou à mulher, à família, à paróquia, aos amigos, ao mundo inteiro. Na Cruz de Jesus podemos encontrar todos os irmãos em Cristo, por muito distantes que vivam, no tempo ou no espaço, em qualquer periferia da vida, como gosta de dizer o nosso querido Papa Francisco. O Corpo de Jesus somos todos nós. Nós, Jesus!
Nós, Jesus: Tu e eu, eu e a minha família, a minha família e a Igreja, Tu e o mundo inteiro: a verdadeira comunhão, aquela pela qual Tu rezaste ao Pai antes de partires, só pode acontecer quando todos nos refletirmos na tua Cruz, e a tua Cruz se refletir em todos nós. Ámen. Aleluia!
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