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Somos uma família católica, abençoada com seis filhos na Terra e um no Céu. Procuramos viver a fé com simplicidade e generosidade. Queremos partilhar com outras famílias a alegria de sermos Igreja Doméstica na grande família da Igreja Católica.
Uma das nossas histórias preferidas é a colecção de livros Little House on the Prairie (Uma Casa na Pradaria), de Laura Ingalls Wilder. Os livros são pouco conhecidos em Portugal, mas a série televisiva é conhecida de toda a gente da minha geração. Embora a série seja bonita, os livros são infinitamente melhores, contando a história verdadeira de uma família de pioneiros americanos, vivendo uma vida cheia de risco e de amor na "fronteira" do território índio, no início do século XX.
Recém-casados, ao serão, o Niall e eu lemos em conjunto - sempre gostámos muito de ler em voz alta - os nove livros, um bocadinho de cada vez. Anos mais tarde, lemos os três ou quatro primeiros livros ao Francisco e à Clarinha. Em breve começaremos a lê-los ao David, e depois à Lúcia e aos manos mais novos. Às vezes rimos à gargalhada, às vezes choramos, mas nunca pousamos os livros sem nos sentirmos diferentes, mais corajosos e mais pacificados. A história da vida de Laura teve uma grande influência na forma como fomos criando as nossas tradições familiares e definindo os nossos ideais.
Um dos muitos pontos que nos fez sempre reflectir foi a forma como o pai e a mãe da Laura se relacionavam. As suas quatro filhas nunca assistiram a uma discussão entre eles! O carinho e o amor um pelo outro são evidentes nos mais pequenos detalhes. Charles tinha o espírito aventureiro dos pioneiros, e ao longo da sua vida fez a sua família mudar de casa quatro vezes. Não foram mudanças de casa como as nossas hoje, claro! A primeira foi para território índio, a segunda foi de regresso a "território branco" porque o perigo não os deixava continuar. Em cada uma destas mudanças, a decisão foi sempre imediata, tomada sob grande tensão à última hora. A horta começava a dar os primeiros frutos, o poço tinha acabado de ser aberto, a casa estava pronta, com madeira a cheirar a fresco, as meninas começavam a conhecer a grande pradaria e a habituar-se ao "grande silêncio". Mas os soldados americanos estavam em guerra com os índios. "Vamos embora esta noite", disse Charles. "Hoje? Amanhã íamos começar a colher o trigo... Eu já tinha falado às miúdas nas refeições saborosas que íamos ter... A horta está pronta... Vamos perder um ano inteiro de trabalho... Hoje?" "Sim, Caroline, hoje. Prepara tudo que vamos embora." E a resposta de Caroline era invariavelmente: "Yes, Charles". Não se tratava de uma cedência amuada, mas de uma aceitação plena e alegre da vontade do outro: "Os coelhos vão fazer uma festa quando descobrirem a nossa horta", rematou ela divertida, lançando um último olhar à terra que abandonava.
O "Yes, Charles" de Caroline ficou na nossa história de casal como uma brincadeira e uma forma de rematarmos os nossos conflitos conjugais. Naturalmente que, neste início de século XXI, o "Yes Charles" é também "Yes Caroline". Mas o Niall e eu ainda não encontrámos forma melhor de terminarmos os nossos desentendimentos. Quando a discussão começa a aquecer, o tom de voz a elevar-se, o rosto a corar, eu respiro fundo e digo:
- Yes, Charles!
Ou então é o Niall o primeiro a ceder, e com um piscar de olhos responde-me:
- Yes, Caroline!
Lembrei-me de escrever sobre esta história anteontem à hora de jantar, depois de mais um "Yes Charles" dito ainda com os dentes cerrados, mas logo seguido de uma gargalhada. Porque assim que cedemos à vontade um do outro nos nossos pequenos conflitos, a cumplicidade regressa.
S. Paulo traduz este "Yes Charles" num texto lindíssimo, onde submissão, obediência, humildade, serviço e entrega são tudo sinónimos do amor maior, o amor com que Jesus nos amou - e é naturalmente no quadro de um grande amor que este texto deve ser lido:
"Sujeitai-vos uns aos outros no temor de Cristo. As mulheres casadas sejam submissas aos maridos como ao Senhor (...) Maridos, amai as vossas esposas como Cristo amou a Igreja e se entregou por ela..." (Ef 5, 21-33)
O amor implica cedência de ambas as partes. Ninguém pode amar e ao mesmo tempo fazer sempre a sua vontade! A teimosia constante ou unilateral gera sempre a discórdia. É preciso "deitar aos coelhos" muitos sonhos e fazê-lo com alegria! A paz conjugal depende de muitos "Yes Charles" e "Yes Caroline" ditos talvez de dentes cerrados, mas transformados de imediato em cumplicidade amorosa...
(No retiro também falamos de amor... Inscrevam-se! Na coluna lateral deste blogue têm como o fazer!)