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Somos uma família católica, abençoada com seis filhos na Terra e um no Céu. Procuramos viver a fé com simplicidade e generosidade. Queremos partilhar com outras famílias a alegria de sermos Igreja Doméstica na grande família da Igreja Católica.
O verão está quase a terminar. Os dias longos na praia e na montanha estão a chegar ao fim... Com a ânsia de não desperdiçar a mais pequena parcela do verão, temos multiplicado as manhãs de praia e os piqueniques no Caramulo, pelo menos ao fim-de-semana. Assim, no sábado passado lá fomos nós até ao nosso lago preferido.
Mas o lago não estava com a transparência do costume:
- Mãe, olha, a água está cheia de folhas e algas!
- Vamos apanhar o lixo todo com as nossas redes antes de mergulharmos!
- Sim, vamos!
- Não se preocupem, meninos, que este lixo não é lixo humano - Apressei-me a explicar - É simplesmente o resultado da falta de chuva.
- Nós sabemos! Anda, David, vem mergulhar!
E lá fomos todos!
Enquanto os meninos brincavam na água, aproximei-me da fonte que alimenta o lago. Que diferente estava! Em vez de correr em bica, abundante, transparente e fresca, a água pingava vagarosamente no pequeno tanque, onde adormecia numa poça de musgo e algas.
As águas que deixam de correr tornam-se pouco a pouco num charco lamacento e mal cheiroso... Sem força para rebentar os diques e transbordar, as águas paradas perdem a frescura, a novidade e a beleza. Lembrei-me de Isaías:
"Assim como a chuva e a neve descem do céu, e não voltam mais para lá, senão depois de empapar a terra, de a fecundar e fazer germinar, para que dê semente ao semeador e pão para comer, o mesmo sucede à Palavra que sai da minha boca. Não voltará para mim vazia, sem ter realizado a minha vontade e sem cumprir a sua missão." (Is 55, 10-11)
A Palavra do Senhor é chuva que faz as fontes romper a terra e os rios transbordar. A Palavra do Senhor é água de torrente, capaz de romper os diques e inundar os campos. A Palavra do Senhor desimpede charcos e desinstala vidas, incapaz de se deter.
Não tenho qualquer dúvida de que as torrentes de migrantes que chegam às praias do Mediterrâneo todos os dias são, para nós Europa, Palavra do Senhor, a única capaz de nos desinstalar e de nos desafiar ao amor... Como o pequeno lago do Caramulo, também o nosso continente e os nossos corações precisam de se deixar inundar, derrubando todos os muros, para que a Água Viva nos limpe, nos liberte, nos purifique e nos salve.
Queremos escutar a voz de Deus no conforto de um sofá, mas Ele só Se faz ouvir na torrente que desinstala...
Uma das coisas que gostamos de fazer nas tardes longas de verão é apanhar amoras. Fazemo-lo por detrás da nossa casa, em Náturia (para quem ainda não sabe o que é Náturia, por favor cliquem aqui), e fazemo-lo nas caminhadas que vamos dando.
Outro dia, numa pequena aldeia da serra do Caramulo, onde fizemos um belo piquenique na companhia de amigos, fomos surpreendidos com uma abundância inusitada de amoras ladeando as ruas e preenchendo as ruinas de granito. Que maravilha! Bastava esticar o braço, para logo se poderem saborear as mais deliciosas amoras, escuras e doces.
Bem, esticar só o braço não chegava... Era preciso também afastar os espinhos que envolviam os arbustos! Por cada amora saboreada, aguentávamos várias picadas nos dedos e nas pernas...
- Abre a mão, Sara! Toma uma amora docinha!
- Cavalitas! Cavalitas!
- Sim, Sara, eu sei, às cavalitas é mais fácil!
Enquanto me saciava de amoras e as partilhava com a minha família, lembrei-me do salmo 33/34, que nos três últimos domingos temos cantado na missa:
"Saboreai e vede como o Senhor é bom!"
Caminhando pelas majestosas ruinas de uma aldeia passada, eu saboreava amoras - e saboreava a bondade do Senhor, de Quem recebo todos os bens: a vida, a família, a casa, o trabalho, os amigos, o amor, o Pão Vivo, a fé, o alimento, a saúde... Tanto a agradecer!
Mas quantas vezes deixo de receber algum bem que Deus me quer oferecer, simplesmente porque tenho medo de me picar nos arbustos que o envolvem?... Ah, o que o medo pode fazer!
Senhor, não deixes que o medo do sofrimento me impeça de saborear o teu amor! Senhor, não deixes que a dor me faça encolher os dedos e fechar a mão diante dos bens que me queres dar... Ámen.
O nosso piquenique na semana passada teve a agradável companhia de amigos. O tempo estava encoberto, a água estava fria, mas os meninos não pareciam cansar-se de mergulhar e apanhar rãs! Por fim, decidimos que eram horas de todos se vestirem e de fazermos uns passeios pela aldeia. E foi assim que os nossos seis filhos e o seu pequeno amigo tiveram a alegria de explorar uma aldeia de granito, com casas lindíssimas, ruas estreitas e íngremes, e muitas, muitas ruinas. Haverá alguma coisa mais interessante para se fazer aos cinco, aos seis, aos nove anos do que explorar casas em ruinas e imaginar aventuras fantásticas no seu interior?
Ou aos aos catorze, ou aos dezasseis anos, claro!
Espreitando por entre os pilares de um espigueiro abandonado, vislumbrei a torre da igreja paroquial, envolvida em nuvens...
Enquanto os meninos exploravam as ruinas com alegres gargalhadas, a minha imaginação fértil pôs-se a recriar esta mesma aldeia há muitos anos atrás, quando as famílias tinham dez, doze filhos, e as crianças brincavam em bando, rua acima, rua abaixo... Ao domingo, o sino da igreja congregava as famílias para a festa da eucaristia, e aos serões, rezava-se o rosário...
Talvez não fosse tudo assim tão cor-de-rosa como no meu sonho, ou talvez o meu sonho ainda esteja por realizar. Recordo-me das palavras poderosíssimas do Papa Francisco na homilia sobre as Bodas de Caná, que fez no dia 6 de julho de 2015:
"O melhor dos vinhos aguardamo-lo com esperança, ainda não veio para cada pessoa que aposta no amor. O melhor vinho ainda não chegou para aqueles que hoje vêem desmoronar-se tudo. Murmurai isto até acreditá-lo: o melhor vinho ainda não veio. Murmurai-o cada um no seu coração: o melhor vinho ainda não veio. Deus sempre Se aproxima das periferias de quantos ficaram sem vinho, daqueles que só têm desânimos para beber; Jesus sente-Se inclinado a desperdiçar o melhor dos vinhos com aqueles que, por uma razão ou outra, sentem que já se lhes romperam todas as talhas."
Afinal, o nosso Deus é um Deus acostumado a restaurar ruinas. Ao longo da História de Israel, não fez Ele outra coisa! Com grande entusiasmo, os profetas ensinam-nos a exultar de alegria, mesmo quando a nossa vida não passa de um monte de ruinas:
"Ruinas de Jerusalém, irrompei em cânticos de alegria, porque o Senhor consola o seu povo, com a libertação de Jerusalém!"
(Is 52, 9)
"As velhas ruinas serão restauradas, levantarão os antigos escombros, restaurarão as cidades destruídas e os escombros de muitas gerações!" (Is 61, 4)
E Jesus não hesita em transformar a nossa água em vinho, se Lhe oferecermos as nossas bilhas, as nossas talhas, os pequenos tanques da nossa vida...
Talhas rotas, escombros de muitas gerações, casas abandonadas, ruinas de vidas inteiras... Ah, se tivermos a coragem de tudo oferecer ao Senhor, e nos abrirmos à sua ação libertadora, irromperemos em cânticos de alegria!
Um dia, a nossa vida ressurgirá dos escombros e seremos plenamente felizes!
Um dia - e não é só um sonho lindo - as antigas aldeias ressurgirão renovadas, brilhantes como pérolas preciosas, transbordando de crianças e de vizinhos que se entreajudam. Não estarão já entre nós, como Aldeias de Caná?...
No domingo passado, fomos fazer um piquenique a um dos nossos "paraísos" preferidos: uma pequena aldeia na serra do Caramulo, onde podemos nadar, passear e contemplar a Criação sem pressas e sem ruídos, para além do cantar dos grilos, do coaxar das rãs ou do balir das ovelhas.
- Mãe, já viste aquela ovelhinha tão pequenina?
- Sim, Lúcia, olha, ela vai mamar!
Nalguns dos nossos piqueniques neste refúgio natural, o coaxar das rãs é tão intenso, que abafa o som da nossa própria conversa. Os meninos adoram procurar rãs e sapos no charco junto ao lago.
- Olha, papá, vês aquela rã?
- E a outra ali? Se olharem com atenção, verão dezenas... talvez centenas de rãs, que se confundem com o verde do charco!
Com as suas redes, apanham rãs que logo depois voltam a libertar na água fresca.
- Cuidado, António, não magoes essa rã!
- Liberta-a, David, que essa já foi apanhada duas vezes. Agora vamos para outro lado!
- Mamã, olha só que linda rã!
O Francisco, armado com a máquina fotográfica, dá alguns passeios pelos trilhos da montanha, captando imagens como esta:
Apesar de sermos oito, as únicas marcas da nossa passagem neste local de sonho são as migalhas do nosso piquenique. Ah, e provavelmente algum incómodo causado à população animal pelo nosso nível de ruído natural... Ou pelo tocar da guitarra, pois geralmente é em sítios como este que eu escrevo os meus cânticos!
No último domingo, enquanto os meninos brincavam na água e descobriam rãs, eu pensava na Laudato Si, a encíclica do nosso querido Papa Francisco. O papa relembra-nos o belíssimo texto o Génesis:
"O Senhor levou o homem e colocou-o no jardim do Eden, para o cultivar e, também, para o guardar." (Gn 2, 15)
Depois, o papa aprofunda a sua meditação:
"Cada comunidade pode tomar da bondade da terra aquilo de que necessita para a sua sobrevivência, mas tem também o dever de a proteger e garantir a continuidade da sua fertilidade para as gerações futuras." (LS 67)
Ao ver o cuidado com que os meus filhos protegem a mais pequenina rã e observam, sem lhe tocar, na mais breve borboleta, recordo os ensinamentos do Catecismo da Igreja Católica, também citados pelo Santo Padre:
"Cada criatura possui a sua bondade e perfeição próprias. As diferentes criaturas, queridas pelo seu próprio ser, refletem, cada qual a seu modo, uma centelha da sabedoria e da bondade infinitas de Deus." (CIC nº339)
Senhor, ensina-me a cuidar de cada criatura como Tu queres que eu cuide! Ensina-me a encontrar o teu amor refletido como num espelho em toda a tua Criação...
Louvado sejas!
Escrito pela Clarinha:
Houve um dia durante as férias na serra do Gerês em que eu me senti um pouco assustada, nervosa e ansiosa. Foi o que eu chamei "o momento do cavalo".
No dia anterior, ouvi os meus pais a falarem em me inscreverem a mim e ao Francisco num passeio a cavalo, com monitores, no Centro de Atividades da Montanha, que víamos todos os dias na estrada da barragem de Vilarinho das Furnas. Quando eu era mais nova, eu também montava a cavalo, mas um dia caí do cavalo, e alguns dias mais tarde desisti. Depois apaixonei-me pela ginástica e já nem me passava pela cabeça montar outra vez. Portanto, quando soube que ia voltar a montar um cavalo, senti-me assutada. O meu irmão procurava acalmar-me. Ele estaria sempre a meu lado.
Chegou a hora...
"Mãe, dói-me a barriga!"
"Como é que eu subo?"
"Será que me lembro do que tenho de fazer?"
Mas em poucos minutos, já todos os movimentos me eram familiares e relaxei.
Partimos! Que bom! Atravessámos a estrada. O cavalo da frente começou a descer por um trilho pequeno, mas inclinado. O meu coração desatou aos saltos, mas fui acalmando à medida que avançávamos em terreno de terra batida e floresta e pedras e buracos.
Valeu a pena! Chegámos à crista da montanha e tudo o que víamos à nossa volta era montanha. Ao longe víamos a aldeia onde ficámos. Era tudo tão belo! Apetecia montar umas tendas e passar ali a noite!
Por fim, regressámos ao Centro de Atividades da Montanha. Tinha passado uma hora! Não podia ser, pareciam apenas uns minutos!
Todo aquele medo inicial para quê? Ao ver o belo que me rodeava tudo desapareceu. Fiquei eu, o cavalo e Deus. Não posso esperar por uma aventura igual!
Num dia de manhã cedo, nas nossas férias na serra do Gerês, fizemos, como costume, a viagem até à barragem de Vilarinho das Furnas, rezando o terço no carro. O dia estava luminoso, tranquilo e quieto, e tudo respirava paz. Ao chegar, também nós ficámos sem palavras diante desta paisagem:
A montanha não parecia uma, mas duas, tal a nitidez e a tranquilidade do reflexo sobre a superfície das águas! Que maravilha! Até fazia pena mergulhar ali, quebrando o espelho em mil estilhaços... Bem, com pena ou sem ela, não resistimos:
Apeteceu-me ficar ali para sempre, quieta como a montanha, silenciosa como a água antes de nela mergulharmos. Depois lembrei-me do texto de S. Paulo:
"Todos nós que, com o rosto descoberto, refletimos a glória do Senhor como um espelho, somos transfigurados na sua própria imagem, de glória em glória..." (2Cor 3, 18)
O lago só reflete a montanha se se mantiver sereno e tranquilo. A minha alma só refletirá a glória do Senhor se não se deixar perturbar por coisa alguma... Serei eu capaz de tal tranquilidade, diante das tempestades que a vida vai trazendo? Estarei eu totalmente abandonada à vontade do Pai, confiante no seu amor infinito e absoluto? Escrevia Santa Teresa de Ávila:
"Nada te perturbe,
nada te espante.
Tudo passa,
Deus não muda.
A paciência tudo alcança.
Quem a Deus tem,
nada lhe falta.
Só Deus basta!"
Ah! No dia em que nos abandonarmos assim, a glória do Senhor refletir-se-á como num espelho, e seremos transfigurados, renovados, recriados no seu amor... Que felicidade! Custa assim tanto deixarmo-nos amar?...
Férias é tempo de brincadeira. Na montanha, não fizemos nós outra coisa!
Conhecem o Barco dos Piratas da Terra do Nunca?
- Eu sou o Barrica! - Apressava-se a gritar a Sara, entusiasmadíssima. E olhem que nenhum caiu lá de cima!
Numa das idas do pai ao hipermercado, a vinte minutos da nossa casa, os meninos receberam um presente magnífico: bolas de sabão! Vejam só o que acontece quando se espalham bolas de sabão no céu, na terra e na água... Quanta beleza!
Perto da nossa casa de férias encontrámos uma fantástica casinha numa árvore. Teria pertencido a alguma criança no passado? Hoje, apenas quatro crianças habitam na aldeia durante o ano inteiro...
Numa das suas expedições, os meninos descobriram que podiam brincar no socalco por cima da casa, ou seja... no telhado:
E noutro dia descobriram o galinheiro com a vista mais bela do mundo:
Numa das nossas manhãs na barragem, o Francisco utilizou o seu canivete e a sua imaginação e construiu esta deliciosa canoa em miniatura:
Por fim, junto ao rio havia todo o tipo de objetos curiosos, pertencentes a uma casinha abandonada, e que serviram para grandes brincadeiras:
Um fim de tarde, o dono do galinheiro passou por nós e ofereceu-nos um saquinho com todos os ovos do dia. Ficámos encantados, e entabulámos uma agradável conversa. Mas houve uma frase deste simpático senhor que me chocou. Dizia eu:
- Que bonito que isto é! A serra, a fonte, os animais, tudo tão bonito!
Ao que ele comentou:
- Bonito? Isto? Não há nada bonito aqui! Nada bonito aqui!
E enquanto se afastava, continuava a murmurar, abanando a cabeça:
- Não há nada bonito aqui!
Fiquei em silêncio. Claro que percebi a mensagem: o que para mim são férias e lazer, para ele é trabalho e suor. Mas onde terá ele deixado a pureza de olhar que nos permite transformar um palheiro abandonado num barco de piratas? Quando terá ele crescido assim tanto?
Senhor, dá-me um coração de criança, capaz de se alegrar com as coisas simples que me ofereces! Ensina-me a amar a minha rotina, a minha realidade, sem reclamar, e a perder tempo com uma bola de sabão a fluturar nas águas de um rio...
"Deixai vir a Mim as criancinhas, não as impeçais, porque dos que são como elas é o Reino dos Céus!" (Mt 19, 13-15)
Ámen!
- Mãe, já viste como são bonitas as flores da montanha?
- Sim, António, são maravilhosas... E já reparaste que não precisam de quase nada para viverem?
- Pois é! Elas nascem nas pedras!
- Basta-lhes um espacinho entre as rochas, um bocadinho de terra, umas gotinhas de chuva aqui e ali, e olha que bonitas ficam!
Na Laudato Si - Louvado Sejas - , a nova encíclica do Papa Francisco, o Papa escreveu (nº222):
"É importante adotar um antigo ensinamento, presente em distintas tradições religiosas e também na Bíblia. Trata-se da convicção de que «quanto menos, tanto mais». Com efeito, a acumulação constante de possibilidades para consumir distrai o coração e impede de dar o devido apreço a cada coisa e a cada momento. Pelo contrário, tornar-se serenamente presente diante de cada realidade, por mais pequena que seja, abre-nos muitas mais possibilidades de compreensão e realização pessoal. A espiritualidade cristã propõe um crescimento na sobriedade e uma capacidade de se alegrar com pouco. É um regresso à simplicidade que nos permite parar a saborear as pequenas coisas, agradecer as possibilidades que a vida oferece sem nos apegarmos ao que temos nem entristecermos por aquilo que não possuímos. Isto exige evitar a dinâmica do domínio e da mera acumulação de prazeres."
Deixem-me sublinhar esta frase: "sem nos apegarmos ao que temos nem entristecermos por aquilo que não possuímos."
A vida é tão simples, e nós complicamo-la tanto! Um pedacinho de terra, um espacinho entre duas pedras, umas gotinhas de chuva...
"Olhai os lírios do campo: não fiam nem tecem, e nem Salomão, com toda a sua magnificência, se vestiu como um deles. Se Deus veste assim a erva do campo, que hoje existe e amanhã será lançada ao fogo, como não fará muito mais por vós, homens de pouca fé? Não vos preocupeis..." (Mt 6, 28-31)
Encontrar alegria nas pequenas coisas, saborear cada detalhe que nos é concedido viver, descobrir o trigo no meio do joio, brincar à chuva e ao sol, não invejar os bens alheios, não nos apegarmos aos nossos, e sobretudo, recusar o queixume - eis o segredo da verdadeira felicidade!
Ah, e se quiserem ir mais longe e encontrar magia na montanha, escondida nas fontes e crescendo nas rochas, visitem o canal de magia do Francisco... Divirtam-se e mostrem aos vossos filhos. Há lá muito para descobrir!
A nossa semana de férias foi muito variada e interessante em termos atmosféricos. Tão depressa tomámos banhos de sol...
... como de chuva - literalmente!
A chuva nunca foi, para nós, um impedimento a mergulhar nas águas atraentes da lagoa. Um dia em que tive de contactar a proprietária da casa por telefone, ela manifestou a sua preocupação connosco, por causa da chuva miudinha que caía. Dei uma gargalhada: naquele preciso momento, todos os meus filhos estavam dentro de água!
Um dia, ao acordar, olhámos pela janela e não vimos absolutamente nada... Estava tudo branco! Não se via o jardim, nem o caminho, nem a fonte, nem sequer a montanha, que parecia ter-se dissolvido no ar.
Depois, com uma velocidade incrível, o nevoeiro derreteu-se em gotinhas minúsculas, que o sol aqueceu...
... e num instante evaporou!
- Como é possível? Ainda agora não se via nada...
- Parecia que não havia montanha!
- Mas ela sempre lá esteve!
- Quem diria! Uma montanha tão grande, e não se via nem uma pontinha!
- Ah!
O nevoeiro tem este poder de nos fazer esquecer o que ele esconde e, se apanhados em plena caminhada, de nos fazer acreditar que estamos perdidos. De facto, se não vemos a montanha, quem nos assegura de que ela lá está? E se não vemos o caminho, como podemos ter a certeza de que estamos no trilho certo? Todos os anos, várias dezenas de caminhantes se perdem nas montanhas.
Mas o nevoeiro são apenas gotículas de chuva, que num instante o sol faz evaporar. De que temos medo?
Cantou o Rei David, no seu belíssimo salmo:
"O Senhor é meu pastor: nada me falta.
Em verdes prados me faz descansar
e conduz-me às águas refrescantes.
Ainda que atravesse vales tenebrosos,
de nenhum mal terei medo
porque Tu estás comigo.
A tua vara e o teu cajado dão-me confiança."
(Sl 23/22)
Que importa o nevoeiro, a chuva, o frio, a tempestade? A montanha continua no mesmo sítio, imensa, imóvel e serena... A fonte continua a cantar, e os caminhos não desapareceram. Na nossa caminhada pelas montanhas da vida não estamos sozinhos! Temos connosco o melhor dos guias de montanha... Não percamos o nosso tempo à espera que o nevoeiro se dissipe ou que a chuva páre! Avancemos, confiantes, de mão dada com o Pastor, Aquele que conhece todos os cumes e todos os abismos, todos os trilhos e todas as fontes...
A Serra da Peneda-Gerês é um verdadeiro paraíso, mas um paraíso de difícil acesso. Senão vejamos:
Para chegarmos a casa, precisávamos de subir uma calçada estreita, onde o carro, para passar, ficava a cerca de meio milímetro da parede e outro meio do abismo... A pé era bem mais fácil!
No primeiro dia em que acordámos na casinha de férias, decidimos ir tomar banho na barragem de Vilarinho das Furnas. A barragem ficava à distância exata de um terço, de carro, num percurso de montanha digno da Heidi:
Ao chegarmos perto da barragem, vimos a água a brilhar lá em baixo, azul e tranquila, e procurámos na estrada sinais indicativos de praia fluvial. Nem um... Percorremos a estrada para cima e para baixo, para trás e para a frente, mas não conseguíamos encontrar forma de descer até àquela água tão bonita. A nossa vista da estrada era assim:
- Se calhar não é possível descer até lá abaixo...
- Claro que é! Não vim até ao Gerês para ficar a ver paisagem. Vamos encontrar um caminho!
- Sim, dois adultos sozinhos conseguem encontrar um caminho, mas... Temos crianças pequeninas e dois cães cansadíssimos!
- De facto, não se vê ninguém dentro de água...Parece um espelho! Não há barquinhos, não há traços de creme solar... Não há lixo, não há confusão... Será que não dá mesmo para descer?
A conversa prolongava-se no carro, e nem sinais de escadas, caminhos ou pontes até à água. Quase uma hora depois, encontrámos um pequeno trilho por entre as árvores... É agora! Ajudando-nos uns aos outros, conseguimos descer... E repetimos a proeza todas as manhãs!
O nosso esforço foi bem recompensado. Não vos parece? Uma "praia privada" deste tamanho...
À tarde, descíamos até ao rio, que saltava de pedra em pedra lá em baixo, no vale junto da "nossa" casa. Havia uma pequena placa a indicar "Praia Fluvial", mas nunca vimos ninguém nesta "Praia". A razão não é difícil de descobrir: para a alcançar, era preciso estar disposto a fazer uma grande caminhada, sempre a descer - e no regresso, sempre a subir!
Neste belíssimo caminho, e como em qualquer estrada que se preze, nem sequer faltava... uma rotunda :)
Também esta aventura tinha um final feliz:
A regressar da barragem ou do rio, cansados e bem dispostos, recordávamos, a rir, a passagem do Evangelho:
"Entrai pela porta estreita, porque larga é a porta e espaçoso o caminho que conduz à perdição, e muitos são os que seguem por ele. Como é estreita a porta e quão apertado é o caminho que conduz à vida, e como são poucos os que o encontram!"
(Mt 7, 13-14)
Na verdade, se estas nossas praias fluviais estivessem bem sinalizadas, com acessos fáceis e bares carregados de música e cerveja, deixariam de ser paradisíacas... E nós, que somos amantes da natureza, do silêncio e da tranquilidade, não perderíamos tempo com elas! Os parques naturais só se mantêm "naturais" assim. Se queremos o paraíso, temos de estar dispostos a trilhar o caminho que poucos encontram, estreito, pedregoso, difícil, cansativo e pouco popular... Ah, mas vale bem a pena!
- Mãe, já pensaste numa coisa?
- Em quê, Clarinha?
- Se isto é tão bonito, como será o Céu?
- ...