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Somos uma família católica, abençoada com seis filhos na Terra e um no Céu. Procuramos viver a fé com simplicidade e generosidade. Queremos partilhar com outras famílias a alegria de sermos Igreja Doméstica na grande família da Igreja Católica.
Durante as férias da Páscoa, fomos ao parque da Curia, como já é habitual. O Francisco, a Clarinha e o David fizeram de bicicleta os dois quilómetros que nos separam da Curia, e eu segui no carro com os três mais novos.
O parque estava lindo, cheio de luz e de sombras, de caminhos enlameados onde se refletiam os raios de sol, que teimavam em espreitar pelas altas copas das árvores.
- Vamos explorar, mãe! Até já! - Disseram quase todos ao mesmo tempo, deixando-me com a Sara pela mão. Mas a Sara também quis explorar, claro, e obrigou-me a correr pelos carreiros atrás dos meus filhos.
- Mãe, vem cá ver! Encontrámos uma coisa maravilhosa!
- Maravilhosa! A melhor brincadeira do mundo!
- Nem imaginas! Dá para fazer coisas fantásticas!
- Já subimos e descemos e já andámos de baloiço ali e tudo!
Fiquei cheia de curiosidade. O que seria? Cheguei a uma clareira, e vi... Bem, vejam vocês comigo:
Julgo que terá sido uma das recentes tempestades a lançar por terra estas árvores grandiosas e belas, que fazem do parque da Curia um lugar tão especial...
Árvores caídas. Árvores arrancadas pela raiz. Árvores que já não se elevam para os céus, mas se misturam com a lama e a terra. Árvores que em vez de raizes, enterram as folhas e as flores. Para nós, adultos, a visão de uma árvore tombada é desoladora.
Mas os meus filhos não vêem as coisas assim...
Para eles, as árvores tombadas transformaram-se em baloiços, labirintos, paredes de escalada, lugar de brincadeira. Foi ali mesmo, ao lado daquelas pobres árvores, que lanchámos e que passámos a maior parte da tarde.
De regresso a casa, dei comigo a sorrir sozinha. É tão giro ver as crianças a tirar proveito de tudo! A árvore já não nos dá oxigénio? Sempre nos pode servir de baloiço. A árvore já não abriga os passarinhos? Mas agora abriga as centopeias... Razão tem o Senhor ao dizer que precisamos de um coração de criança para sermos verdadeiramente felizes!
Fiquei a pensar na quantidade de coisas e acontecimentos da vida que podemos, como as crianças, explorar de forma diferente daquela com que foram planeados ou desejados: o emprego que tenho não me dá a riqueza que eu merecia? Talvez me torne rico em humildade... O namoro não correu bem? Quantas lições me ensinou! Os filhos não aprendem com facilidade? Vão certamente aumentar a minha paciência. Os professores não explicam como deveriam? Se explicassem, nunca me teriam feito procurar as respostas por mim mesmo. Sofri uma injustiça? Que ótima oportunidade para unir o meu coração ao de Jesus! Não encontro ninguém com quem casar, ou não consigo engravidar? Talvez esta "árvore caída" me ofereça uma oportunidade novinha em folha de responder a uma vocação diferente e especialíssima do Senhor! A reunião de trabalho parece interminável? Espero que me poupe pelo menos meia hora de purgatório :)
Através de Isaías, o Senhor assegura-nos que é no deserto que brotam os seus rios divinos, e da terra queimada que surgem os seus lagos:
"As águas jorrarão do deserto e a terra queimada mudar-se-á em lago, as fontes brotarão da terra seca." (Is 35, 6-7)
Cada vez que recordo as gargalhadas no nosso piquenique na Curia, vem-me ao pensamento uma oração... Rezem-na comigo: "Jesus, dá-me um coração de criança, para que eu saiba sempre brincar em cima de qualquer árvore caída na minha vida! Ámen."
Os três mais novos tinham trabalho de casa do infantário: construir, em família, uma pomba da paz, e conversar sobre o que é isso da paz. O desafio estava lançado para mais uma evangelização familiar!
Pedi ao Francisco, o nosso "mestre do origami", que procurasse na net uma pomba da paz em origami e a construísse connosco. Os mais pequenos adoram os origamis do irmão, que faz nascer cavalos, borboletas, sapos e macacos de um pedaço de papel branco. A pomba da paz ficou linda!
Sentei-me junto da lareira com eles, enquanto os mais velhos, por perto, iam fazendo as suas coisas e mantendo um ouvido atento à nossa conversa.
- O que é isso de estar em paz?
- Eu sei! É ficar sozinho!
- Pois é, a mamã diz que quer ficar em paz e nós vamos para os quartos fazer barulho!
Dei uma gargalhada.
- Isso sou eu que digo palavras tolas. Estar em paz não é estar sozinho, pois para haver paz é preciso haver outras pessoas. Por exemplo, o que é "fazer as pazes"?
- É fazer a paz!
- Isso mesmo: a paz nasce do perdão. Quando desculpamos o outro, quando somos bons até para quem é mau, isso é a paz. Sabem o que diz a Bíblia sobre a paz?
Eles quiseram ouvir. Abri o Livro do Profeta Isaías e li:
"Então o lobo habitará com o cordeiro, e o leopardo deitar-se-á ao lado do cabrito;
o novilho e o leão comerão juntos, e um menino os conduzirá.
A vaca pastará com o urso, e as suas crias repousarão juntas;
o leão comerá palha como o boi.
A criancinha brincará na toca da víbora e o menino desmamado meterá a mão na toca da serpente." (Is 11, 6-9)
Quando acabei de ler, eles estavam fascinados e pediram para repetir. Depois ficaram a conversar sobre ursos, leões e víboras, enquanto eu fui cuidar da Sara, que acordara da sesta.
Chegou a hora da nossa oração familiar. Na sua vez de partilhar a oração, o David rezou assim:
- Jesus, quando for o Dia Mundial da Paz vou pegar numa víbora com as mãos e vou ser o maior!
E sem esperar que ele acabasse, a Lúcia acrescentou:
- Jesus, e eu vou fazer festinhas a um ursinho branquinho do Pólo Norte!
- Esse era para mim! - Gritou o António.
O Niall abanou a cabeça, a rir:
- Que é que tu lhes estiveste a ensinar sobre a paz?
E o Francisco, num tom brincalhão: - Isso é interpretação literal da Bíblia!
Procurar o sentido profundo da Palavra de Deus é sinal de maturidade espiritual. Mas interpretar a Bíblia à letra é privilégio das crianças. Para elas, a Bíblia é um livro de histórias fantástico, cheio de príncipes e princesas, reis e raínhas, guerreiros, cavaleiros e gigantes, jardins zoológicos dentro de navios e tsunamis que transformam o mar em muralhas. Uma história da Bíblia antes de dormir é um bilhete para sonhos felizes.
Bem, interpretar a Bíblia à letra na nossa casa faz bastante sentido, se pensarmos em cenas como esta, repetidas a cada novo bebé e a cada novo gato, num breve instante de distracção:
Graças a Deus e à sua paz, nenhum dos nossos filhos alguma vez sofreu o mais pequeno arranhão!
Mas o sentido profundo da Palavra é mais exigente. Nas alturas em que todos gritam e ralham, a começar por mim, os mais velhos se insultam, os mais novos se batem, e até a bochecha do David aparece mordida pela Sara, pergunto-me por onde andará a paz!
Depois escuto, muito baixinho, as palavras de Jesus, repetidas a cada geração, a cada família, a cada um de nós... As palavras que ordenaram ao vento que se calasse e ao mar que acalmasse; as palavras que perdoaram ao paralítico e à mulher adúltera; as palavras que ressuscitaram Lázaro e fizeram Zaqueu descer da árvore. E sei...
... que o nome da paz é Jesus! N'Ele estão todos os "dias mundiais da paz" a que se referia o David. N'Ele estão também todas as "pazes" da nossa família, que depois de cada discussão se refaz uma e outra vez...