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Somos uma família católica, abençoada com seis filhos na Terra e um no Céu. Procuramos viver a fé com simplicidade e generosidade. Queremos partilhar com outras famílias a alegria de sermos Igreja Doméstica na grande família da Igreja Católica.
Ontem, sentada na cama antes de dormir, como costume, li alguns pontos da exortação pastoral A Alegria do Amor. E enquanto lia, o pensamento divagou e recordei-me de duas grandes lições de solidariedade das nossas famílias de origem que marcaram, uma a minha juventude, outra a juventude do Niall.
Era inverno em Castelo Branco, terra de muito frio. Sete e pouco da manhã. À porta, a minha mãe esperava um rapazito, que apareceu de boné enfiado e cabeça baixa. Na cozinha, nós as três, jovenzinhas, aguardavamos impacientes a visita, enquanto contemplávamos a mesa abundante que a minha mãe preparara: croissants, cereais, leite com chocolate, sumo de fruta. Ele chegou, sentou-se meio envergonhado, e comeu, comeu, comeu, um prato após o outro, como quem não comia há muito tempo... O ritual manteve-se até ao final do ano letivo. Quem era o rapazinho? Era um aluno da minha mãe, que faltava muito às aulas porque - descobriram as funcionárias - tinha fome a sério e, logo que a cantina abria para o almoço, não suportava nem mais uma aula. Numa altura em que a ajuda social escolar ainda não era um dado adquirido, a minha mãe decidiu resolver o assunto com as suas próprias mãos: de acordo com a mãe do menino, combinou que, de futuro, ele iria sair do autocarro na paragem anterior à escola, onde ficava a nossa casa, para o seu pequeno-almoço. E o menino deixou de ter fome - e de faltar às aulas. No ano seguinte, a minha mãe saiu Castelo Branco e deixou de poder dar o pequeno-almoço ao Hugo. Encontrou-o muitos anos depois, numa paragem de autocarro, quando ele, reconhecendo a sua antiga professora, foi ao seu encontro... Tinha crescido, era mecânico.
Irlanda, inverno também, mas certamente ainda mais frio. Lá fora levantara-se uma terrível tempestade. Era quase de noite, mas o pai do Niall ainda tinha que fazer na rua:
- Niall, Niall, veste o impermeável que temos de ir ao acampamento cigano - Disse-lhe ele.
Assim fizeram. O Niall recorda ainda hoje o pavor que sentiu dos cães do acampamento, que ladraram insistentemente à sua chegada. Mas nada deteve o seu pai, diretor da escola primária daquela zona da cidade, frequentada por muitas crianças ciganas. O chefe do acampamento recebeu o diretor com respeito.
- É perigoso ficarem aqui esta noite - Disse o pai do Niall, decidido - Venham, tragam as caravanas e os cavalos e podem ficar no recinto da escola, que tem algumas coberturas para vos proteger. Vou abrir-vos as portas da escola para usarem os chuveiros e a cozinha.
E foi assim que o acampamento cigano, com crianças e cavalos, foi transferido para o abrigo da escola primária, numa das noites mais terríveis do inverno irlandês.
Passaram os anos. O testemunho de solidariedade das nossas famílias, de que estes dois episódios são um pequeníssimo exemplo, continua a ecoar nos nossos corações e nas nossas vidas, e a impulsionar-nos a fazer o mesmo, aqui e agora. Tanto eu como o Niall, no seguimento do que vimos fazer em nossas casas, encaramos a vida profissional como missão, como testemunho cristão. Será que o conseguimos? As palavras de Jesus são claras:
"Tudo o que fizestes ao mais pequenino dos meus irmãos, a Mim o fizestes." (Mt 25, 40)
E que ponto da exortação pastoral foi este que me fez recuar tanto no tempo e contemplar demoradamente o testemunho recebido? Foi o ponto em que o Santo Padre relembra as famílias de que não se pode ser católico "separado" do mundo, fechado na sua casa sem relação com a sociedade circundante. Aqui fica então:
"Convém lembrar-nos também de que a adoção e a procriação não são as únicas maneiras de viver a fecundidade do amor. Mesmo a família com muitos filhos é chamada a deixar a sua marca na sociedade onde está inserida, desenvolvendo outras formas de fecundidade que são uma espécie de extensão do amor que a sustenta. As famílias cristãs não esqueçam que « a fé não nos tira do mundo, mas insere-nos mais profundamente nele. (...) A cada um de nós cabe um papel especial na preparação da vinda do Reino de Deus ». A família não deve imaginar-se como um recinto fechado, procurando proteger-se da sociedade. Não fica à espera, mas sai de si mesma à procura de solidariedade. Assim transforma-se num lugar de integração da pessoa com a sociedade e num ponto de união entre o público e o privado. Os cônjuges precisam de adquirir consciência clara e convicta dos seus deveres sociais." (181)
Assim seja!
Sexta-feira, oito de abril. O Niall está em viagem de trabalho há já dois dias, e hoje deverá fazer escala na Irlanda, para visitar os pais e os irmãos durante um fim-de-semana prolongado. Mas mesmo longe, nós precisamos de conversar. Aliás, conversas à distância não são nada de estranho para nós... Sentada ao computador, depois de deitar os mais novos, vou trocando mails com o meu marido.
- Já passaste os olhos pela exortação pastoral A Alegria do Amor? - Pergunto.
- Não. Já saiu?
- Hoje. Olha, vou enviar-ta em anexo. Descarreguei em Inglês e em Português do site do vaticano. Aqui vai!
Afasto-me do computador para fazer as minhas últimas tarefas do dia, e meia hora depois estou de volta - ao computador e ao diálogo com o Niall, que entretanto já adiantou a sua leitura.
- Leste o capítulo quatro? - Pergunta-me ele. - É fantástico! Um verdadeiro hino ao amor!
- Sim, li um bocadinho.
- Tão terno! Parece um avô carinhoso, e ao mesmo tempo, o mais exigente dos mestres...
- Preciso de ter o livro nas mãos. Quero poder lê-lo e relê-lo em todo o lugar, sublinhá-lo, marcá-lo...
- Assim que chegar a Portugal vou comprar-to em Aveiro, na livraria católica. Vamos vê-lo em conjunto.
- O capítulo quatro merece ser lido à hora de jantar, à volta da mesa, um número de cada vez.
- Vai dar muita conversa!
- Sim, vai certamente.
O Papa alerta, logo na introdução, para a dificuldade que terão na leitura aqueles que tiverem pressa, por isso decido ler devagar, número a número. O texto é tão atraente, que me deito tardíssimo, sem conseguir interromper a leitura... Do outro lado do computador, num hotel no aeroporto de Dublin, o Niall também fica a ler pela noite dentro. Despedimo-nos por entre parágrafos e citações.
O Niall passou três magníficos dias com a sua família de origem, na Irlanda. Os pais não cabiam em si de felizes, e todos os irmãos se reuniram para festejar este reencontro numa celebração tipicamente irlandesa, cheia de histórias e gargalhadas.
Segunda-feira à noite, sentados à volta da mesa da cozinha, iniciando a nossa refeição, aguardávamos ansiosos o regresso do Niall. Por fim, a porta abriu-se e ele entrou de rompante, causando a confusão de beijos, abraços, sopa entornada, presentes e fotografias dos primos, tios e avós guardadas no telemóvel. Perante tanta alegria, lembrei-me do início da Exortação Pastoral do Santo Padre:
"Agora entremos numa dessas casas, guiados pelo Salmista, através dum canto que ainda hoje se proclama nas liturgias nupciais quer judaica quer cristã:
« Felizes os que obedecem ao Senhor
e andam nos seus caminhos.
Comerás do fruto do teu próprio trabalho:
assim serás feliz e viverás contente.
A tua esposa será como videira fecunda
na intimidade do teu lar;
os teus filhos serão como rebentos de oliveira
ao redor da tua mesa.
Assim vai ser abençoado o homem que obedece ao Senhor.»
(Sl 127/128)
Cruzemos então o limiar desta casa serena, com a sua família sentada ao redor da mesa em dia de festa. No centro, encontramos o casal formado pelo pai e a mãe com toda a sua história de amor." (nºs 8 e 9)
- É tão bom regressar a casa! - Dizia-me o Niall, à noite, já deitados nos braços um do outro. - Não importa o quão belas são as nossas viagens, não há nada mais belo que regressar.
Ficámos uns momentos em silêncio, depois ele continuou:
- Deve ser tão triste não se ser amado no seio da sua família! Marido e mulher que discutem com violência, palavras ofensivas, filhos que tratam os pais com desprezo, pais sem tempo para os filhos... Deve ser muito triste...
- Nós não nos damos conta do tesouro que guardamos em nossa casa - Respondi-lhe.
- Não há nada mais central para o ser humano que a família. De que adianta ter um emprego fantástico, um salário de luxo, uma mansão, férias e carros e tudo o que possamos imaginar, se não experimentarmos esta alegria e este amor ao fim do dia?
Suspirei, profundamente reconfortada nos braços do meu marido, e fiz mentalmente uma breve prece por todos os que não experimentam esta alegria. A Alegria do Amor... Sim, falar de família é acima de tudo falar da alegria do amor...
A todos os leitores do blogue, desejamos umas felizes 24 horas para o Senhor! Que durante o dia de hoje e de amanhã, os nossos pensamentos, os nossos sentimentos, o nosso tempo, a nossa vida sejam para o Senhor! Diante de Jesus-Eucaristia, Jesus entregue por nós, Jesus feito Pão, feito Sangue, feito Vida, a nossa oração seja fecunda!
Certamente todos vós tendes intenções fortes no coração pelas quais rezar. A essas, peço que acrescenteis uma oração especial pelas Famílias de Caná, que estão a crescer com a bênção de Deus e do nosso bispo de Aveiro, D. António Moiteiro. Peço especial oração pelo retiro de Lordelo, Guimarães, já no próximo domingo! As inscrições têm chegado em abundância e continuam a chegar, ao ponto de termos tido de reforçar a equipa que vai trabalhar com as crianças. Vai ser um dia muito belo... Rezemos por esta intenção!
Até segunda, se Deus quiser!
Na cozinha, a Clarinha aproveita a tarde livre para fazer queques de chocolate...
... que ao jantar serviu num... prato também de chocolate, e também feito por ela! Vejam lá quem é artista?
Os queques e o prato desapareceram num instante...
Parabéns, Tomás!
- Quem gosta dos bolinhos em honra do Tomás?
- Eu!
- Eu!
- Eu!
Depois da refeição, a oração familiar. A vela do Tomás ilumina o Canto de Oração, e todos lhe querem pegar...
A festa na Terra terminou, mas no céu nunca terminará! No terceiro domingo do Advento, Domingo da Alegria, o Papa Francisco lembrou-nos que, aos cristãos, não é consentida a tristeza, pois já fomos salvos por Jesus, como anunciou o profeta Sofonias:
"Não desfaleçam as tuas mãos, Jerusalém: o Senhor teu Deus está no meio de ti, como poderoso salvador. Por causa de ti, Ele alegra-se, renova-te com o seu amor, exulta de alegria como nos dias de festa." (Sof 3, 14-18)
Um dia não haverá mais choro, nem mais tristeza, nem mais dor, nem mais morte. Um dia... Mas esse dia já começou, há dois mil e quinze anos atrás! E o nosso menino do Natal aponta-nos para um outro Menino, de um Natal que nunca terá fim. Afinal foi esse mesmo Menino que nos inspirou a dar ao Tomás o segundo nome de Emanuel, que quer dizer Deus-Connosco... Nem nós imaginávamos o quanto!...
Alegremo-nos e façamos festa, porque o Senhor está connosco! Ámen.
Quando chegámos à igreja paroquial da Quinta do Conde, para o Retiro Famílias de Caná, reparámos de imediato nas grande bilhas que estavam colocadas à porta, ornamentando o pequeno e cuidado jardim. “Bilhas!” Pensei. “Bom começo para um retiro sobre As Seis Bilhas das Famílias de Caná…”
Ao entrar na igreja, apercebi-me de que estava cheia, transbordante de crianças, com os seus risos, a sua alegria, a sua inquietude.
Ainda na véspera do retiro, o Niall e eu tínhamos estado a contar as crianças e os jovens inscritos, e tínhamos sido assaltados por uma espécie de pânico: 64! 64 crianças e jovens para acolher, para evangelizar, para ajudar a fazer encontro com o Senhor enquanto os pais me escutariam, descansados. Como iria ser possível? A equipa que ia trabalhar connosco era grande e estava entusiasmadíssima. A troca de e-mails, nos dias anteriores ao retiro, tinha sido uma verdadeira loucura, e todos pareciam andar a trabalhar a mil à hora… Mas 64 é um número muito elevado, mesmo para uma grande equipa!
Durante a Eucaristia, as crianças foram convidadas a sentar-se à frente, sobre uns tapetes dispostos no chão em sua honra. Os nossos filhos, claro, estavam felicíssimos, e tivemos de lhes lembrar continuamente que a conversa era para pôr em dia lá fora, depois da missa. Eu sorria: que abençoados eles são! De retiro para retiro, ganham novos amigos e vão cimentando as amizades antigas.
Chegou a hora do Pai-Nosso. O celebrante, visivelmente satisfeito com a afluência de crianças, convidou-as a subir os degraus do altar para rezarem juntos a oração dos filhos de Deus. Algumas responderam ao convite, e o altar encheu-se de crianças. A Sara bem tentava espreitar por detrás do altar, mas a sua baixa estatura não lhe permitiu grande visão! De mãos dadas, transbordantes de alegria, elas rezaram: “Pai Nosso, que estais nos céus…”
Mas foi durante a comunhão, quando Jesus Salvador entrou no meu coração, que me deixei tomar totalmente pelas suas Palavras:
“Deixai vir a Mim as criancinhas, não as impeçais,
porque é delas o Reino dos Céus!”
(Lc 18, 16)
De repente, apeteceu-me rir e chorar ao mesmo tempo, emocionada perante a quantidade de crianças que se aproximaram do altar para receber Jesus, ou simplesmente serem abençoadas, em seu nome, pelo sacerdote. “Deixai vir a Mim as criancinhas…” E de um momento para o outro, fui libertada daquela sensação de pânico. 64 crianças? Podiam ser muitas mais! Se é Jesus quem as chama; se é Jesus quem nos dá esta ordem clara de não as impedir de caminhar ao seu encontro, por que hei de ter medo?
Recordei-me das bilhas de barro à porta da igreja apontando para o essencial: cada criança é uma pequena bilha que o Senhor nos confia, para que nela derramemos a sua Água Viva até transbordar! Quantas bilhas confiou o Senhor a cada um de nós?
Na nossa casa, são seis. No retiro foram 64… O Senhor tem-nos vindo a revelar, pouco a pouco, a sua vontade para este movimento nascente que são as Famílias de Caná. Uma das suas surpresas tem sido o espantoso número de crianças que levamos a Jesus em cada retiro e em cada encontro, e a abertura magnífica ao dom da vida – também através da adoção e do acolhimento de crianças - que as Famílias de Caná vão experimentando nas suas casas, à medida que crescem em proximidade com o Senhor. Uma igreja ou uma casa a transbordar de crianças é um dos mais belos sinais de esperança no nosso mundo!
O dia foi pleno, profundo e belo. Conversando no carro, a caminho de casa, o Niall e eu sentimo-nos felizes por não termos colocado entraves à obra do Senhor, limitando o número de crianças. Deus gosta de multiplicações!
Mais tarde vim a saber que naquele mesmo domingo, no encerramento do VIII Encontro Mundial das Famílias em Filadélfia, no qual estiveram presentes mais de um milhão de fiéis, o Papa Francisco dizia: "A ação de Deus no nosso mundo ultrapassa a burocracia, o oficial e os círculos restritos. Deus quer que todos os seus filhos tomem parte na festa do Evangelho.”
Que as Famílias de Caná sejam a ilustração viva das palavras inspiradas do nosso Pastor! Ámen.
Domingo. Missa às dez da manhã, no Santuário de Nossa Senhora Auxiliadora. Chegamos à igreja pelas nove e meia, para o ensaio do coro. Como costume, o David entra na sacristia com um salto, para se preparar para acolitar.
Alguns minutos antes da missa, reparo que o David entra na igreja, já vestido com a alva, e acende, um a um, os castiçais. Depois, sempre muito compenetrado, faz mais uma ou duas coisas por detrás do altar, e regressa à sacristia. Finalmente, o sino da torre toca as dez horas, e o cântico de entrada irrompe, triunfante, no santuário, enquanto o sacerdote e os acólitos sobem as escadas e se dispõem em redor do altar.
É então que me apercebo de alguma movimentação fora dos esquemas previstos. O que está o David a fazer? Porque insiste ele em trocar de lugar com outro acólito? Não o imaginava tão assertivo...
Durante as leituras, reparo que o David está confortavelmente sentado na sua cadeira, com o seu missal dominical na mão. O missal é um pequeno caderno infantil da Paulus Editora, que o David recebe mensalmente pelo correio. Dentro de cada caderno, encontram-se as leituras de cada domingo do mês, bem como jogos, histórias e desenhos para colorir relacionados. É a primeira vez que o David segue as leituras pelo missal, desde que se tornou acólito. Como terá ele levado o caderno consigo, assim vestido?
No final da missa, não resisto a perguntar:
- David, o que é que se passou hoje? Porque trocaste de lugar com a Lurdes? Não estavas bem no teu lugar?
- Ah, não é por isso, mamã!
- Então o que se passou? Fizeste um bocadinho de rebuliço por detrás do altar...
- Sabes, antes da missa eu pensei num esquema para conseguir ler o meu missal: escondi-o debaixo da almofada da cadeira onde costumo ficar sentado. Mas quando entrámos na igreja, percebi que a Lurdes se ia sentar no meu lugar! Tive de trocar com ela, porque senão ficava sem missal.
Sorri.
- Realmente, depois de tanto trabalho para pensares nesse esquema, seria uma pena...
- Pois seria! Assim pude ter o meu missal durante a missa. Quando não precisava dele escondia-o debaixo da almofada, e pronto!
No dia 23 de agosto, na sua homilia, o Papa Francisco lançou alguns desafios:
"Quem é Jesus para mim? É um nome? Uma ideia? É apenas uma figura histórica? Ou é realmente aquela pessoa que me ama, que deu sua vida por mim e caminha comigo? Para ti quem é Jesus? Procuras conhecê-lo na sua palavra? Lês o Evangelho todos os dias, uma passagem do Evangelho para conhecer Jesus? Trazes um pequeno Evangelho em seu bolso, bolsa, para lê-lo em qualquer lugar? Porque quanto mais nós estamos com Ele mais cresce o desejo de permanecer com Ele”.
Quem é Jesus para mim? Será Ele suficientemente importante, para que eu medite na sua Palavra todos os dias? Será que o meu amor por Jesus é suficientemente grande para justificar a compra de um pequeno missal, de um Evangelho de bolso, de uma Bíblia? Ou, nas versões modernas, para me dar ao trabalho de descarregar aplicações com a Palavra de Deus no meu telemóvel?
O David está muito feliz com os seus cadernos mensais. A assinatura destes cadernos foi o presente de aniversário dos seus padrinhos, faz agora quase um ano. Há por aí padrinhos e madrinhas a precisar de sugestões para prendas com estilo? :)
No domingo passado, fomos fazer um piquenique a um dos nossos "paraísos" preferidos: uma pequena aldeia na serra do Caramulo, onde podemos nadar, passear e contemplar a Criação sem pressas e sem ruídos, para além do cantar dos grilos, do coaxar das rãs ou do balir das ovelhas.
- Mãe, já viste aquela ovelhinha tão pequenina?
- Sim, Lúcia, olha, ela vai mamar!
Nalguns dos nossos piqueniques neste refúgio natural, o coaxar das rãs é tão intenso, que abafa o som da nossa própria conversa. Os meninos adoram procurar rãs e sapos no charco junto ao lago.
- Olha, papá, vês aquela rã?
- E a outra ali? Se olharem com atenção, verão dezenas... talvez centenas de rãs, que se confundem com o verde do charco!
Com as suas redes, apanham rãs que logo depois voltam a libertar na água fresca.
- Cuidado, António, não magoes essa rã!
- Liberta-a, David, que essa já foi apanhada duas vezes. Agora vamos para outro lado!
- Mamã, olha só que linda rã!
O Francisco, armado com a máquina fotográfica, dá alguns passeios pelos trilhos da montanha, captando imagens como esta:
Apesar de sermos oito, as únicas marcas da nossa passagem neste local de sonho são as migalhas do nosso piquenique. Ah, e provavelmente algum incómodo causado à população animal pelo nosso nível de ruído natural... Ou pelo tocar da guitarra, pois geralmente é em sítios como este que eu escrevo os meus cânticos!
No último domingo, enquanto os meninos brincavam na água e descobriam rãs, eu pensava na Laudato Si, a encíclica do nosso querido Papa Francisco. O papa relembra-nos o belíssimo texto o Génesis:
"O Senhor levou o homem e colocou-o no jardim do Eden, para o cultivar e, também, para o guardar." (Gn 2, 15)
Depois, o papa aprofunda a sua meditação:
"Cada comunidade pode tomar da bondade da terra aquilo de que necessita para a sua sobrevivência, mas tem também o dever de a proteger e garantir a continuidade da sua fertilidade para as gerações futuras." (LS 67)
Ao ver o cuidado com que os meus filhos protegem a mais pequenina rã e observam, sem lhe tocar, na mais breve borboleta, recordo os ensinamentos do Catecismo da Igreja Católica, também citados pelo Santo Padre:
"Cada criatura possui a sua bondade e perfeição próprias. As diferentes criaturas, queridas pelo seu próprio ser, refletem, cada qual a seu modo, uma centelha da sabedoria e da bondade infinitas de Deus." (CIC nº339)
Senhor, ensina-me a cuidar de cada criatura como Tu queres que eu cuide! Ensina-me a encontrar o teu amor refletido como num espelho em toda a tua Criação...
Louvado sejas!
- Mãe, já viste como são bonitas as flores da montanha?
- Sim, António, são maravilhosas... E já reparaste que não precisam de quase nada para viverem?
- Pois é! Elas nascem nas pedras!
- Basta-lhes um espacinho entre as rochas, um bocadinho de terra, umas gotinhas de chuva aqui e ali, e olha que bonitas ficam!
Na Laudato Si - Louvado Sejas - , a nova encíclica do Papa Francisco, o Papa escreveu (nº222):
"É importante adotar um antigo ensinamento, presente em distintas tradições religiosas e também na Bíblia. Trata-se da convicção de que «quanto menos, tanto mais». Com efeito, a acumulação constante de possibilidades para consumir distrai o coração e impede de dar o devido apreço a cada coisa e a cada momento. Pelo contrário, tornar-se serenamente presente diante de cada realidade, por mais pequena que seja, abre-nos muitas mais possibilidades de compreensão e realização pessoal. A espiritualidade cristã propõe um crescimento na sobriedade e uma capacidade de se alegrar com pouco. É um regresso à simplicidade que nos permite parar a saborear as pequenas coisas, agradecer as possibilidades que a vida oferece sem nos apegarmos ao que temos nem entristecermos por aquilo que não possuímos. Isto exige evitar a dinâmica do domínio e da mera acumulação de prazeres."
Deixem-me sublinhar esta frase: "sem nos apegarmos ao que temos nem entristecermos por aquilo que não possuímos."
A vida é tão simples, e nós complicamo-la tanto! Um pedacinho de terra, um espacinho entre duas pedras, umas gotinhas de chuva...
"Olhai os lírios do campo: não fiam nem tecem, e nem Salomão, com toda a sua magnificência, se vestiu como um deles. Se Deus veste assim a erva do campo, que hoje existe e amanhã será lançada ao fogo, como não fará muito mais por vós, homens de pouca fé? Não vos preocupeis..." (Mt 6, 28-31)
Encontrar alegria nas pequenas coisas, saborear cada detalhe que nos é concedido viver, descobrir o trigo no meio do joio, brincar à chuva e ao sol, não invejar os bens alheios, não nos apegarmos aos nossos, e sobretudo, recusar o queixume - eis o segredo da verdadeira felicidade!
Ah, e se quiserem ir mais longe e encontrar magia na montanha, escondida nas fontes e crescendo nas rochas, visitem o canal de magia do Francisco... Divirtam-se e mostrem aos vossos filhos. Há lá muito para descobrir!
Num dos cruzamentos da estrada nacional, que todos os dias percorro, esteve durante toda a semana passada esta bela tenda branca:
Há quatro décadas que os peregrinos de Fátima encontram aqui uma sombra fresca, água abundante e os primeiros socorros necessários, especialmente todo o cuidado dos pés e das pernas. Os bombeiros de Anadia e outras pessoas de boa vontade disponibilizam-se todos os anos para este trabalho tão bonito e necessário de serviço aos peregrinos, e a tenda branca levanta-se na estrada como símbolo concreto e real do amor cristão. Na verdade, ao ver os peregrinos descalços, com os pés dentro de bacias de água, e os voluntários ajoelhados a seu lado, tratando as bolhas dos seus pés, não pude senão lembrar-me das palavras de Jesus:
"Se Eu, o Senhor e o Mestre, vos lavei os pés, também vós deveis lavar os pés uns aos outros."
(Jo 13, 14)
Pensei também na parábola do Bom Samaritano:
"Mas um samaritano, que ia de viagem, chegou ao pé dele e, vendo-o, encheu-se de compaixão. Aproximou-se, ligou-lhe as feridas, deitando nelas azeite e vinho, colocou-o sobre a sua própria montada, levou-o para uma estalagem e cuidou dele." (Lc 10, 33-34)
Foram estas imagens do verdadeiro amor cristão que inspiraram naturalmente o Papa Francisco e oferecer-nos uma imagem da Igreja - uma imagem nova, mas antiga, tão antiga quanto o Evangelho:
«Vejo com clareza que aquilo de que a Igreja mais precisa hoje é a capacidade de curar as feridas e de aquecer o coração dos fiéis, a proximidade. Vejo a Igreja como um hospital de campanha depois de uma batalha. É inútil perguntar a um ferido grave se tem o colesterol ou o açúcar altos. Devem curar-se as suas feridas. Depois podemos falar de tudo o resto. Curar as feridas, curar as feridas... E é necessário começar de baixo».(Entrevista à Revista Brotéria, Setembro 2013)
“Essa é a missão da Igreja, que cura e cuida. Algumas vezes, eu falei da Igreja como um hospital de campanha. É verdade: quantas feridas há, quantas feridas! Quanta gente que tem necessidade de que suas feridas sejam curadas! Essa é a missão da Igreja: curar as feridas do coração, abrir portas, libertar e dizer que Deus é bom, que perdoa tudo, que é Pai, é terno e nos espera sempre”. (Homilia de 5-2-15)
A tenda branca à beira da estrada, os peregrinos a caminho de Fátima...
A Igreja à beira da estrada da vida, e cada um de nós, peregrino a caminho da verdadeira Pátria...
Não tenhamos receio de nos aproximar da Igreja, de descalçar os sapatos e de deixar que nos cuidem das feridas. Não hesitemos em estender a mão para receber o alimento, beber da Água da Vida, recuperar as nossas forças! Os sacramentos que Jesus nos deixou são os remédios mais eficazes para quem peregrina pelas estradas da vida.
Depois, assim curados e alimentados, sejamos também nós capazes de nos ajoelhar diante do irmão e de lhe lavar os pés...
O Domingo do Bom Pastor foi, na nossa família, um domingo muito especial: o dia do Crisma do Francisco, o primogénito!
O dia amanheceu tranquilo. O Francisco estava sereno, como é seu costume. Quando se vestiu a rigor, todo soltámos uma exclamação de espanto. Afinal, não é seu hábito preocupar-se com o vestuário, e raramente o vemos assim:
Mas este domingo era mesmo um dia muito especial, e o cuidado exterior devia simplesmente refletir toda a beleza interior do seu coração, purificado pelo sacramento da confissão e preparado ao longo de anos de catequese e oração: o Francisco ia ser ungido testemunha de Jesus pelo seu bispo, D. António Moiteiro. Que honra, o sacramento do crisma! Que voto de confiança da parte de Deus, ao ungir-nos suas testemunhas!
Eram dezanove os jovens preparados pelo Niall para este grande dia. Entraram no santuário em procissão solene, e tal como os meninos da primeira comunhão no domingo anterior, também eles se mantiveram ao longo da coxia central, ao lado das respetivas famílias.
- Estais dispostos a ser testemunhas de Cristo? - Perguntou o senhor bispo, depois de todos os jovens, um a um, responderem "presente!" à chamada.
- Sim, estamos.
- E nós estaremos cá para ver! - Foi a resposta do senhor bispo, arrancando uma bela gargalhada à assembleia.
Os jovens fizeram o ofertório, as leituras e a oração dos fiéis. Na sua alegria, não esqueceram os migrantes que atravessam o Mediterrâneo todos os dias, os cristãos perseguidos, os sacerdotes desanimados, os jovens do mundo inteiro.
Ao lado do senhor bispo, o David acolitava. Estava muito feliz, porque era a segunda vez que acolitava ao lado do seu Pastor, e porque ia fazer a sua segunda comunhão. Antes de começar a missa, o David teve este diálogo caricato com a São, também acólita:
- Sabes, São, estou muito contente porque agora já não tenho fome na missa.
- Ai não? E porquê?
- Porque já vou comer a hóstia!
A São escondeu um sorriso:
- Pobre David, passavas assim tanta fome?
- Pois...
Num momento de grande beleza, os jovens crismandos foram junto do círio pascal acender a sua vela batismal. O sacramento do crisma é precisamente isto: tomar na sua própria mão a Luz recebida em bebé. No dia longínquo do seu batismo, a fé foi-lhes dada de presente, de uma forma totalmente gratuita, sem lhes dar tempo para dela tomar consciência, para a pedir, ou sequer desejar - tal como o dom da vida, que ninguém pede ou deseja, mas simplesmente acolhe. O batismo é o parto que nos lança na grande família da Igreja de Cristo.
Mas o crisma é diferente: o crisma é o assumir deste dom, o reafirmar do batismo, agora em plena consciência e adultez.
A vela do Francisco está minúscula, pois costumamos acendê-la em casa, durante a oração familiar, duas a três vezes por ano - e dezasseis anos representam muita cera!
Por fim, chegou o tão aguardado momento. Enquanto invocávamos o Espírito, cantávamos sem cessar: "Vem, Espírito de verdade! Vem, Espírito de Santidade! Vem, Espírito de Caridade! Vem, nós Te esperamos!"
Um a um, com os padrinhos a seu lado, os jovens aproximaram-se do senhor bispo, que ungiu a sua testa com óleo, marcando-os com o selo do Espírito. Depois, ao ouvido de cada um e com um carinho verdadeiramente paternal, desafiou-os à santidade.
- Segue o exemplo de S. Francisco de Assis - Sussurrou o senhor bispo ao Francisco. - E deixa-te inspirar pelo nosso Papa Francisco!
Antes da Eucaristia terminar, os jovens crismados leram uma simpática e comovente mensagem de agradecimento ao Niall, seu catequista desde que chegámos a Mogofores, tinham eles nove ou dez anos. O Niall contemplava o seu grupo com serena alegria, enquanto na sua mente já surgiam planos para os conduzir ainda mais além como grupo de jovens...
Estávamos todos felizes, com os olhos a brilhar. Os nossos "meninos" eram agora adultos na fé.
Um último presente: um crucifixo e uma pagela com uma oração, que o Niall escolhera com cuidado para lhes oferecer:
Na sua homilia, o senhor bispo desafiou os jovens a colocar os seus pés nas pegadas de Jesus, seguindo o seu caminho sem se desviar. Enquanto o Niall entregava a cada crismado a cruz e a pagela, cantámos o cântico que escrevi há alguns anos e que as Famílias de Caná e a nossa paróquia tanto gostam de cantar, pedindo a Jesus que nos ajude a nunca retirar os nossos pés das suas pegadas.
(Se quiserem cantar connosco, vão à tag "cânticos", e encontrarão um vídeo caseiro com este nosso cântico).
"Põe teus pés nas minhas pegadas e acerta o teu passo comigo
Elas estão de sangue manchadas, mas meu passo é alegre e decidido!
Nós, Jesus, Tu e eu! Juntos na Cruz, juntos no céu! (2x)
Põe teus pés nas minhas pegadas, não te canses de evangelizar
Elas estão de sangue manchadas, mas por elas a Vida vais encontrar!"
E agora, é hora de ser testemunha de Jesus, como os Apóstolos depois do Pentecostes:
"Eles, partindo, foram pregar por toda a parte; e o Senhor cooperava com eles, confirmando a Palavra com os sinais que a acompanhavam." (Mc 16, 20)
Que assim seja. Ámen! Aleluia!