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Vovó Mamã

por Teresa Power, em 21.11.14

Numa destas tardes de domingo fomos a Aveiro visitar a minha avó, a quem os meus filhos chamam carinhosamente "Vovó Mamã", talvez por ela ser a mamã da sua vovó. A minha avó, mulher forte, generosa, atenta aos outros, a quem eu devo tanto desde menina e até bem depois de casar, está ainda na sua casa, mas já não pode estar sozinha, visto não conseguir deslocar-se e sofrer de uma grave demência. Assim, a minha mãe passa quase todo o seu tempo com ela, tendo ainda a ajuda de funcionárias dedicadas e trabalhadoras.

A Palavra de Deus é muito clara:

 

"Filho, ampara o teu pai na velhice, não o desgostes durante a sua vida; mesmo se ele vier a perder a razão, sê indulgente, não o desprezes, tu que estás na plenitude das tuas forças. A caridade que exerceres com o teu pai não será esquecida, e ser-te-á considerada, em reparação de teus pecados." (Sir 3, 12-14)

 

Que palavra tão bonita! Deus está disposto a esquecer os nossos pecados por um acto de amor para com os nossos pais, algo que devia ser tão natural em nós...

Cuidar do pai e da mãe idosos aprende-se em família. Eu estou acostumada a ver a minha mãe cuidando incansavelmente da minha avó. E embora a minha avó nunca deixe de dizer "obrigada" e "por favor", já não reconhece a filha. Não é fácil acompanhar os seus delírios, ajudá-la a fazer a sua higiene quando ela quase não se mexe, partilhar o seu sofrimento todos os dias. Mas a minha mãe fá-lo de todo o coração. Terei eu, um dia, esta capacidade de entrega e esquecimento de mim mesma?

Sara e vovo mamã.jpg

Recordo aqui um texto de Santa Teresinha, que sempre me comoveu, em que ela relata a forma como cuidava de uma irmã muito idosa do convento:

"Custava-me muito oferecer-me para acompanhar a Irmã S. Pedro ao refeitório, porque sabia que não era fácil contentar a pobrezinha, que sofria tanto e que não gostava de mudar de acompanhante. Contudo, eu não queria deixar de aproveitar uma tão bela ocasião para praticar a caridade. Todas as tardes, quando via a Irmã S. Pedro sacudir a ampulheta, sabia que isso queria dizer: "Vamos!" É incrível como me custava sair, mas fazia-o imediatamente. Depois começava todo um cerimonial. Era preciso retirar e levar o banco de um modo especial, e sobretudo, não se apressar; a seguir, iniciava-se o passeio. Se ela dava um passo em falso, logo lhe parecia que eu a segurava mal; se procurava andar ainda mais devagarinho - "Logo vi que era nova demais para me acompanhar!" Quando chegávamos ao refeitório, era preciso arregaçar-lhe as mangas de um modo também especial...

Uma noite de inverno, em que cumpria, como de costume, o meu pequeno ofício, ouvi ao longe o som harmonioso de um instrumento musical. Então imaginei um salão bem iluminado, todo resplandecente de dourados, de donzelas elegantemente vestidas. A seguir, o meu olhar pousou na pobre doente que amparava; em vez de uma melodia, ouvia de vez em quando os seus gemidos queixosos; em vez de dourados, via os tijolos do nosso claustro austero, mal iluminado. Não consigo exprimir o que se passou na minha alma, o que sei é que o Senhor a iluminou com os reflexos da verdade, que ultrapassavam de tal maneira o brilho tenebroso das festas da terra, que não podia acreditar na minha felicidade! Ah, para gozar mil anos de festas mundanas, não teria dado os dez minutos gastos no cumprimento do meu humilde ofício de caridade!" (História de Uma Alma, Manuscrito C)

 

Que o Senhor nos ensine, como a Santa Teresinha, a escolher o mais importante, e a perceber que a felicidade do Céu vale bem um pequeno ou um grande esforço de caridade na Terra. Ámen!

 

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publicado às 06:56


4 comentários

De Carla a 21.11.2014 às 17:28

De facto só dá valor à dedicação da tua mãe quem já viveu o mesmo ou acompanhou muito de perto. Também a minha avó esteve aos cuidados da minha mãe durate cerca de 9 anos. Por muitas ajudas preciosas, é um trabalho de 24 hs, 7 dias por semana. Não é só a dedicação quando se está presrnte, mas sempre a preocupação quando outros estão no nosso lugar. As ajudas, por muito boas que sejam, não acordam de noite a pensar se tudo estará bem, quando não está presente. A tua mãe, tal como a minha e todas as que o fazem têm Deus no coração, pois só Ele pode dar força para esta tarefa tão árdua, que além da dificuldade na assistência, é a tristeza de ver a nossa mãe numa condição diminuta. Por outro lado, é tb a alegria de cada momento vivido. E depois, quando Deus quiser, acaba a dificuldade da assistência, acaba a preocupação permanente e fica a solidão da falta de alguém precioso. Mas graças a Deus a solidão vai-se tranformando na saudade boa de tudo o que Deus permitiu que vivesse. E passamos a ter mais um anjo que nos protege, guia e acompanha. Em cada hora, a tua mãe conquista mais um cm2 de céu e tu, eu e os nossos filhos vêem nestes exemplos o verdadeiro significado de ser familia. Bem haja à tua mãe e que deus a proteja. Aproveito a oportunidade de homenagear a minha pela grande dedicação que durante anos dedicou à minha avó, de quem tenho muitas saudades. Beijinhos à avó e à bisa.... carla

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