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Somos uma família católica, abençoada com seis filhos na Terra e um no Céu. Procuramos viver a fé com simplicidade e generosidade. Queremos partilhar com outras famílias a alegria de sermos Igreja Doméstica na grande família da Igreja Católica.
- Meninos, depressa, saltem da cama! Já se ouvem os sinos! Depressa!
Os mais novos já estão a pé, mas os mais velhos, que vieram da Vigília Pascal de madrugada, ainda esfregam os olhos com sono. Isto da hora adiantar na manhã de Páscoa não está certo!
Ou estará? Afinal, a Páscoa judaica era uma refeição apressada, como nos conta o Livro do Êxodo:
"Comê-la-eis desta maneira: os rins cingidos e o cajado na mão. Comê-la-eis à pressa. É a Páscoa em honra do Senhor." (Ex 12, 11)
Uma das mensagens que me ficou do vídeo-testemunho dos cristãos perseguidos foi mesmo a pressa - a pressa com que os cristãos perseguidos se santificam, sabendo que a morte os espreita a cada esquina; a pressa com que o cristianismo precisa de ser vivido, se o quisermos viver a sério... A pressa que levou Maria a casa de Isabel, a pressa que levou as santas mulheres ao sepulcro ao romper da aurora, a pressa que fez João e Pedro correr ao despique à notícia da ressurreição. A mensagem do Evangelho não espera. Se a quisermos viver, tem de ser agora, tem de ser com intensidade, tem de ser com pressa.
Os meus filhos saltaram da cama, bocejando, vestiram-se rapidamente e correram para a porta da casa. A cruz do Senhor surgiu no horizonte e, juntos, começámos a entoar aleluias jubilosos...
Que a Páscoa do Senhor nos encontre com os rins cingidos e o cajado na mão!
Que a Páscoa do Senhor nos tire da cama dos nossos confortos e nos lance na rua, para cantarmos aleluias junto dos irmãos!
Que a Páscoa do Senhor nos faça partir em missão, jubilosos, cheios de santa pressa, como testemunhas da Vida e do Amor!
Aleluia! Aleluia!
Estes dias são dias de silêncio, do grande silêncio da contemplação da Cruz. Uma contemplação amorosa, apaixonada, cheia de gratidão.
Permitam-me contudo que partilhe convosco um vídeo-testemunho. Não quero quebrar o vosso silêncio - apenas perturbá-lo um pouco... Meditar na Cruz do Senhor é também meditar na Cruz dos nossos irmãos cristãos perseguidos no mundo inteiro, especialmente na Síria; e meditar na forma como nós, cristãos ocidentais, vivemos ou não a radicalidade do Evangelho.
Este vídeo-testemunho tem a duração de quarenta e cinco minutos. Ora eu nunca tenho quarenta e cinco minutos seguidos para fazer o que quer que seja, pelo que adiei a visionamento deste vídeo até ao serão de ontem, apesar de mo ter sido enviado pela Paula Lopes, de Barcelos, há já algum tempo. Finalmente decidi vê-lo enquanto passava a ferro, depois dos mais novos estarem a dormir. Mais ou menos a meio do vídeo, desliguei o ferro e perdi a noção do que se passava à minha volta...
Aconselho-vos vivamente a encontrar quarenta e cinco minutos, nestes dias de contemplação da Cruz. Vejam até ao fim, pois a irmã Guadalupe não vai falar apenas de quem vive lá longe - longe da vista e infelizmente longe do coração - na Síria, mas de cada um de nós, cristãos, que vivemos de uma forma paradoxal: vivemos com pacatez aquilo que só se pode viver com radicalidade. Porque o Evangelho, como bem diz a irmã, é o mesmo ontem, hoje e amanhã, o mesmo na Síria e o mesmo em Portugal; e o que os nossos irmãos vivem na Síria é uma realidade bem velhinha, profetizada e realizada por Jesus:
"Se a Mim Me perseguiram, também vos perseguirão a vós."
(Jo 15, 20)
Vejam o vídeo como quem reza, como quem contempla a Cruz do Senhor, essa Cruz que só nos salva se nos ajoelharmos diante dela e nos deixarmos salpicar pelos rios de sangue que dela correm...
Amanhã, Sexta-feira Santa, tem início a Novena da Divina Misericórdia. Façam-na connosco!
- Niall, estive a fazer uma pesquisa na net sobre a Meriam Ibrahim. O livro que me ofereceste não conta senão os detalhes que já conhecia dela, e deixou-me bastante intrigada.
- E que descobriste tu? Adivinho que encontraste a resposta que procuravas. Anda, conta lá!
- Adivinhaste bem. Descobri que a Meriam está muito desgostosa com a pressa que todos têm em escrever sobre ela. Diz que não entende como é que jornalistas e produtores de cinema querem escrever e, inclusive, fazer um filme sobre a sua história, quando ela ainda a não contou...
- Não contou?
- Não. Ela diz que 75 por cento da história ainda está escondida no seu coração, e que portanto, quem escreve a história antes dela a contar, está a escrever baseado nos 25 por cento de informação que passou nos meios de comunicação social.
- Imagino... Imagino a dor que sente!
- A traição. Perceber que falam e escrevem do que não sabem para serem os primeiros a ganhar com a história... A jornalista que escreveu o livro que tu me ofereceste soube dar a volta à questão, porque essa jornalista não narra a história de Meriam Ibrahim, mas a sua própria participação em todo o processo de libertação. Mas Meriam insiste que tem o direito a contar a sua própria história.
- Tem toda a razão!
- Ela diz que no Sudão foi condenada à morte com base em falsas informações, sem nunca ter sido ouvida; e agora, nos E.U.A., sente-se de novo como que condenada à morte, ao ver livros e filmes surgirem sobre ela - sem nunca ter sido ouvida! É quase irónico...
Ficamos um bocado em silêncio. Depois o Niall continua:
- Sabes, Teresa, tudo isto faz-me pensar na forma como as pessoas falam umas das outras. Com que facilidade julgamos os outros a partir de informação que ouvimos, que lemos por alto, que outros inventaram e espalharam...
- Sim, é um perigo enorme. Tenho para mim que os pecados de maledicência e murmuração são dos pecados mais graves que podemos cometer. E tenho sempre muito receio de cair neles!
- É fácil cair neles. Quantas vezes, no meio de uma conversa, insinuamos alguma coisa sobre alguém, por meias palavras... O nosso interlocutor, por sua vez, irá contar essa nossa impressão a outra pessoa, e talvez use palavras que não usámos... Ás vezes basta uma troca de olhares, um sorriso malicioso, um acenar com a cabeça, e pecamos gravemente.
- A Palavra de Deus é muito clara. Quantas advertências, na Bíblia, contra a maledicência e a murmuração! S. Tiago dedica um capítulo inteiro da sua carta ao assunto. Nós costumamos pensar que os primeiros cristãos eram comunidades modelo, mas a única comunidade modelo foi a casa de Jesus, Maria e José. As primeiras comunidades tinham os seus problemas, e segundo S. Tiago, a maledicência era um deles.
- Tal como as nossas comunidades paroquiais hoje em dia... Em todos os tempos! É tão fácil falar dos que se expõem um bocadinho mais, dos que têm maior visibilidade... Jesus é muito paciente, mas deve ficar muito triste.
- Escuta o que diz S. Tiago:
"Vede como um pequeno fogo pode incendiar uma grande floresta! Assim também a língua é fogo, é um mundo de iniquidade; entre os nossos membros, é ela que contamina todo o corpo e, inflamada pelo inferno, incendeia o curso da nossa existência." (Tg 3, 5-6)
- Bem, a verdade é que nós próprios já fomos vítimas destas labaredas destruidoras... Uma pessoa acende um pequeno fósforo, e quando damos conta, o incêndio já não é controlável. Era bom se a vida tivesse, como os blogues, uma aplicação para "moderação de comentários"!
- Mas não tem. Não foi assim com Jesus também? Não foi Ele condenado à morte com base em falsos testemunhos? E traído de morte por um dos seus amigos?
- De facto, o discípulo não é maior que o Mestre... Meriam Ibrahim sobreviveu à forca, sobreviverá também a esta guerra de palavras, que tanto a procuram exaltar, como humilhar, tanto inventam para o mal, como para o bem. Vou continuar a esperar que conte a sua história, ela mesma, e nos maravilhe com o seu testemunho. Todos temos a aprender com ela.
- Aguardemos então pelo seu próprio livro!
- Olha, queres ver o vídeo que eu encontrei de uma entrevista com a Meriam? Ela é lindíssima, e as suas palavras são verdadeiramente tocantes. Explica na entrevista que a parte conhecida da sua história são apenas os últimos minutos... Diz que vai dedicar o resto da vida a ajudar cristãos perseguidos, e simplesmente a cumprir a vontade de Deus. Se Ele quiser, voltará ao Sudão. O sofrimento, diz ela, fortaleceu a sua fé em Jesus. Nunca se perguntou: "Porquê eu?" Sabe que a dor é um teste, e que Deus nunca, nunca nos deixa sós. E agora a sua vida é uma verdadeira missão. Vê! Vou mostrar-te...
Vejam vocês também connosco, ou leiam a reportagem aqui! O inglês utilizado é simples e acessível. Reconhecemos uma testemunha de Cristo quando nos cruzamos com ela. Meriam é, sem qualquer dúvida, uma testemunha de Cristo, luminosa e bela...
- Teresa, trouxe-te um presente! - O Niall acabava de entrar em casa e ainda nem sequer tirara o casaco, mas o entusiasmo era enorme. Tirei-lhe a mala das mãos e abri-a, curiosa. Depois soltei um grito de alegria.
- Há um ano que espero por este livro, Niall! Eu não sabia que ele já tinha sido escrito, mas tinha a certeza de que, um dia, alguém iria escrever esta história. Tinha a certeza! E como vês, não me enganei... Há histórias que precisam de ser escritas, para não serem esquecidas, para brilharem nas trevas. E esta é uma delas! Obrigada, oh, obrigada!
Lembram-se da Meriam Ibrahim? Escrevi vários posts sobre ela aqui, aqui, aqui, aqui. A mulher de 27 anos, com um filho pequenino e grávida novamente, que o Sudão condenou à morte por ser cristã? E que nunca, por um segundo, renegou a sua fé? E que deu à luz acorrentada, sozinha na escuridão da cela? E que foi depois recebida pelo Papa Francisco?
A Bíblia apresenta-nos muitas mulheres fortes. Nos Provérbios, descreve-as assim:
"Uma mulher de valor, quem a poderá encontrar? O seu preço é muito superior ao das pérolas. O coração do marido nela confia e jamais lhe falta coisa alguma. Ela proporciona-lhe o bem e nunca o mal, em todos os dias da sua vida. Ela procura lã e linho e trabalha de boa vontade com as suas mãos. Levanta-se, ainda de noite, distribui o alimento pelos da sua casa... Cinge fortemente os seus rins, e os seus braços têm sempre força. A sua lâmpada não se apaga durante a noite." (Pr 31)
A lâmpada de Meriam também nunca se apagará. A mim, ela ilumina-me e aquece-me o coração. Escrevo este post às onze da noite, cheia de pressa, porque quero sentar-me na cama para ler o meu presente do Dia da Mulher... Que neste dia o Senhor abençoe todas as mulheres da Terra, a todas proteja, e a todas fortaleça com a sua graça como fez com Meriam! Ámen.
O Niall é o catequista responsável pelo crisma, na nossa paróquia. Antes do último encontro que tiveram, vi o Niall muito atarefado em casa com um pedaço de cartão, tesoura e fita-cola. Depois vi-o no santuário, a receber os jovens. Era esta a sua figura:
Com a ajuda do "bispo Niall" e num clima descontraído, os jovens ensaiaram os gestos da cerimónia do crisma, que está aí tão próxima. Depois conversaram sobre o Espírito Santo, capaz de incendiar o mundo inteiro, como fez no dia de Pentecostes, ao descer sobre um punhado de homens simples e rudes.
Poderão os jovens aspirar à santidade, vivendo numa sociedade com tantas solicitações contrárias? Claro que sim. Penso, por exemplo, no Beato Marcel Callo. Conhecem? É o primeiro santo escuteiro. Nasceu em 1921, em França, e morreu em 1945, no Campo de Concentração de Mauthausen...
Marcel nasceu numa família católica de nove filhos e alimentou, desde criança, a sua amizade por Jesus. Se no outro dia vos falei num casal de imperadores, hoje falo-vos de um jovenzinho operário, que aos treze anos já trabalhava numa impressão gráfica. Desejoso de testemunhar a sua fé no mundo do trabalho, ligou-se à Juventude Operária Católica (JOC) e ao Escutismo. Nessa altura, como então, não era fácil ser testemunha de Cristo, e Marcel foi ridicularizado muitas e muitas vezes. Mas nunca desistiu do seu primeiro amor, Jesus. Marcel estava decidido a levar Jesus a todos os jovens trabalhadores, e nas quaresmas ia de porta em porta, com outros Jocistas, convidando as pessoas para a missa da Páscoa.
Aos vinte anos, Marcel apaixonou-se pela jovem Marguerite Derniaux. O seu namoro foi um namoro cheio de Deus: rezavam juntos as mesmas orações e participavam juntos na missa diária. Tencionavam casar-se no mesmo dia em que um dos irmãos de Marcel seria ordenado sacerdote.
Quando a Alemanha invadiu a França em 1940, Marcel decidiu agir. Com alguns amigos, tornou-se "missionário das estações dos comboios", ajudando muita gente a fugir.
Mas em 1943, Marcel é deportado para a Alemanha, onde é forçado a trabalhar onze horas por dia, com fome, frio e desconforto de toda a espécie. Marcel encontra na fábrica o local ideal para evangelizar. Sem se deixar abater, mete mãos à obra e descobre outros jocistas e escuteiros. Depois procura entre os prisioneiros um padre para celebrar a Eucaristia e confessar - um padre alemão. Sem receio, convida outros deportados para participar na Eucaristia, conseguindo converter muitos prisioneiros.
Marcel não sabe que a sua correspondência com a noiva está a ser intercetada, e que os seus gestos católicos estão a ser alvo de suspeita. Em abril de 1944, Marcel é enviado para o Campo de Concentração de Mauthausen. Mesmo aí, no meio dos mais duros trabalhos e das mais horríveis torturas, com fome, sede e frio, Marcel mantém a fé, a esperança e o amor. Procurando imitar os cristãos dos Atos dos Apóstolos, Marcel não deixa que nada destrua a sua felicidade. Todos os dias procura novas formas de testemunhar Jesus e ajudar os companheiros. Assobiando a divisa escuta ou jocista, Marcel dá sinal para todos rezarem, silenciosamente, uma Avé-Maria. Às vezes, um amigo sacerdote também prisioneiro passa-lhe uma caixinha onde está escondida a Eucaristia: eis a sua maior alegria!
Por fim, Marcel cai doente, com tuberculose, e é transferido para uma "enfermaria", tendo direito a uma enxerga onde se amontoam aos cinco por cama. No último dia, Marcel cai nas latrinas. O coronel que o leva nos braços nunca esquecerá a expressão de felicidade pura do seu olhar moribundo. Tem vinte e três anos.
Os jovens que, no domingo, vão ser crismados na nossa paróquia, certamente nunca precisarão de testemunhar a sua fé dando a vida por Jesus. Mas certamente também que não lhes faltarão ocasiões para testemunhar a sua fé como Marcel fez: no trabalho, no namoro, com os amigos, na paróquia. O seu entusiasmo juvenil deverá ser capaz de incendiar o mundo. Como disse Jesus:
"Eu vim trazer o fogo à Terra, e que quero Eu senão que ele se ateie?"
(Lc 12, 49)
No sábado e no domingo passados, a nossa paróquia celebrou a sua fé numa grande festa, que envolveu pequenos e grandes.
As festas da catequese são, na nossa paróquia, vividas por toda a paróquia e todos os grupos de catequese em conjunto. Assim também a chamada Profissão de Fé, que nós celebramos com solenidade nestes dias.
No sábado, convidámos S. Sebastião, esse grande mártir cristão, numa procissão simbólica pelas ruas da aldeia, para vir celebrar connosco. Entre cânticos e mistérios do rosário, as crianças da catequese e os seus pais trouxeram o andor da sua capela até ao santuário:
Depois, no santuário, o grupo de crianças que se prepara para a primeira comunhão - entre os quais o David - fez-nos um belíssimo ensinamento sobre o Papa Francisco. A Carla, a catequista, escreveu o texto, depois de ler muito sobre a vida do nosso querido papa, e o João, o catequista da Lúcia, vestiu-se de branco. Os meninos da primeira comunhão fizeram então uma visita imaginária ao vaticano e estavam carregados de perguntas!
Entretanto, os grupos de catequese juvenis e de preparação para o crisma fizeram a sua reflexão numa outra capela da nossa aldeia: a capela de S. Mateus, onde se venera Santo Amaro. Também ele foi "convidado" para celebrar connosco a fé cristã! Numa caminhada pontuada com oração e cânticos, os jovens trouxeram o andor de Santo Amaro até ao santuário.
No domingo, na missa, fizemos então a nossa profissão de fé. Os andores de S. Sebastião e de Santo Amaro recordavam-nos que vale a pena viver e morrer por Jesus:
Depois, ao rezarmos o nosso credo, professando a nossa fé, todos acendemos as velas baptismais:
Que significa, no mundo de hoje, professar a nossa fé? Que significa realmente dizer "Eu sou Cristão"?
Para muitas famílias das nossas paróquias, infelizmente, ainda não significa muito. Foram muitas as ausências nesta grande festa, talvez porque estava a chover, ou porque a missa foi antecipada meia hora e é difícil levantar cedo ao domingo depois de uma semana inteira de trabalho duro; ou talvez - e esta doi mais... - porque o nosso - o meu - testemunho de crentes ainda não é suficientemente contagiante.
Que significa realmente dizer "Eu sou Cristão"?
Para muitas famílias por esse mundo fora, significa arriscar a vida, como S. Sebastião; significa arriscar ser preso e viver pobre, ver os seus filhos morrer, perder a casa e os bens. Nunca é demais lembrar os milhares de irmãos nossos perseguidos e assassinados nos dias de hoje!
E para mim? Que significado tem acender a vela do meu baptismo e professar o meu Credo?
Faço-me cada vez com mais frequência esta pergunta. Serei verdadeiramente cristã, nos meus gestos, na minha forma de viver, na educação que dou aos meus filhos? Saberei realmente renunciar a cada dia ao meu conforto, aos meus interesses, à minha vaidade e ao meu amor-próprio, para seguir Aquele que deu a vida por mim?
"Vim trazer o fogo à terra, e que ânsias até que ele se ateie!"
(Lc 12, 50)
Será a chama da minha vela suficientemente forte, para atear à minha volta este fogo luminoso de amor?...
No domingo, a nossa casa voltou a encher-se: a família Almeida, com os seus três filhotes, veio visitar-nos e passar o dia connosco; ao mesmo tempo, e por feliz coincidência, uma grande amiga precisou de nos confiar três dos seus nove filhos durante o dia. Assim, a nossa mesa à hora de almoço serviu para duas levas de almoços - uma com nove crianças, a outra - mais tarde - com os adultos e o Francisco e a Clarinha, que ficaram bastante aliviados por fazerem parte do grupo dos "grandes":
O dia, naturalmente, passou-se entre correrias, brincadeiras, gritos de alegria, pequenos amuos, e muita animação, em casa, no jardim e sobretudo em Náturia. Antes da despedida, houve tempo para uma oração de louvor cantada e dançada, e um terço muito animado:
No final, depois de todos irem embora, sentámo-nos à mesa para um jantar rápido, que o sono já era muito. Foi então que o Niall teve esta conversa caricata com a Lúcia:
- Lúcia, queria dizer-te uma coisa.
- Sim?
- Sim. Da próxima vez que estiveres com os teus amigos a brincar, há uma brincadeira que não podes fazer.
- Ai há?
- Há. Não podes estar sentada no muro a fazer caretas para os carros que passam na rua.
- ...
- Lúcia, nunca mais repetes isso, pois não?
- Não...
- Ainda bem.
Gerou-se quase um minuto de silêncio, pontuado por uma troca de olhares e sorrisos dissimulados, enquanto todos procurávamos imaginar a cena a que só o Niall assistira. Depois, a conversa retomou a alegria habitual.
À noite, vi nas notícias os milhões que desfilaram pelas ruas de Paris. Alegadamente, protestavam contra o terrorismo e a favor da liberdade de expressão. Contudo, os cartazes que carregavam deixaram-me um travo muito amargo na garganta: "Je suis Charlie". Que significa este slogan afinal? Que nos revemos no mau gosto das caricaturas, no insulto brejeiro e na sátira racista do jornal vitimado? Responder-me-ão, claro, que não importa se concordamos ou não com o jornal em causa, porque o importante é a liberdade de expressão. Liberdade de expressão? Será liberdade de expressão insultar o outro? Será que ser ocidental significa poder sentar-me sobre o muro do meu jardim e fazer caretas para quem passa na rua?
A Bíblia é bastante mais antiga que a nossa carta de direitos humanos, de que tanto nos orgulhamos. Na Bíblia, estão magistralmente compilados dez mandamentos, que visam precisamente a boa harmonia entre os homens e entre os homens e Deus. O oitavo diz assim:
"Não levantarás falso testemunho contra o próximo." (Deut 5, 20)
Desculpem-me o desabafo, mas depois de ver o triste slogan "Eu sou Charlie" percorrendo toda a comunicação social, incluindo a imprensa cristã, não pude ficar calada. Que hipocrisia! Dizem os jornalistas por esse mundo fora, e neste nosso Portugal, estarem dispostos a morrer pela liberdade de expressão. Não me lembro de ver nenhuma manifestação de milhões de pessoas nos últimos tempos, defendendo a liberdade de expressão dos cristãos nos países onde o terror é a palavra de ordem de cada manhã, e onde se é assassinado sem nunca se ter sequer aberto a boca para ofender seja quem for. O século XX teve mais mártires cristãos do que os outros dezanove séculos juntos, e o século XXI não parece ser muito diferente. Milhões a sair em sua defesa?... Asia Bibi está há cinco anos presa por ter bebido água de um poço que pertencia a muçulmanos. Mãe de cinco filhos, aguarda o enforcamento. Nem ela, nem a família aceitam renegar a fé cristã, que lhe traria a liberdade imediata. Quantas manifestações têm ocupado a nossa imprensa tão livre, as nossas praças tão orgulhosamente liberais, as nossas televisões tão isentas? Quando eu vir algum destes manifestantes parisienses a segurar um estandarte que diga "Eu sou cristão" - não por se identificar com os cristãos, mas por se identificar com a causa da liberdade de expressão dos cristãos perseguidos, claro... - então eu acreditarei na sua sinceridade.
E já agora, caros leitores, a liberdade de expressão não é o valor supremo pelo qual nos devemos bater. O valor supremo é o amor. Tudo o resto é relativo, porque tudo o resto está subordinado a este valor absoluto - até a liberdade de expressão... Já Santo Agostinho dizia: "Ama e faz o que quiseres." E o Evangelho não nos dá nenhum outro critério para o julgamento final que não o amor. Leiam Mateus 25...
Hora do conto. Leio ao David uma história sobre Santa Isabel da Hungria, no nosso livro de lendas e Contos Cristãos. Isabel cresceu num meio hostil, mas soube dar testemunho da sua fé até à morte! Quando deito o David, ele tem uma pergunta para fazer:
- Mamã, como é que Isabel aprendeu a ser santa, se não tinha a seu lado uma mãe para a ensinar?
Fico a pensar um bocadinho. O David faz-me pensar muito! Depois respondo:
- Às vezes, Deus não precisa das mães para ensinar os meninos a serem santos. Ele mesmo Se encarrega de os ensinar! Assim, quando Deus vê que um menino tem um coração muito bonito, mas não tem ninguém para o ajudar, Deus faz um pequeno milagre e ensina a esse menino tudo sobre Jesus.
- Ah, entendo... Ainda bem! Mas eu gosto que tu me ensines muitas coisas. É mais fácil assim.
E com um beijo, o David fecha os olhos para dormir.
Hoje, a Igreja do oriente pede a todos os cristãos um dia de jejum e oração pela paz no Médio Oriente. Tantos inocentes a morrer na guerra, tantos cristãos perseguidos e torturados pela sua fé em Cristo! Como Santa Isabel da Hungria, da história do David, muitos tornam-se santos nos ambientes mais hostis que podemos imaginar.
Como irmãos, filhos do mesmo Pai, como membros do mesmo Corpo, precisamos de unir as nossas orações e os nossos esforços e trabalhar pela paz, dom de Deus. Façamos então uma oração mais cuidada em família, ajudemos as crianças a renunciar a qualquer coisa de bom, e sejamos nós capazes de fazer o mesmo, segundo a nossa capacidade. É o nosso sangue também que é derramado nas ruas de Gaza e da Síria, pois somos família de sangue - no Sangue de Jesus!
Ontem, a Igreja recebeu uma boa notícia: Meriem Ibrahim, a mãe e médica sudanesa condenada à morte por ser cristã, e libertada recentemente, foi recebida no Vaticano e abençoada pelo Papa Francisco. Já está a caminho da liberdade, a caminho dos Estados Unidos, mas não quis partir sem esta bênção...Que grande mulher, Meriem! Com quem aprendeu ela a santidade? Quem lhe deu o dom da fortaleza e a coragem para lutar até ao fim? Quem a ajudou durante o parto da sua menina, no chão sujo da prisão, com os pés acorrentados, ao ponto de não conseguir abrir as pernas o suficiente e a criança ter nascido lesionada? Quem, David? O próprio Deus... Pois Jesus já nos prometera:
"Quando vos entregarem, não vos preocupeis em saber como ou o que haveis de dizer; porque naquela hora vos será inspirado o que deveis dizer. Não sereis vós que falareis, e sim o Espírito do Pai que falará por vós." (Mt 10, 19-20) E profetizando sobre o que realmente aconteceu a Meriem: "O irmão entregará à morte o irmão; o pai entregará o filho. Todos vos odiarão por causa do meu nome, mas quem perseverar até ao fim será salvo." (Mt 10, 21-22)
O Papa agradeceu a coragem de Meriem, e Meriem agradeceu as orações do Papa,de toda a Igreja e todos os homens de boa vontade. Vitória do Reino de Deus sobre os reinos da terra, vitória da oração, vitória da justiça e do amor, pelo menos desta vez! Um dia, sabemos, a vitória será completa. Até lá, acompanham-nos as palavras de Jesus:
"Ide, pois, fazei discípulos meus em todos os povos, baptizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, ensinando-os a observar tudo quanto vos mandei. Eis que Eu estou convosco, todos os dias, até ao fim do mundo." (Mt 28, 19-20)
Ámen!
(imagem retirada de NBCNews)
Refeição familiar. Depois de cantarmos o nosso obrigado ao Senhor, começamos a comer e a conversar. Geralmente falamos todos ao mesmo tempo, mas hoje eu tenho uma notícia para dar:
- Meninos, a Meriem foi finalmente libertada!
Consegui a atenção de todos:
- Aquela mãe que também é doutora e teve uma bebé na prisão?
- Sim, essa mesma.
- Que bom! E já está em casa?
- Não propriamente. Quer dizer, já saiu da prisão, mas agora tem de ficar protegida numa casa especial até poder apanhar um avião e fugir para muito, muito longe.
- E para onde quer ela ir?
- Para a América. Temos de rezar para que consiga! Sabem que durante o tempo em que esteve na prisão, Meriem foi muitas vezes visitada por líderes muçulmanos para a convencerem a mudar de religião? Bastava ela dizer que sim, e era logo libertada!
- E porque é que ela não fingia que sim?
- David, se ela fizesse isso estava a negar Jesus!
- Mas seria só faz de conta!
- Jesus não quer que tenhamos medo. Jesus quer um povo de corajosos! Ele disse:
"Não temais os que matam o corpo e não podem matar a alma (...) Todo aquele que se declarar por Mim, diante dos homens, também Me declararei por ele diante do meu Pai que está no Céu. Mas aquele que Me negar diante dos homens, também o hei-de negar diante do meu Pai que está no Céu." (Mt 10, 28.32-33)
Imagem retirada de wwwthegardian.com
Imagem retirada de euroasianews.com
Demos glória a Deus pela libertação de Meriem Ibrahim, porque hoje como ontem, Jesus continua a abrir as prisões do medo, do fundamentalismo, da tristeza, e a trazer-nos para fora! Meriem esteve acorrentada durante vários meses, grávida de fim de tempo e a cuidar de um filho de ano e meio. Acorrentada, Meriem deu à luz uma menina. A foto que temos dela, no dia a seguir ao parto, sem condições de higiene, sem epidurais, sem marido a seu lado, sem carinho, é de plena felicidade, a foto de uma mãe que acaba de ver o rosto do seu bebé pela primeira vez.
Meriem esteve sempre acorrentada, mas o seu coração esteve sempre livre. Quando lhe perguntaram o que tencionava fazer agora, Meriem respondeu: "Está tudo nas mãos de Deus." Ah, uma confiança assim dá-nos asas para voarmos em liberdade!
Numa das imagens que temos dela, depois da libertação, vemo-la rodeada das Missionárias da Caridade, as missionárias da Madre Teresa de Calcutá. Tinha de ser! Estas irmãs são fortes como o aço e estão sempre na primeira linha de socorro aos mais necessitados.
Celebramos hoje S. Pedro e S. Paulo, os dois pilares da Igreja que deram a vida por Jesus. Com eles, quero celebrar também todos os santos modernos, homens e mulheres, que não se curvam diante dos ídolos deste mundo e são capazes de testemunhar Jesus Cristo até dar a vida por Ele. Isso sim, é ser cristão! Como me envergonho das vezes em que, por preguiça, deixei de anunciar Jesus, cheguei tarde à missa, falhei à minha oração pessoal ou familiar, preferi os meus interesses legítimos em vez dos do Senhor, ou aleguei o meu direito ao descanso para não ir ajudar um irmão...
Escreveu S. Paulo:
"Ainda não resististes até ao sangue na luta contra o pecado!" (Hb 12, 4)
Dá-nos, Senhor, uma fé, um amor e uma fortaleza assim! É dessa matéria que se fazem os santos.
Oração familiar, sexta-feira à noite.
- Hoje vamos rezar pela libertação de uma mãe sudanesa, uma grande mulher que está presa, juntamente com o filho pequenino e com a bebé que nasceu na prisão!
- Na prisão? Os bebés podem nascer na prisão?
- É verdade, David, esta bebé nasceu na prisão.
- E porque está essa mãe presa? Fez coisas más?
- Não, Lúcia. Simplesmente, ela acredita em Jesus, e na sua terra, as pessoas estão proibidas de acreditar em Jesus.
- Porquê? Jesus é tão bom! Faz mal acreditar em Jesus?
Neste ponto da conversa, eu já estava arrependida de ter levantado o assunto diante dos filhos mais novos. Agora tinha de me desenrascar.
- Lúcia, há homens maus em todo o lado, que querem mandar naquilo em que os outros acreditam. Como se pudéssemos obrigar alguém a acreditar seja no que for!
- Pois é, só acreditamos se o nosso coração mandar, não é, mãe?
- É, David.
- E essa terra da prisão é muito, muito longe daqui?
- Sim, Lúcia.
- Eu nunca quero ir lá! Gosto muito de rezar. Gosto muito do Jesus! E não quero que me proíbam de rezar.
- E se nós rezarmos muito, vai acontecer como aconteceu com Paulo e o outro amigo dele? (At 16, 22-34)
- Lembras-te dessa história, David?
- Sim. Paulo e um amigo estavam dentro da prisão, e depois um tremor de terra abriu-lhes a porta!
- Então vamos lá todos rezar, rezar com muita fé para que um tremor de terra venha abrir as portas da prisão de Meriem!
A oração é verdadeiramente o tremor de terra que pode abalar os fundamentos do nosso mundo. A oração tem um poder imensurável, muito superior ao que nós imaginamos! Em Fátima, o Anjo de Portugal assegurou aos pastorinhos que a sua oração era suficiente para atrair a paz sobre a sua pátria; e em Medjugorge, Nossa Senhora disse um dia:
"Os homens esqueceram-se que com o jejum e a oração podem evitar as guerras e suspender as leis da natureza" (25/12/1982).
O Anjo e Nossa Senhora não estão a dizer-nos nada que Jesus e toda a Palavra de Deus não diga:
"Pedi e ser-vos-á dado; procurai e achareis; batei e abrir-se-vos-á; porque todo aquele que pede, recebe; quem procura, encontra, e ao que bate, abrir-se-á." (Lc 11, 9-10)
Um dos mais belos e luminosos frutos desde blogue é a oração. Neste momento, há várias famílias no país em união de coração connosco, através da Novena de Pentecostes (novena do pentecostes)que há nove dias publiquei; e há muitos leitores que, como nós, rezam insistentemente para que esta pobre mãe sudanesa e tantos outros cristãos perseguidos possam viver a sua fé em paz.
Nem todos nos encontraremos nesta vida. Mas todos nos encontraremos no Céu. E então iremos descobrir o imenso poder da nossa oração! No Céu encontraremos Meriem, e ela agradecer-nos-á as nossas orações; no Céu perceberemos como a nossa oração silenciosa e por vezes solitária atraiu a paz sobre a nossa família; no Céu veremos o brilho dos fios de luz que nos unem uns aos outros, em Deus. Rezar nunca, nunca é tempo perdido. Rezar opera sempre maravilhas, mesmo que não as vejamos deste lado da vida...
Hoje, no Vaticano, pelas 18 horas de Lisboa, os Presidentes de Israel e da Palestina encontram-se com o Papa Francisco para rezar, implorando ao Senhor o dom da paz. "Todos os homens e mulheres desta Terra e do mundo inteiro nos pedem para levarmos à presença de Deus a sua ardente aspiração pela paz", disse o Papa em Israel. Ele conhece o poder da oração.
É Pentecostes. Que "tremor de terra" virá abalar a nossa vida e abrir as nossas prisões? Unamo-nos em oração uns aos outros, ao Santo Padre e ao mundo inteiro, e supliquemos ao Espírito Santo que venha renovar a face da Terra. Ámen!