Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]
Somos uma família católica, abençoada com seis filhos na Terra e um no Céu. Procuramos viver a fé com simplicidade e generosidade. Queremos partilhar com outras famílias a alegria de sermos Igreja Doméstica na grande família da Igreja Católica.
Na cozinha, a Clarinha aproveita a tarde livre para fazer queques de chocolate...
... que ao jantar serviu num... prato também de chocolate, e também feito por ela! Vejam lá quem é artista?
Os queques e o prato desapareceram num instante...
Parabéns, Tomás!
- Quem gosta dos bolinhos em honra do Tomás?
- Eu!
- Eu!
- Eu!
Depois da refeição, a oração familiar. A vela do Tomás ilumina o Canto de Oração, e todos lhe querem pegar...
A festa na Terra terminou, mas no céu nunca terminará! No terceiro domingo do Advento, Domingo da Alegria, o Papa Francisco lembrou-nos que, aos cristãos, não é consentida a tristeza, pois já fomos salvos por Jesus, como anunciou o profeta Sofonias:
"Não desfaleçam as tuas mãos, Jerusalém: o Senhor teu Deus está no meio de ti, como poderoso salvador. Por causa de ti, Ele alegra-se, renova-te com o seu amor, exulta de alegria como nos dias de festa." (Sof 3, 14-18)
Um dia não haverá mais choro, nem mais tristeza, nem mais dor, nem mais morte. Um dia... Mas esse dia já começou, há dois mil e quinze anos atrás! E o nosso menino do Natal aponta-nos para um outro Menino, de um Natal que nunca terá fim. Afinal foi esse mesmo Menino que nos inspirou a dar ao Tomás o segundo nome de Emanuel, que quer dizer Deus-Connosco... Nem nós imaginávamos o quanto!...
Alegremo-nos e façamos festa, porque o Senhor está connosco! Ámen.
Terias hoje onze anos. Como será fazer anos no céu? Haverá uma festa especial? O teu anjo da guarda saltará de alegria à tua volta? Jesus tomar-te-á nos braços com carinho a duplicar? Será que o bolo de anos de Maria é melhor que o meu?... São perguntas assim que os teus irmãos me fazem neste dia, quando acendemos a tua vela e te cantamos os parabéns, à mesa do jantar.
E no entanto, nada do que possamos responder se assemelha sequer à festa que tu vives... S. Paulo, que teve visões e êxtases sem fim, e que subiu, segundo contou, ao sétimo céu, reconhecia contudo que o céu verdadeiro, aquele que só conhece quem já não vive na Terra, esse céu é infinitamente melhor que a nossa mais bela imaginação. Escreveu ele:
"Nem olho viu, nem ouvido ouviu, as maravilhas que Deus tem preparadas para aqueles que ama..." (1Cor 2, 9)
Eu sei que, se pudesses escolher, não quererias regressar a esta Terra de sombras. Eu sei que, aí onde estás, a tua capacidade de amar se aprofunda a cada instante de eternidade que passa, e hoje me amas mais do que qualquer um dos teus irmãos. Eu sei, com a sabedoria que só a fé pode dar, que és feliz, plenamente feliz, e que a tua alegria é completa. Há muito que deixei de me demorar em pensamentos estéreis, desejando uma realidade diferente da que é nossa... Hoje, quando vejo no colégio os meninos que deveriam ser os teus colegas de turma - sim, eu sei bem quem eles são, porque nunca os perdi de vista... - já não me deixo tomar pela nostalgia do que podia ter sido, mas não é. Tudo isso, querido filho, passou, porque Deus me concedeu a graça de querer apenas o que Ele quer. Deus, Tomás, só Deus nos basta...
Obrigada, meu Deus, porque criaste o Tomás!
A grande festa de Todos os Santos é para nós também a grande festa do Tomás. Na verdade, o Tomás é santo e festeja no céu a alegria dos Filhos de Deus. Que grande honra para nós, termos um filho que já alcançou a felicidade eterna! Tão pequenino, e já na posse do Reino... É um mistério que nos enche de espanto.
O túmulo do Tomás não está em Mogofores, mas na Gafanha da Encarnação, onde nós vivíamos na altura. De vez em quando, o Niall visita-o à hora de almoço, pois a Gafanha fica entre Aveiro e a praia, e a brisa suave por entre os pinheiros é um ótimo antídoto para o stress diário do Niall no seu local de trabalho. Mas eu raramente tenho oportunidade de ir ao cemitério.
Num dia do verão passado, a caminho da praia, visitei com os meninos o túmulo do Tomás. Não havia ninguém, cheirava a maresia e nós estávamos muito felizes. Esta fotografia foi tirada então:
Nestes dias santos não sinto necessidade de visitar o túmulo do Tomás. A festa de Todos os Santos faz-me mergulhar de tal forma na felicidade do Céu, na alegria dos santos, na festa dançante do Reino, que me custa olhar para a pedra fria e imaginar o caixãozinho branco que vi descer numa grande cova, naquele dia longínquo de 2006. Geralmente, é a minha mãe que visita o túmulo nesta altura para o adornar de flores frescas e para colocar nele uma velinha.
Este ano, como já tem acontecido nos últimos anos, a minha mãe chegou ao túmulo e viu-o perfeitamente limpo e arranjado, com flores lindíssimas. Telefonou-me e imediato. Quem será que, ano após ano, toma a seu cargo esta doce e nobre tarefa, sem ninguém lhe pedir? Antigos vizinhos? Velhos amigos? Não sabemos. Mas já hoje pedi ao Senhor a sua bênção sobre esta pessoa generosa, que no silêncio nos dá tão doce alegria. Ela vive a bem-aventurança do Evangelho:
"Quando deres esmola, não saiba a tua mão direita o que fez a esquerda, a fim de que a tua esmola permaneça em segredo; e o teu Pai, que vê o que está escondido, não te deixará sem recompensa." (Mt 6, 3-4)
Quanto a mim, festejei a vida e a santidade do meu filho da forma habitual: durante a Eucaristia, quando o sacerdote iniciou a grande oração eucarística, eu soube com toda a certeza que o Tomás estava ali, diante do altar, com o seu olhar azul e o seu sorriso límpido, louvando e adorando comigo Jesus-Eucaristia. E quando o senhor padre rezou: "com todos os anjos e santos, cantamos a uma só voz..." eu cantei a uma só voz com ele. É o maravilhoso mistério da comunhão dos santos, que faz de todos nós, vivos e defuntos, uma única família. Nós pensamos que o céu fica lá longe, e ele está tão próximo... Não foi Jesus quem o disse?
"O Reino de Deus está próximo!" (Mc 1, 15)
Scott-Hahn, autor americano que vivamente recomendo, interpreta assim esta frase, no seu magnífico livro The Lamb's Supper: "Sim, o Reino de Deus está próximo: tão próximo quanto a igreja paroquial mais perto de ti." E continua: "Nós vamos ao céu - não só quando morremos, mas sempre que vamos à missa."
Tomás, que todos os domingos te juntas a nós diante do altar, reza pela tua família! Ámen.
Faz hoje nove anos que tu partiste para o céu, meu pequeno Tomás. Nesse dia, eu só conseguia pensar na alegria imensa que devias estar a experimentar, liberto do teu corpinho doente como uma borboleta a voar para longe do seu casulo opressor... E a certeza de que estavas bem melhor suavizou a minha dor.
No dia seguinte, na missa, fizemos-te uma festa. Não queríamos, de forma alguma, que a celebração da tua vida eterna fosse uma cerimónia triste. O teu pai e eu escolhemos, com cuidado, os teus cânticos preferidos, e tocámo-los na viola, cantando com quanta força tínhamos. Lembras-te? Cantámos cânticos pequeninos como tu, e que nos falavam do amor com que o Senhor cuida de nós:
"Eis-me aqui, sou criança que procura a mão!
Eis-me aqui, pequenino, nos teus braços!
Dá-me hoje teu amor, teu perdão, Senhor!
Guarda-me pequenino, para Ti!"
Às vezes, mães que perdem os seus filhos ou que os vêem muito doentes perguntam-me se é possível voltar a ser feliz. É, Tomás, não é verdade? Eu pensei que não, e durante algum tempo convenci-me que não, mas é. O tempo cura tudo? Não, o tempo não cura nada: o que cura é o amor. A tua morte escavou em mim um abismo imenso, e eu deixei que o amor o preenchesse. A felicidade que agora experimento é diferente da que conhecia antes da tua partida, porque é mais profunda, como mais profundo é o abismo da minha vida. Agora, Tomás, não sou feliz porque tenho saúde, porque tenho filhos, porque tenho trabalho, porque tenho sucesso ou por qualquer outra razão... Deixei de ter medo de perder tudo isso, sabes? Que libertação, quando perdemos o medo! Agora, Tomás, sou feliz porque amo e sou amada, infinitamente amada por Deus. Como tu!
Afinal, o que é o Céu senão este tsunami de amor que, de repente, invade o imenso abismo que somos?...
"Se subir aos céus, Tu lá estás;
se descer ao abismo, ali Te encontras também.
Se voar nas asas da aurora
ou for morar nos confins do mar,
mesmo aí a tua mão há-de guiar-me
e a tua direita sustentar-me-á.
Se disser: «Talvez as trevas me possam esconder,
ou a luz se transforme em noite à minha volta»,
nem as trevas me ocultariam de Ti
e a noite seria, para Ti, brilhante como o dia..."
(Sl 139/138)
Tomás, reza por nós!
No céu, onde tu habitas, e cá em casa, há hoje uma grande festa: faz dez anos que nasceste! Nesse dia, pensei que eras meu. Eras tão lindo! Tinhas uns olhos azuis grandes e quase nunca choravas. Mamavas bem, dormias sem chupeta, eras o bebé perfeito...
Um ano e meio depois, compreendi a verdade: afinal, tu não eras meu. Tu pertences a Deus, Tomás, como eu também pertenço. Foste-me confiado por Deus por pouco tempo, para me ensinares muitas coisas, e para me ajudares a crescer.
A tua passagem pela Terra foi curta, mas aos olhos de Deus, foi completa. E sabes porquê? Porque na tua simplicidade de criança, tu não fizeste senão a vontade de Deus. E o tempo é-nos oferecido para isso mesmo! Diz o salmista:
"Mil anos a teus olhos são como o dia de ontem, que já passou,
e como uma vigília da noite." (Sl 90)
Cada vez que o meu pensamento se demora em ti, sou de novo obrigada a devolver-te ao Senhor e a renunciar à alegria humana de te ver crescer, como vejo os teus irmãos. E é por isso que também te quero agradecer: tu desafias-me a viver na verdade, tomando consciência de que nada do que tenho é meu. Tu desafias-me a perder o medo, especialmente o medo do sofrimento e o medo da morte, pois agora eu sei que "dor" rima com "amor", e que a morte não passa de uma leve cortina oscilando ao vento entre duas realidades.
Que liberdade interior, quando vivemos sem medo de sofrer! Que felicidade, quando percebemos que esta vida é a madrugada da eternidade! Também eu, Tomás, caminho em direcção a Casa, essa Casa onde um dia nos encontraremos em Deus, e então seremos tão felizes!
Reza por esta família que tens aqui na Terra. Pede ao Senhor que, como tu, também cada um de nós seja santo. Parabéns pelo que és, Tomás Emanuel!
- Mamã, quem está nesta foto aqui na parede?
- Sou eu, António. É a mamã, quando a mamã era pequenina.
- Tu já foste pequenina?
- Já, claro!
Silêncio...
- E quem tomava conta de nós quando tu eras pequenina?
- ???????????
As crianças não conseguem imaginar que houve um tempo em que elas não existiam. E ainda conseguem menos imaginar que haverá um tempo em que deixarão de existir... A verdade é que elas têm razão: existimos desde sempre no pensamento de Deus, como diz S. Paulo:
"Ele nos escolheu, em Cristo, antes da fundação do mundo, para sermos santos..." (Ef 1, 4)
E existimos para sempre, não na Terra, mas no Coração do próprio Deus:
"Nem olho viu, nem ouvido ouviu, nem o coração do homem pressentiu, isso que Deus preparou para aqueles que O amam." (1Cor 2, 9)
Ontem, dia dos Fiéis Defuntos, foi dia de profunda oração na Igreja, e todos fomos convidados a unir os nossos corações aos dos nossos familiares e amigos que existiram antes de nós e continuam a existir no abraço de Deus. Na missa, escutámos:
"Job respondeu, dizendo: «Quem me dera que as minhas palavras se escrevessem e se consignassem num livro, ou ficassem gravadas em chumbo com estilete de ferro, ou se esculpissem na pedra para sempre! Eu sei que o meu Redentor vive e prevalecerá, por fim, sobre o pó da terra; e depois de a minha pele se desprender da carne, na minha própria carne verei a Deus. Eu mesmo O verei, os meus olhos e não outros O hão-de contemplar!»" (Jb 19, 23-27)
Nos túmulos dos nossos familiares já falecidos, junto dos quais muitos celebraram a Eucaristia, encontramos palavras gravadas a estilete de ferro ou esculpidas na pedra. Nos nossos corações, ecoam palavras também... Que palavras são essas? São palavras que afirmam a nossa fé na ressurreição, como as palavras de Job? Ou são palavras de desespero e tristeza, palavras pagãs de quem está preso ao pó, à terra, à pele que se desprende da carne?
Nos túmulos brancos dos nossos familiares, restam apenas uma pedra e um tributo. Porque a grande verdade é que os seus olhos - e não outros - contemplam já as maravilhas de Deus...
O Tomás, acreditamos, contempla a glória do Senhor deste o instante da sua morte. No seu túmulo branco está gravada uma oração de acção de graças. É a mesma oração que rezámos no dia do nosso casamento e no baptismo de cada um dos nossos filhos. É a mesma oração que está gravada nas nossas almas e nas nossas vidas, no mais profundo da nossa família, para sempre. É a oração que Santa Clara rezou momentos antes de morrer:
"Obrigado, meu Deus, porque me criaste!"
Ámen!
Hoje é dia de festa a triplicar: Festa da Exaltação da Santa Cruz, primeiro aniversário das Famílias de Caná e... 8º ANIVERSÁRIO DO DAVID!
Faz hoje oito anos que o nosso menino nasceu, com pouco mais de dois quilos e sobrolho franzido, depois de uma gravidez muito atribulada! Era muito pequenino, muito magrinho, mas extremamente amado e desejado. O seu nascimento, entre risos e lágrimas, foi um dos momentos mais marcantes da nossa família...
Hoje, o David é uma criança segura, calma, discreta, que gosta de estar sozinho com um livro ou com a sua colecção de animais, que já foi a colecção de animais do Francisco. O David tem um coração grande e uma vontade forte, e detesta zangar-se seja com quem for. Por enquanto acha que vai ser surfista (embora nunca tenha estado numa prancha de surf), ciclista e padre, se for possível ser tudo isso ao mesmo tempo. Se não for possível, o David diz que ainda tem tempo para escolher. Sim, David, tens muito tempo!
Com o nascimento do David, quatro meses depois da morte do Tomás, cumpriu-se em nós a Palavra da Escritura que diz:
"Eu mudarei o teu luto em alegria! Eu te consolarei!" (Jr 31, 13)
O David nasceu na Festa da Exaltação da Santa Cruz. A primeira leitura desta belíssima festa, que hoje escutamos, diz-nos que
"Moisés fez uma serpente de bronze e colocou-a num poste. Quando alguém era mordido por uma serpente venenosa, olhava para a serpente de bronze e ficava curado." (Nm 21, 9)
Quando o David nasceu, a Cruz de Jesus libertou-nos, como ao Bom Ladrão, do peso da nossa própria cruz, curando-nos do veneno da tristeza. Ah, os mistérios do amor de Deus...
Parabéns, querido David!
Na manhã seguinte ao funeral do Tomás, o pequeno Francisco entrou de rompante no nosso quarto. Vinha com um sorriso luminoso, tão diferente das lágrimas que durante todo o dia anterior lhe marcavam as faces.
- Mamã, tive um sonho lindo! - Exclamou.
- Então? Conta!
- Foi um sonho com muitas cores. Um sonho muito verdadeiro. Parecia mesmo a sério! Tu estavas igual, eu estava igual, todos estávamos iguais, mesmo verdadeiros. Tu estavas sentada aqui, na tua cama, e tinhas o Tomás ao colo. Mas não estavas triste! Estavas a rir à gargalhada, muito, muito feliz. E o Tomás estava a bater palminhas e a rir também à gargalhada. E então eu entrei no quarto e tu disseste-me: "Olha, Francisco, o Tomás está curado! E nunca, nunca mais vai ficar doente!" E todos saltámos de alegria, e tu abraçavas-nos a todos...
Mais tarde, o Francisco repetiu o sonho ao pai e à Clarinha; depois à avó. E se lhe perguntarmos hoje como foi aquele sonho, ele repete-o da mesma forma e com a mesma clareza.
O sonho do Francisco foi muito mais do que um sonho; foi uma mensagem de Deus! O Francisco andava muito triste e não percebia bem o que se passara com o seu irmãozinho. Aquele sonho foi a forma de Deus lhe explicar, com imagens simples e acessíveis à sua mentalidade infantil, o que é o céu.
Vale a pena transcrever aqui o testemunho de Gianna Molla, a mãe santa que, aos 39 anos de idade, deu a vida para que a criança que trazia no ventre pudesse viver. Na véspera da sua morte, num sofrimento atroz, Gianna teve uma visão muito semelhante à do Francisco. O marido conta assim:
"Na quarta-feira de manhã, com uma serenidade tão suave que me parecia quase ultraterrena, Gianna disse-me: «Pietro, agora estou curada. Pietro, eu já estava do lado de lá; se tu soubesses o que vi! Um dia to direi. Mas, como nós éramos demasiado felizes, estávamos demasiado bem com os nossos meninos maravilhosos, cheios de saúde e de graça, com todas as bênçãos do Céu, mandaram-me cá para baixo para ainda sofrer, porque não é justo apresentar-se ao Senhor sem muitos sofrimentos» Foram as últimas palavras que me dirigiu." (Santa Gianna Beretta Molla, O Amor Maior, Edições Paulinas, página 168)
O sonho do Francisco e a visão de Gianna dão-nos uma imagem do céu muito diferente daquela que geralmente temos, com anjinhos a cantar glórias. O céu, Francisco, é uma família a rir à gargalhada! O céu é uma criança curada de todas as suas chagas! No céu, encontrarmo-nos-emos todos num amor maior, e os laços de ternura que construímos aqui serão fios de luz a ligar-nos uns aos outros e a brilhar como estrelas! No céu, diz o Apocalipse,
"Deus enxugará todas as lágrimas dos seus olhos; e não haverá mais morte, nem luto, nem pranto, nem dor." (Ap 21, 4)
Se acreditamos nisto, e se eu acredito no sonho do meu filho mais velho, então o tempo que o Tomás não teve, as brincadeiras que o Tomás não brincou, os beijos, as palavras, o amor que o Tomás não conheceu, não estão perdidos para sempre. De uma forma misteriosa, que agora não entendemos, tudo será recuperado, vivido e transfigurado. Porque em Deus, tudo existe eternamente... Ah, o céu! Que maravilha, pensar de vez em quando naquilo que Deus preparou para nós...
(última foto do Tomás antes de adoecer - Natal de 2005)
A Deus, Tomás!
Faz hoje oito anos que o Tomás partiu para o céu, com dezassete meses apenas.
Uma semana antes, no hospital, a Dra Alice dera-me a terrível notícia: a quimioterapia e a operação à cabeça não tinham resultado. O tumor não parava de crescer. Não havia mais nada a fazer senão esperar pela morte. Decidi então tirar de imediato o Tomás do hospital e levá-lo para casa, onde ele poderia morrer no aconchego da sua família. As enfermeiras ensinaram-nos, ao Niall e a mim, a administrar os soros e a medicação ao Tomás, e no dia 13 de Maio, a nossa pequena família teve a alegria de se reunir de novo sob o mesmo tecto - mesmo que apenas por poucos dias.
Durante aquela semana, perguntava-me com frequência: "Como será quando ele morrer? Terei medo? Serei capaz de aguentar?" Nessa noite, deitado na sua caminha de grades, o Tomás tinha estado muito inquieto, como sempre. O Niall cuidara dele a noite inteira, pois eu, grávida de cinco meses, tinha dificuldade em me levantar para o acarinhar. Mesmo assim, ainda lhe aplicara um supositório de ben-u-ron pelas cinco horas da manhã. E depois, ele acalmara. Quando acordei, por volta das sete horas, estranhei ter estado duas horas seguidas a dormir, e dirigi-me imediatamente para a sua caminha. Ele estava imóvel, de barriga para cima, com um rosto sereno. Coloquei suavemente a minha mão no seu rosto, afagando-o com jeitinho para não o acordar. Mas não havia perigo de o fazer... Nesse instante, o Francisco, com sete anos, entrou no nosso quarto e dirigiu-se também para o berço:
- Mamã, o Tomás dormiu bem? - Perguntou.
- Sim, Frankie, o Tomás está bem... - Respondi.
- Ele ainda está a dormir?
- Não, Frankie... Acho que... Parece-me que não está a respirar...
Coloquei a cabeça sobre o seu peito, para sentir a sua respiração. Depois levantei-me de novo:
- Acho que o Tomás já está no céu!
A morte tornou-se de repente tão simples, tão fácil, tão serena! O medo desfez-se como uma bola de sabão e os gestos que se seguiram - retirar os tubos e as agulhas, desligar as máquinas, lavar, vestir o Tomás - surgiram espontâneos. Nem as lágrimas, nem as explicações dadas aos pequeninos, nem os abraços, nem as visitas perturbaram a paz daquele momento belíssimo. Na minha mente, imaginava o alívio que o Tomás deve ter experimentado ao sentir o seu espírito elevar-se devagarinho do seu corpo ferido... Terá olhado para trás, para o pai e a mãe que dormitavam ao lado da sua caminha? Creio que sim. Mas Deus chamava-o com um amor impossível de resistir. Como a borboleta abandonando o casulo, o Tomás apressou-se a voar para os braços do Pai.
O corpinho do Tomás permaneceu na sua caminha, ao lado da nossa, durante todo aquele dia e durante a noite seguinte. Na manhã do dia 20, levantámo-lo finalmente do seu berço e colocámo-lo dentro de um caixão pequenino e branco, com o seu peluche. Depois fomos juntos até à igreja onde o Tomás fora baptizado, na Praia da Barra, que já estava cheia de crianças. Eram os amiguinhos do Francisco e da Clarinha que não os quiseram abandonar nesse dia tão difícil. A seu lado, vários professores, educadoras e irmãs do Colégio e do Centro Social S. José de Cluny. E a catequista do Francisco. E os nossos familiares, amigos e colegas. Em acção de graças, no fim do funeral, pedi à Isabel que lesse o texto belíssimo de Santo Agostinho, que ainda hoje trago sempre na carteira para me amparar quando tenho saudades:
"Se conhecesses o mistério imenso do Céu onde agora vivo, este horizonte sem fim, esta luz que tudo reveste e penetra, não chorarias, se me amas!
Estou já absorvido no encanto de Deus, na sua infindável beleza.
Permanece em mim o teu amor, uma enorme ternura que nem tu consegues imaginar.
Vivo numa alegria puríssima.
Nas angústias do tempo, pensa nesta Casa onde um dia estaremos reunidos para além da morte, matando a sede na fonte inesgotável da alegria e do amor infinito.
Não chores, se verdadeiramente me amas!"
E S. Paulo acrescenta:
"Nem olho viu, nem ouvido ouviu, nem o coração do homem pressentiu, isso que Deus preparou para aqueles que O amam!" (1Cor 2, 9)
No final da missa, largámos balões...
Querido Tomás, tu partiste, mas não foste para longe... A cada domingo, na missa, sei que estás diante do altar, ajoelhado em adoração com uma multidão de anjos e santos, no momento em que o sacerdote consagra o pão e o vinho e Jesus Se torna presente entre nós, trazendo consigo todo o céu. Estás ao meu lado quando todos os teus irmãos se vão embora para a escola e para as suas actividades, e continuarás a meu lado quando eles saírem de casa para construírem as suas vidas. Estás ao lado do Francisco quando ele salta obstáculos com o cavalo e ao lado da Clarinha quando ela faz um mortal em ginástica artística. Sorris para os teus manos mais novos, que nunca chegaste a conhecer na Terra, mas que aguardas com expectativa no céu para uma brincadeira que não terá fim.
Tomás, reza por nós! Ámen.
Foi há sete anos atrás. Era o início da quaresma. O Niall foi confessar-se ao seminário de Aveiro. Quando chegou a casa, vinha pensativo.
- Na capela do seminário havia um cartaz com um versículo bíblico - disse-me. - Dizia assim:
"Vou levar-te ao deserto e falar-te ao coração." (Os 2, 16)
- É uma frase do profeta Oseias - disse-lhe eu. - É natural que esteja em destaque durante a quaresma, pois os quarenta dias da quaresma representam os quarenta anos que foram necessários para o povo de Deus encontrar a Terra Prometida, caminhando pelo deserto.
- Não entendeste - continuou ele - Aquela frase era para mim! Deus quis dizer-me qualquer coisa com aquela frase... E eu não consigo descobrir o quê. E isto está a incomodar-me!
- Fica atento - disse-lhe por fim - e descobrirás!
Não foi preciso esperar muito tempo. Dois dias depois, dávamos entrada nas urgências do Hospital Pediátrico de Coimbra com o Tomás, o nosso terceiro filho, na altura com 15 meses. Vomitava sem parar e estava completamente desidratado. Os médicos fizeram-lhe uma TAC e a resposta chegou de imediato: tumor cerebral maligno. O nosso querido menino viveu mais dois dolorosos meses, e por fim, partiu para Casa.
Nunca esquecerei o cuidado com que Deus nos preparou para os tempos difíceis que se avizinhavam, naquela tarde de quaresma. Com que carinho nos falou do deserto, lá onde se testam os limites do ser humano, lá onde se experimenta a fome, a sede, o calor, o frio, o cansaço... O deserto da solidão, da dor, da angústia, do medo, da morte.
Mas em momento algum Deus nos abandonou, ou nos sentou no "banquinho do castigo", como escrevi no meu último post. Em momento algum ficámos sozinhos na nossa dor. Porque no deserto, Deus tomou-nos pela mão e, com uma ternura indizível, falou-nos ao coração...
A voz do Senhor continua a ressoar com poder e majestade na nossa vida, falando-nos ao coração através de toda a Palavra das Escrituras. Do céu, o Tomás continua a ser sinal de que Deus está connosco, como o foi no dia do seu nascimento.
Ainda não chegámos à Terra Prometida. Mas o deserto já se cobriu de flores!
Tomás, reza por nós!