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Somos uma família católica, abençoada com seis filhos na Terra e um no Céu. Procuramos viver a fé com simplicidade e generosidade. Queremos partilhar com outras famílias a alegria de sermos Igreja Doméstica na grande família da Igreja Católica.
- Sabes, mãe, uma coisa que me acontece? Não suporto filmes violentos, e à vista de sangue quase que desmaio. Mas quando é o sangue de Jesus, parece que é diferente... Não me custa contemplar!
- Sim, Clarinha, é natural... O sangue de Jesus é a nossa salvação, não é verdade?
- Comigo também acontece assim! Quando penso no sangue de Jesus sinto-me bem, e não tenho medo.
- Claro, David... Jesus deu a vida por nós, e contemplar a sua entrega na Cruz traz-nos paz, não agitação.
- Na catequese, o João e a Isabel levaram uma coroa de espinhos. Os espinhos são os pecados.
- A coroa estava linda, Lúcia!
- Coitadinho de Jesus! Com uma coroa assim na cabeça!
- E pensar que continuamos a magoar Jesus, todos os dias, com os nossos pecados...
- Achamos que são espinhos pequenos, que não valem nada, mas ai! Os espinhos magoam tanto! Mesmo os pequenos!
- Quando nos picamos num pequeno pico ficamos logo aflitos. O que o nosso pecado faz a Jesus...
"Foi ferido por causa dos nossos pecados. O castigo que nos salva caiu sobre Ele. Pelas suas chagas fomos curados." (Is 53, 5)
- Já ouviste a canção da Danielle Rose "Crown of Thorns"?
- Tu estás sempre a cantá-la e a tocá-la na guitarra, Clarinha! Acho que já todos ouvimos cá em casa!
- A primeira vez que a escutei fartei-me de chorar...
Deixo-vos com a canção da Danielle Rose, esta maravilhosa cantora católica norte-americana:
No início do Advento, um grupo de pessoas amigas, empenhadas na sua paróquia, pediram-nos emprestado o "Sagrado Coração de Jesus" que costumamos colocar à porta de casa, por alturas do mês de junho, mês do Sagrado Coração. Queriam fazer uma representação de Natal para as crianças do seu movimento e este Coração ficava muito bonito na peça que iam construir. Emprestei com todo o carinho, claro.
Quando, dias mais tarde, mo devolveram, o Coração vinha diferente. Olhei-o com atenção:
- Tiraram as chamas?
- Chamas?
- Sim, as chamas do Sagrado Coração...
As minhas queridas amigas entreolharam-se, preocupadas. Naturalmente não se tinham apercebido que as flores amarelas representavam as chamas do Coração de Jesus, um Coração ardente de amor. Ri-me, para as descontrair, pois sabia que tinham as melhores intenções do mundo. A nossa arte não é muita, e as flores amarelas pareciam tudo menos chamas! Recuperei as flores e guardei-as num saquinho, para mais tarde reconstruir o Coração.
Mas depois reparei noutro pormenor:
- O Coração de Jesus tinha espinhos... Também tiraram os espinhos?
- Tirámos - Assentiram - Não fazia muito sentido por se tratar de uma representação do Natal. Deitámos os espinhos fora... Desculpa!
Quando cheguei a casa, entreguei o Coração de Jesus ao Francisco e à Clarinha:
- Meninos, toca a refazer o Coração! É preciso voltar a colocar as flores amarelas no sítio e procurar novos espinhos!
Eles resmungaram:
- Ora bolas! Os espinhos custam tanto a colocar! Picamo-nos todos!
Ri-me para comigo. Ainda bem que os espinhos custam a colocar! Se não custassem, não seriam espinhos... Agradeci interiormente aos meus amigos por nos permitirem meditar de novo no mistério imenso do Sagrado Coração de Jesus, por nos permitirem picarmo-nos novamente em cada um dos seus espinhos.
O Coração misericordioso de Jesus é um Coração atravessado de espinhos dolorosos. A misericórdia divina significa que a minha miséria toca o Coração de Deus, ao ponto de o despedaçar. Amor rima sempre, sempre com dor...
Mesmo no Natal? Os meus amigos, que transbordam de amor por Jesus e só Lhe querem agradar, estavam empenhados em não permitir que, pelo menos no Natal, o Coração de Jesus fosse dilacerado pelos espinhos.
Mesmo no Natal. No dia seguinte ao Natal, a Igreja celebra o martírio de S. Estêvão, apedrejado até à morte. Que horror! E dois dias depois, o martírio dos bebés de Belém, mortos por Herodes. Quanto sangue derramado nas ruas de Belém, apenas alguns dias depois do nascimento do Salvador! Ler e meditar nas leituras da missa do dia, no tempo de Natal, não é uma experiência muito... "natalícia"! Mártires, perigos de toda a espécie, a fuga para o Egito durante a noite, a perseguição...
Domingo à noite, ao regressar do grupo de oração com a Clarinha e o Francisco, encontrei o Niall sentado diante do televisor. As notícias mostravam uma criança de dois anos morta por afogamento, ainda com o corpinho dentro de água, numa praia na Grécia. Foi o primeiro náufrago de 2016. Vinha numa embarcação pequenina, fugindo à guerra em busca de um pouco de bem-estar. Que imagem chocante! Por que não nos deixam celebrar o Natal em paz?! Hoje, como há dois mil e quinze anos atrás, o Natal continua a ser tempo de contradição. Assim o predisse S. Simeão a Nossa Senhora, na Apresentação no Templo:
"Este Menino está aqui para queda e ressurgimento de muitos em Israel e para ser sinal de contradição. Uma espada trespassará a tua alma." (Lc 2, 34-35)
Escreveu o Cardeal Kasper no livro que inspirou o Papa Francisco, Misericórdia: "Esta não é a linguagem das sagas nem dos mitos: no início, o estábulo; no final, o cadafalso... Mas é precisamente por causa desta tenção e deste contraste entre o cântico celestial dos anjos e a brutal realidade histórica que todo o relato da Natividade irradia uma magia específica."
Natal é tempo de amor. Misteriosamente, este amor cresce no meio da dor, como as rosas no meio dos espinhos. O mundo está cheio de sofrimento, e a nossa vida também. Mas por uma razão que não conseguimos entender, é neste terreno regado com lágrimas que brotam as sementes da esperança. Sem sabermos como nem porquê, de Natal em Natal o Reino continua a crescer...
No fim do retiro, a Olívia tinha um presente para nós: uma dezena do rosário lindíssima, adquirida junto de uma amiga, a Isabel Figueiredo. O que me surpreendeu nesta dezena, mais ainda do que a beleza de cada conta e da forma como estão ligadas, foi o crucifixo. Ora vejam com atenção:
Sim, é uma roseira! A Olívia recordava-se do post sobre a poda das roseiras, que escrevi na quaresma passada, e da reacção dos meninos aos espinhos das rosas. E assim, pediu à sua amiga que rematasse a linda dezena com um crucifixo em forma de roseira. Domingo à noite, antes a procissão de Nossa Senhora Auxiliadora, o senhor padre abençoou esta dezena, e foi com ela entre os dedos que rezei.
Para colhermos as rosas que nesta altura do ano iluminam o nosso jardim, precisamos de não ter medo dos espinhos. Às vezes, eles ferem-nos os dedos e deixam que uma gota de sangue caia na terra. Mas que importa isso diante da beleza de cada rosa? Com um encolher de ombros, limpamos o sangue e concentramo-nos no perfume. No jardim, onde crescem ao sol, ou no Canto de Oração, onde alegram o pequeno altar de Maria, tudo nas rosas nos fala de alegria, de cor e de luz. Quem se lembra dos espinhos então?
Na sua primeira homilia papal, a 14 de março de 2013, o Papa Francisco recordou-nos:
"Quando professamos um Cristo sem cruz não somos discípulos do Senhor"
Na verdade, a cruz onde Jesus nos amou até ao fim tornou-se para nós em Árvore da Vida, e é esse o mistério pascal, que celebramos de forma mais intensa nestes dias. Temos problemas financeiros, profissionais, e até familiares? Custa-nos a rotina diária, o cuidar da família, o cuidar dos outros? Estamos doentes? O teste correu mal? O Pantufa fez um arranhão? O amigo magoou-nos? Dói a cabeça? A mãe ralhou sem razão, e o professor também? O filho fez-nos perder a paciência? Choveu durante todo o piquenique? Que alegria, podermos partilhar alguns dos espinhos que coroaram o nosso Rei! Pois se a sua coroa floriu, a nossa também florirá. Se partilharmos o seu trono (já sabem cantar aquele pequeno refrão sobre a realeza de Jesus?), com Ele reinaremos também. Disse Jesus - e neste tempo pascal já escutámos estas palavras na Eucaristia:
"Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida. Ninguém vai ao Pai a não ser por Mim." (Jo 14, 6)
Parece-me importantíssimo ensinarmos os nossos filhos - e vivê-lo nós também - este grande mistério: tudo, tudo, tudo pode ser, na nossa vida, fonte de alegria, desde que realizado com amor e por amor, em íntima união com o Amor, que por nós deu a vida numa cruz. É este o segredo da felicidade cristã, a razão profunda que faz com que os cristãos estejam sempre alegres!
No meu jardim, e no meio de muitos espinhos, as roseiras estão em flor...
É agora que se inspiram para fazer as vossas dezenas ou os vossos terços caseiros?...
Ontem, domingo, reservámos quinze minutos da nossa tarde para fazer a Via-Sacra no Santuário. Queríamos que os meninos contemplassem cada imagem, aprendendo assim a meditar na cruz de Jesus. Pensámos também que, fazendo a Via-Sacra na igreja, teríamos menos motivos para distracções. Bem, em relação a este ponto estávamos completamente errados: os nossos filhos estão tão à-vontade no Santuário de Nossa Senhora Auxiliadora, que correm por entre os bancos como se estivessem em casa. Por segundos, pensei estar prestes a assistir a um voo da Sara directo ao chão, quando a vi em pé num banco, saltitando e batendo palmas, muito feliz... e muito longe do meu alcance! Felizmente o seu anjo da guarda estava atento e manteve-a bem agarrada ao banco enquanto nos aproximámos devagar, para não a assustar...
Mas estávamos certos em relação às imagens: pela primeira vez, e mesmo no meio de muita brincadeira, os mais novos escutaram toda a história da paixão de Jesus, contemplando uma a uma as imagens da Via-Sacra. O Francisco e a Clarinha, por seu lado, faziam perguntas novas e descobriam pormenores em que nunca antes tinham pensado, relacionando a História com os Evangelhos.
Quando voltámos para casa, fomos trabalhar para o jardim. O pai cortou a relva e eu e o Francisco podámos as roseiras, com a ajuda dos mais novos.
- Cuidado com os espinhos! - Ia eu repetindo, enquanto os ramos cortados se acumulavam no carrinho de mão.
Depois lembrei-me da Via-Sacra que acabávamos de rezar:
- Jesus teve uma coroa de espinhos como estes cravada na cabeça, já pensaram nisso?
A Lùcia estacou.
- Espinhos a sério? - Perguntou, muito aflita. E acrescentou: - Se Ele era tão bom, porque é que os homens não Lhe fizeram antes uma coroa de flores, como aquela que a Clarinha fez para a festa do Colégio?
O David já sabia a resposta:
- Não vês que os homens foram maus para Jesus?
Depois, devagarinho, os meninos espetaram alguns espinhos, muito ao de leve, na ponta dos dedos.
- Ui! Deve ter doído mesmo!
- Coitadinho do Jesus!
E ali ficaram um bocadinho a meditar, enquanto eu cortava mais alguns ramos. Depois, no meio de gargalhadas, regressaram à brincadeira.
À noite, durante a oração familiar, pediram para cantar o cântico que nos fala da coroa de Jesus, e que já mostrámos num curto vídeo aqui:
Dó Lám Rém Sol
"Por coroa, espinhos, por trono uma cruz,
Mim Lám Fá Sol Dó
por jóias, três cravos: e és Rei, és Rei, bom Jesus!"
Não sei qual foi a melhor catequese - se a Via-Sacra, se as roseiras...